Ponte para o precipício

Bolsonaro aprofunda “herança” de Temer na economia

Entre outras razões, asfixia de investimentos públicos, que estão no nível mais baixo dos últimos dez anos, mantém economia sem perspectivas
Bolsonaro aprofunda “herança” de Temer na economia

Foto: Agência Brasil

Com média de 12,8 milhões de desempregados, extinção de 1,4 milhão de empregos com carteira assinada em apenas dois anos e queda vertiginosa do número de pessoas que contribuem para a Previdência — 1,3 milhão, desde 2014 — o cenário do mercado de trabalho brasileiro em 2018 expressa uma economia sem capacidade de recuperação.

É o que revelam os números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios-Contínua (PNAD Contínua), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e divulgada na última quinta-feira (31).

O cenário é tão desanimador que 4,7 milhões de pessoas sequer procuraram emprego em 2018. Esses trabalhadores são os chamados desalentados, grupo que cresceu 13% em relação a 2017 e 200% em comparação com 2014. Os desalentados não são contabilizados entre os desempregados — categoria na qual a PNAD relaciona apenas quem procurou emprego e não conseguiu uma vaga.

Anemia econômica
Os dados de 2018, consolidados na PNAD, comprovam uma economia anêmica e sem perspectivas de crescimento sustentável. “Isso é resultado, entre outras razões, da asfixia de investimentos públicos, que estão no nível mais baixo dos últimos dez anos”, aponta o economista Bruno Moretti, assessor da Bancada do PT no Senado.

Um dado preocupante, alerta Moretti, é a acelerada precarização do trabalho registrada nos últimos anos. Desde 2014 — quando a sabotagem ao governo Dilma foi deflagrada pelas forças de direita — o País perdeu nada menos que 3,7 milhões de postos de trabalho com carteira assinada.

Números preocupantes
Naquele ano, o Brasil alcançou o recorde da série histórica: 36,6 milhões de empregos formais e devidamente registrados. Em 2018, a média desse tipo de vínculo foi de 32,9 milhões — menor registro desde que esse dado começou a ser medido, em 2012. Mesmo em comparação a 2017, os números apontam queda de 400 mil postos com carteira assinada.

Além de registrar a manutenção do alto desemprego – número médio de desocupados passou de 13,2 milhões em 2017 para 12,8 milhões em 2018 — os números preocupam também pela queda na qualidade dos postos de trabalho, com o crescimento dos empregos informais e da ocupação por conta própria.

A fada não veio
São vagas que não oferecem qualquer tipo de direitos ou garantias — 13º salário, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, contribuição previdenciária patronal, férias remuneradas, entre outros. E, pior: postos sem vínculo formal representam, em geral, remuneração menor. “Um empregado sem carteira ganha cerca de 40% a menos que um empregado com carteira assinada”.

Lembram da promessa de que bastava afastar Dilma e apertar o cinto no orçamento que a confiança dos investidores decolaria, retomando o crescimento e o emprego? Pois era uma falácia, como provam os números da PNAD. “A fada da confiança não compareceu ao encontro”, resume Moretti.

Possibilidades estranguladas
Para atrair investidores e reverter a letargia econômica, lembra o economista, é fundamental que o Estado retome os investimentos públicos, especialmente em áreas com forte potencial de geração de empregos, como obras de infraestrutura e programas habitacionais — como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o Minha Casa, Minha Vida.

A política de Michel Temer — que Bolsonaro quer aprofundar — trafega na contramão dessa lógica, apostando em uma austeridade fiscal que estrangula qualquer possibilidade de recuperação econômica. “E tem mais: sem investimento público para colocar a economia em movimento, também não se consegue induzir investimentos privados significativos”, ressalta Moretti.

Com Bolsonaro, os investimentos públicos previstos para 2019 serão os mais raquíticos desde 2009: R$ 36 bilhões.

Previdência garroteada
Um aspecto grave revelado pela PNAD é a sensível queda no número de pessoas que pagam contribuições para a Previdência. De 59,5 milhões de trabalhadores, em 2014, o contingente de contribuintes encolheu para 58,2 milhões em 2018.

São 1,3 milhões a menos, afetando a sustentabilidade da previdência social pelo lado da arrecadação. Entre 2003 e 2014, as receitas previdenciárias se expandiram (considerando a compensação do Tesouro pela desoneração), acompanhando os resultados positivos do mercado de trabalho e da massa salarial.

“Portanto, o que se precisa é analisar as dificuldades da Previdência, separando-se os fatores estruturais e o contexto da crise econômica e da consequente retração do mercado de trabalho e precarização dos empregos”, explica Moretti.

Trabalhadores informais — mal remunerados ou para quem a remuneração no final do mês é uma incerteza — dificilmente priorizariam o gasto com o pagamento de suas contribuições previdenciárias. O pior é que a situação tende a se agravar com a Reforma Trabalhista de Temer, pois formas precárias de trabalho não geram contribuição para a previdência.

“Isso afeta o sistema e comprova que a discussão sobre mudanças nas regras da Previdência não pode ser feita fora do debate sobre o mercado de trabalho”, enfatiza Moretti.

Se a política econômica de Temer já foi absolutamente incapaz de enfrentar o quadro recessivo, as perspectivas sob o governo Bolsonaro são ainda mais desanimadoras. A começar pela ameaças de campanha de que aprofundará a precarização de direitos trabalhistas, agravando ainda mais o quadro no mercado de trabalho.

A insistência de seu ministro da Economia, Paulo Guedes, em aprofundar o arrocho fiscal deve piorar ainda mais o quadro, afetando os investimentos nas áreas de infraestrutura e social.

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