Em queda livre, o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil caiu 4,1% em 2020, maior recuo anual da série iniciada em 1996 e a maior queda desde 1990, quando a economia encolheu 4,4%. O resultado fez o país cair para a 12ª posição no ranking das maiores economias do mundo.
No entanto, ao se considerar o PIB per capita, que ano passado caiu 4,8%, para R$ 35.172 – menor valor da série histórica, iniciada em 2009 –, o país não está nem entre as vinte maiores economias do mundo.
O Brasil, que iniciou a década passada na 77ª posição entre os maiores PIBs per capita globais em paridade do poder de compra (PPC), agora ocupa o 85º lugar, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). Resultante da divisão do total da riqueza produzida no país pelo total de habitantes, o indicador serve como referência do nível de renda da população.
O maior valor já atingido no Brasil foi sob Dilma Rousseff, em 2013. Chegou a US$ 15,6 mil (R$ 81,10 mil, pelo câmbio atual). Caiu 0,7% em 2014, na primeira retração desde 2009, e chegou a US$ 14,3 mil (R$ 74,3 mil) em 2016, quando a presidenta legitimamente eleita foi afastada do cargo pelo golpe dos derrotados em 2014.
Desde então, uma sucessão de recessões, entremeadas por três anos de crescimento muito baixo (entre 2017 e 2019), afastou o Brasil cada vez mais do nível máximo de renda perdido. Em 2020, o PIB per capita nacional fechou em um nível 11% abaixo do de 2013, em valores corrigidos pela inflação.
Quem arca com o impacto dessa queda são as famílias brasileiras, cujo endividamento junto ao sistema financeiro chegou a 58,5% da massa salarial em abril. É o maior porcentual de endividamento familiar da série histórica do Banco Central (BC), iniciada em janeiro de 2005. Mas em economia, quando alguém perde, outro alguém ganha.
No artigo “Os ricos se preparam para 2022”, publicado no site Terapia Política, o presidente do Instituto Lula, Marcio Pochmann, descreve como os detentores de riqueza optaram pela “desistência histórica do Brasil” a partir de 2013.
Naquele ano, o “abraço de afogado” estabelecido com a extrema direita internacional para promover as jornadas de junho de 2013 abriu caminho não apenas para a desestabilização do governo Dilma, mas para um processo que ano após ano depaupera a economia popular.
“O condomínio de interesses dos ricos, poderosos e privilegiados que passou a comandar o país desde o golpe de 2016 em direção à vassalagem externa e à destruição nacional se mostrou exitoso na obtenção dos seus objetivos”, afirma o economista. “Embora o país tenha se tornado pária internacional, encaminhando-se para o oitavo ano sem crescimento da renda per capita, os enriquecidos não têm do que reclamar.”
Professor titular da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Pochmann afirma que nos últimos sete anos não somente cresceu a participação do capital no Produto Interno Bruto, embalado pela expansão da margem de lucro das empresas, como também aumentou o número de bilionários.
“Além disso, as mínimas restrições ‘civilizadas’ para a exploração capitalista seguem sendo desconstituídas desde 2016 pelas deformas trabalhista e previdenciária, pela liberalização da degradação ambiental ao neoextrativismo, pela entrega do setor público estatal ao lúmpen empresarial, pelo desmonte do Estado de bem-estar e pela regressão para o final do século 20 dos recursos orçamentários para a educação e ciência e tecnologia”, prossegue.
Com os neoliberais, derrocada se acelera
A catástrofe construída pelos governos do golpe conduzirá o Brasil ao pior desempenho econômico entre as maiores economias do mundo em 2021. A projeção, fundamentada no critério da paridade de poder de compra (PPC), que reflete o custo de vida nos países, foi feita pelos economistas Claudio Considera e Juliana Trece, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ibre).
Coordenador do Monitor do PIB da instituição, o economista acredita que, mesmo que o país tenha a tal recuperação em “V” propalada pelo ministro-banqueiro da Economia, Paulo Guedes, o crescimento deste ano não irá repor as perdas de 2020. E mesmo que isso ocorresse, o país voltaria para o patamar de crescimento muito baixo verificado entre 2017 e 2019, com o usurpador Michel Temer.
“2020 tem uma coisa muito particular, que é uma pandemia na qual a economia foi desligada. Mas é preciso lembrar que a economia não vinha bem”, analisa. Segundo o economista, mesmo sem contar 2020, entre 2011 e 2019 a economia registrava crescimento médio de 0,7% ao ano.
Se o país tivesse crescido no ano passado os 2% que o mercado previa antes da pandemia, a década teria avanço médio de 0,9%. Com o resultado do ano passado, o crescimento médio anual é de 0,3%. “Ou seja, temos um desastre total em qualquer situação, com ou sem pandemia”, conclui o economista.
“Se o PIB per capita crescer 1% ao ano, só em 10 anos, em 2031 ou 2032, vamos recuperar as perdas desde 2013”, prevê outra economista, a pesquisadora sênior da área de economia aplicada da FGV Silvia Matos.
Ao CNN Brasil Business, ela estimou que se mantiver a média de crescimento do PIB per capita desde 1980, de 0,6% ao ano, o Brasil só retomará o pico de PIB per capita perdido em 2013 daqui a 18 anos, em 2039.
“Conseguiríamos recuperar as perdas em cinco anos se o crescimento [do PIB per capita] fosse de 2% ao ano”, disse Matos. A única vez em que isso ocorreu depois do “milagre econômico” dos anos de 1970 foi no começo dos anos 2000.
Entre 2001 e 2010, sob Luiz Inácio Lula da Silva, o PIB per capita do país cresceu à média de 2,4% ao ano. No período, a variação média do PIB também foi muito superior à histórica: chegou a 3,7%, mesmo sob influência da crise financeira internacional de 2008.
“Lula e Dilma deram uma reposta à crise de 2008 que foi entendida à época como adequada, com medidas de estímulo à demanda, de gastos públicos e medidas protecionistas, que geraram imediatamente um alívio à recessão que vinha dos Estados Unidos”, lembra o economista Vinícius Müller, do Insper.
Em dezembro de 2011, primeiro ano de Dilma Rousseff, o país havia ultrapassado o Reino Unido e se tornado a sexta maior economia do planeta. Em 2010, chegara à sétima posição sob Luiz Inácio Lula da Silva, com alta anual de 7,5% – melhor resultado da série histórica. Agora, afunda sob o peso do “abraço de afogado” com a extrema direita internacional.