A principal responsável por levar vacinas ao braço dos brasileiros pelos últimos dois anos confirmou o que o Partido dos Trabalhadores vem denunciando e a CPI está perto de provar: Jair Bolsonaro implementou, em várias instâncias, uma estratégia de disseminação do coronavírus para que a população atingisse, a partir de infecções em massa, uma imunidade natural contra a doença, não importando os milhares de mortos. Depois de pedir demissão da coordenação do Programa Nacional de Imunizacões (PNI), do Ministério da Saúde, Franciele Fontana afirmou que Bolsonaro atrapalha as ações da pasta, principalmente com declarações antivacina.
“Isso divide a opinião pública. Quando se tem certeza de que vacina é o meio mais efetivo para conter a epidemia, junto com as medidas não farmacológicas, e tem comunicação diferente do líder da nação, isso traz prejuízo para a campanha de vacinação”, declarou Fontana à Folha de S. Paulo.
Para ela, as falas de Bolsonaro desinformam e levam a uma desconfiança sobre a necessidade das imunizações e de medidas de proteção, como o uso de máscaras e o distanciamento social. “Vimos que começou a haver dúvidas da própria população em relação à vacinação”, disse a ex-coordenadora. “Precisaríamos ter um comportamento que unificasse o país e uma comunicação única”, observou.
Ela considerou graves recentes declarações de Bolsonaro sobre a não necessidade de uso de máscara entre pessoas vacinadas. “Verificar uma fala do presidente da República de que vacinado já poderia deixar de usar a máscara é um cenário muito ruim para o Programa de Imunizações”, avaliou. “Não vacinamos ainda quantitativo suficiente da população e estamos com número de casos expressivo”.
Quebra de sigilo
Fontana integra a lista de pessoas que terão sigilo telefônico e telemático quebrado a pedido da CPI da Covid. Ela nega que tenha deixado o cargo por pressão em razão das investigações da comissão. Fontana poderá participar de uma acareação na CPI com a médica Luana Araújo, segundo pedido de requerimento dos senadores.
No centro da acareação, recomendações para vacinação de gestantes com troca de doses de imunizantes, de acordo com a Folha. “Jamais tomei qualquer decisão no PNI sem uma discussão ampla”, defendeu-se a ex-coordenadora.
Governo queria vacinas só a “grupos de risco”
Outra evidência da estratégia criminosa de Bolsonaro de expor a população ao vírus da Covid-19 ganhou a luz do dia na quinta-feira (1º). Segundo documento interno do Ministério da Saúde obtido pelo jornal O Globo, o governo decidiu comprar o mínimo de doses ofertadas pelo consórcio Covax Facility (10%), da Organização Mundial da Saúde (OMS), porque avaliava que não seria necessário imunizar toda a população adulta no país.
O argumento da nota, de agosto de 2020, era de que só seria necessário vacinar pessoas de “grupos de risco” com as vacinas do consórcio. A nota foi assinada pelo secretário Executivo da pasta à época, Elcio Franco, o número dois da gestão de Eduardo Pazuello.
“Isso é gravíssimo, é cruel e criminoso. Um retrato revoltante do genocídio”, denunciou o senador Rogério Carvalho (PT-SE).