Bolsonaro e seus filhos sempre se vangloriaram dos estreitos laços da família com o ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, visto como modelo de governança, para eles. A forma como a economia norte-americana é conduzida também recebe largos elogios da família Bolsonaro, mas na hora de aplicar aqui o que os “gringos” fazem em termos de ajuda financeira à população, de proteger empregos, salvar vidas, assegurar a renda das famílias e evitar falências de empresas durante a pandemia do novo coronavírus (Covid-19) , o discurso muda completamente.
Na contramão do mundo, Bolsonaro assinou um decreto, publicado na última quinta-feira (11), limitando ainda mais as contas do governo até que o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) seja aprovado pelo Congresso Nacional. Mas, o governo foi além do que diz a Lei que obriga a limitar os gastos discricionários dos ministérios como custeio da máquina pública e investimentos, até a aprovação do PLOA. A legislação estabelece a um doze avos do valor previsto para o ano. No entanto, o decreto aumenta a limitação a dezoito avos. Por exemplo, se hipoteticamente, um ministério pode gastar R$ 1.200,00 em 12 vezes, o resultado é R$ 100,00 ao mês. Ao dividir em 18 meses, o valor cai para R$ 66,66 ao mês.
A economista e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Denise Gentil, em levantamento exclusivo para o Portal CUT, dá parâmetros comparativos de como o governo brasileiro vai na contramão do mundo, inclusive dos Estados Unidos, visto como exemplo de país para a família Bolsonaro.
Nos Estados Unidos, do lado da política fiscal, foi dada assistência a famílias, empresas e governos estaduais e locais em março e abril de 2020, de US$ 3 trilhões, ou seja, 14,8% do PIB e um novo pacote de estímulo fiscal federal de 4,3% do PIB foi aprovado em dezembro.
O Banco Central dos EUA também aplicou US$ 2,3 trilhões do tesouro americano na compra de títulos de empresas endividadas, os chamados “junk bonds”. Além desse apoio fiscal, o Federal Reserve (FED), o banco central dos EUA, reduziu as taxas de juros, entre zero e 0,25%, juntamente com US$ 700 bilhões em compras de ativos. O FED também fez compras planejadas de títulos corporativos de governos municipais.
Em sua análise, a professora da UFRJ, aponta que esse suporte fiscal às famílias e empresas tem conduzido ao aumento do déficit e da dívida pública, em todo o mundo.
“Isto é apenas uma mostra de que numa pandemia, não é hora para o Brasil se preocupar com o déficit público. É uma situação inevitável nos momentos de retração econômica. Nas economias emergentes e de renda média e baixa, o aumento do déficit tem estado é associado muito mais ao colapso nas receitas de impostos causadas pela baixa atividade econômica do que ao aumento do gasto. Porém, a saída acionada pelos países no mundo não foi cortar gastos ou limitá-los a tetos estabelecidos em fase anterior à pandemia”, diz a economista.
Segundo Denise Gentil, durante a pandemia, o tesouro e os bancos centrais de outros países têm liberado volumes sem precedentes de estímulos fiscais e monetários para apoiar as economias nacionais e lutar pela vida de suas populações. Até aqui, os países praticaram ações fiscais de apoio para mitigar os efeitos sobre o consumo e a produção, correspondentes a US$ 14 trilhões, segundo o Monitor Fiscal, de janeiro de 2021, do Fundo Monetário Internacional (FMI). Foram US$ 7,8 trilhões em gastos adicionais e US $ 6 trilhões em injeções de capital, empréstimos e garantias.
No Brasil, o ano de 2020 fechou com um déficit primário de R$ 702,9 bilhões ou 9,49% do PIB, abaixo do projetado pelo FMI em 13,3% para as economias avançadas e de 10,3% para economias emergentes e de renda média, como é o caso brasileiro. Ou seja, nem o conservador FMI esperava um déficit menor do Brasil.
A dívida bruta do governo geral do Brasil, também está abaixo da média mundial, tendo passado de 74,3% do PIB em 2019 para 89,3% em 2020, uma subida equivalente a R$1,1 trilhão.
Ainda de acordo com Denise, o FMI estima, entretanto, que a dívida global deverá alcançar 98% do PIB no fim de 2020, comparada com a projeção de 84% feita para o ano de 2019. Pelo indicador de dívida líquida do setor público, a dívida brasileira passou de 54,6% para 63% do PIB, um crescimento de R$700 bilhões.