O Brasil não pode aceitar a “operação abafa” montada para retirar do noticiário as denúncias contra ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que recentemente foram trazidas à tona por sua ex-amante, a jornalista Miriam Dutra, afirma a senadora Fátima Bezerra (PT-RN). Para a parlamentar, questões da esfera pessoal não se discutem, mas FHC precisa esclarecer as acusações de que teria mantido contas não declaradas no exterior e utilizado uma empresa offshore para fins pessoais, sem a explicação da origem desses recursos.
Há cerca de uma semana, a ex-funcionária da TV Globo, Miriam Dutra, rompeu mais de duas décadas de silêncio para revelar, em entrevista, os bastidores da operação montada para encobrir o caso extraconjugal entre ela e FHC, o nascimento de seu filho e o esquema organizado para mantê-la na Europa e “não atrapalhar” a trajetória política de ex-presidente.
Há indícios ainda de que o BNDES tenha favorecido a Rede Globo em troca de manutenção de sua funcionária na Europa com significativo salário sem que praticamente nenhum trabalho tenha sido realizado.
Tratamento cerimonioso
“O príncipe dos sociólogos teria se utilizado de uma empresa no exterior, a Brasif S.A. Exportação e Importação, para fazer repasses de dinheiro à ex-amante Miriam Dutra”, lembrou Fátima. A Brasif, que contratou de forma fraudulenta a jornalista para justificar os envios do dinheiro, era administradora dos free shops em aeroportos brasileiros.
O contrato de US$3 mil mensais nunca resultou em nenhum trabalho, segundo confessou Miriam Dutra. “Esses recursos, na verdade, eram para suplementar a sua renda no exterior. E falamos em suplementar a renda, porque Miriam Dutra era jornalista da Rede Globo, tendo sido transferida para Portugal, quando engravidou durante o relacionamento extraconjugal com Fernando Henrique”, frisou Fátima.
Para Fátima, o tratamento cerimonioso que a grande imprensa vem dando ao tema e a absoluta indiferença dos integrantes de órgãos de fiscalização em relação ao assunto mostram o grau de seletividade com que se conduzem investigações atualmente, no Brasil. “É importante que as investigações em curso no País deixem o manto da seletividade e não se deixem contaminar por conotação de ordem político-partidária”, defendeu a senadora.
“Podemos tirar, se achar melhor”
Ela lamenta que não esteja havendo no País um processo de investigação “amplo, geral e irrestrito”, mas, ao contrário, a aura do “combate à corrupção” esteja enfeitando uma caçada implacável ao ex-presidente Lula e ao PT. “É uma caçada, uma verdadeira obsessão, baseada em suposições e factoides, até porque não há absolutamente nada comprovado contra Lula. Nem há, nem haverá pela sua lisura, pela sua honestidade, pela sua trajetória”.
A senadora estranha que justamente FHC, tão poupado pela grande imprensa, reclame da repercussão do caso. “Ora, ex-presidente, não se faça de tolo! Será possível que o senhor não tenha lido as notícias em nosso País para saber que nenhuma notícia envolvendo o seu nome tem espaço nas páginas da imprensa brasileira”, questionou ela.
Para Fátima, talvez FHC tenha se “esquecido” do episódio do “podemos tirar se achar melhor”, quando um repórter se oferecia para cortar um trecho de matéria que citava a corrupção na Petrobras durante o governo tucano—a observação, que passou pelo revisor e acabou incorporada ao texto publicado, comprova que a reportagem foi submetida ao crivo da fonte—FHC—antes da publicação e que essa fonte tinha poderes para definir o texto final da matéria.
Fátima ironizou a “proatividade” de setores do Judiciário, que levam a cabo investigações baseadas em suposições “que invariavelmente se iniciam com ‘provavelmente’, ‘possivelmente’, ‘teria sido’ e outras frases com pouca ou nenhuma prova concreta” e manifestou fé de que, em breve, apareça “um novo juiz Moro” ou mesmo o próprio, para investigar o esquema fraudulento montado para abafar o caso extraconjugal de FHC, como já pediram as bancadas do Partido dos Trabalhadores e do Partido Comunista do Brasil na Câmara, em representação ao Ministério da Justiça.
É preciso esclarecer como e por que motivos a empresa Brasif, beneficiária de contratos generosos com o governo durante a gestão FHC, aceitou montar um contrato fraudulento com a jornalista Miriam Dutra para fazer os repasses de Fernando Henrique à ex-amante. “Isso merece ser investigado, e que ele tenha o direito de se defender. E deveria merecer toda uma cobertura por parte da imprensa, mas o que vemos é uma operação abafa extraordinária”. Para a senadora, a Operação Acarajé, lançada esta semana no âmbito da Lava Jato, “parece até que veio por encomenda para tentar abafar as denúncias contra FHC”.
A “Operação Acarajé” prendeu os publicitários João Santana e Monica Moura. Santana foi o coordenador de propaganda da campanha presidencial de Dilma Rousseff. “O Partido dos Trabalhadores não teme investigação; o Presidente Lula, muito menos”, reiterou Fátima, que na semana passada esteve com Lula, na visita de solidariedade feita pela Bancada do PT no Senado ao ex-presidente. “Encontramos um homem de cabeça erguida, que bota a mão no peito e diz com orgulho – e nós confiamos nele – que o único patrimônio do presidente Lula que aumentou, nos oito anos em que ele esteve à frente da Presidência da República, foi o seu patrimônio moral”.
Cyntia Campos
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