No Brasil, as salas de aula reforçam a desigualdade existente do lado de fora dos muros dos centros de ensino. Alunos pretos têm aprendizagem defasada na comparação com brancos. Nas universidades, o ensino a distância já supera em matrículas o presencial. A maioria absoluta das vagas é oferecida pelas faculdades particulares, sobre as quais não há controle eficaz. Da educação básica ao ensino superior, professores são pagos de acordo com a idade do aluno e não por sua formação e experiência. Além de ganharem mal, não têm uma política nacional de carreira nem o apoio público à formação continuada. Enquanto isso, os recursos para o setor mais importante de uma Nação só diminuem. Em 2016, ano em que o governo Dilma foi golpeado, o orçamento da Educação totalizou R$ 174,4 bilhões; em 2022, não passa de R$ 137,9 bilhões. Ainda no Ministério da Educação, o que se vê é o abandono de instrumentos de controle e de participação social nas decisões, a inércia na pandemia e, pelo que indicam gravações recentes publicadas na imprensa, um apetite voraz para atender aliados pastores que intermedeiam recursos públicos em troca de propina.
O financiamento da Educação no Brasil e como fazer com que esse dinheiro seja bem aplicado foram assuntos, nesta quinta-feira (7), de uma das mesas do Seminário Resistência, Travessia e Esperança – Tema Educação, organizado pelas lideranças do PT no Senado e na Câmara, Fundação Perseu Abramo, PT Nacional e Instituto Lula. Especialistas no setor foram ouvidos e suas sugestões poderão ser incorporadas ao programa de governo preparado pelo partido.
Assim como em outros seminários temáticos, ficou claro que a Emenda Constitucional (EC 95/2016) do Teto de Gastos precisa ser derrubada. Segundo a professora Andrea Barbosa Gouveia, do Núcleo de Pesquisa em Políticas Educacionais da Universidade Federal do Paraná, a emenda não só impede o cumprimento da Lei do Piso Salarial dos Professores – sancionada em 2008 pelo então presidente Lula –, como comprime cada vez mais os investimentos de estados e municípios. Sobre o impedimento legal de ampliar gastos públicos em áreas sociais até 2036, o pesquisador Nelson Cardoso Amaral, da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás, lembra que a projeção é de que até lá a população brasileira aumente em 20 milhões de pessoas, e sublinha: “É um absurdo manter esse congelamento de investimentos”.
Mais investimentos ou melhor gestão? Os dois, defendem os debatedores. Além da derrubada do teto de gastos, recursos hoje distribuídos por meio de royalties do petróleo e do gás à União, estados e municípios (R$ 871 bilhões entre 2002 e 2021), poderiam compor o orçamento da Educação, sugeriu Nelson Amaral. A exemplo de outros colegas, ele reivindica uma reforma tributária justa e solidária, que possa tirar das costas da população mais pobre “a pesada carga atual de alíquotas sobre bens e serviços”.
Esse ponto, o do combate à desigualdade, é vital na discussão de uma nova escola, afirmou a doutora em Educação Zara Figueiredo Tripodi, da Universidade Federal de Ouro Preto (MG). Para isso, defende ela, é preciso “romper os grandes silêncios”, que seria a falta de ações para aterrar o abismo socioeconômico que transborda em diferenças de aprendizagem na sala de aula. Para transformar, ela espera que o Sistema Nacional de Educação (SNE), em discussão na Câmara, possibilite a produção de políticas públicas nesse sentido. Hoje, elas estão em falta, lamenta também Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE). Avaliação socioeconômica dos estudantes, valorização dos profissionais da educação, diálogo com a sociedade, nada disso está na pauta do atual governo, denuncia. Ele recomenda que se retomem os princípios do Plano Nacional de Educação (PNE), construído em 2014 (governo Dilma Rousseff) para vigorar até 2024, com metas, diretrizes e estratégias para o setor, e que se avance a partir dele para construir um novo PNE, ainda mais inclusivo, para vigorar entre 2025 e 2034.
O controle sobre a destinação dos recursos públicos foi o último ponto debatido. E foi ressaltado por Igor Anatoli, da Educafro, entidade voltada à inclusão de negros, e também de pobres, nas universidades. Igor acredita que é preciso rever a política de bolsas no ensino privado, que estariam sendo distribuídas, segundo ele, não para alunos alvos das políticas públicas, mas de acordo com o interesse dos estabelecimentos privados de ensino.
“Onde há menos alfabetizados é onde há mais fome e miséria”, afirmou o deputado Padre João (PT-MG), ao concordar com a ideia de que os recursos da Educação são sagrados. Também é essencial, segundo o deputado, investir mais na educação no campo e nas florestas, o que traz uma rima com conclusões de outros dois seminários, o do Meio Ambiente e o de Economia, em que especialistas recomendaram a formação e a capacitação de populações tradicionais nessas regiões como forma de o país se preparar e promover uma nova forma de economia, tão rentável quanto sustentável.