Em 23 de abril, um dia após Bolsonaro sancionar tardiamente o orçamento anual, uma matéria publicada no endereço eletrônico da BBC Brasil, intitulada “Orçamento sancionado por Bolsonaro mantém risco de ‘shutdown’ do governo”, ressaltava a análise de Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente do Senado Federal. Para Salto, o orçamento sancionado mantém o risco de paralisação da máquina pública ou de serviços essenciais por falta de dinheiro.
A análise do diretor-executivo da IFI foi corroborada por agentes do “mercado”, que não perderam a oportunidade de reivindicar mais ajuste fiscal como forma de preservar a draconiana política de austeridade fiscal inaugurada pela EC 95/16 (teto de gastos). A ideia seria aprovar reformas estruturais capazes de reduzir as despesas obrigatórias e assim possibilitar o crescimento das despesas discricionárias, sem mexer no teto de gastos.
O fato é que o governo Bolsonaro não apenas escolheu o caminho apontado pelo mercado, mas escolheu também deixar o chamado shutdown acontecer, em especial na área da educação. Ao sancionar o orçamento anual, o governo Bolsonaro promoveu um corte de R$ 1,2 bilhão e um contingenciamento de R$ 2,72 bilhões no orçamento discricionário do Ministério da Educação, que se traduz em corte e contingenciamento no orçamento discricionário das instituições federais de ensino.
Diversas instituições federais de ensino denunciam os cortes e enfatizam que, caso não haja recomposição orçamentária, as universidades e institutos federais de educação terão seu funcionamento comprometido, uma vez que o orçamento discricionário, embora passível de contingenciamento, engloba despesas básicas para o funcionamento de qualquer instituição, como contas de água e luz, serviços terceirizados (limpeza, segurança…), compra de materiais e manutenção de equipamentos.
Mas a União não é responsável apenas pelo financiamento das instituições de ensino públicas federais. O § 1º do art. 211 da Constituição Federal determina que a União também deve prestar assistência técnica e financeira aos Estados, Distrito Federal e Municípios, de forma a garantir a equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino. A redução progressiva do orçamento discricionário do MEC também compromete essa função redistributiva e supletiva da União em matéria educacional, além do evidente descaso governamental com a educação básica pública.
Em sessão de debate temático sobre estratégia nacional de retorno seguro às aulas presenciais realizada no Senado Federal no último dia 14 de maio, o Secretário de Educação Básica do Ministério da Educação, Mauro Luiz Rabelo, destacou que o MEC empenhou em 2020, através do PDDE Emergencial (Programa Dinheiro Direto na Escola), R$ 672 milhões, dos quais R$ 524 milhões já haviam sido pagos até aquele momento, e que esses recursos foram destinados para as escolas adquirirem os insumos necessários para a retomada segura das atividades presenciais. Ocorre que a educação básica pública engloba um universo de aproximadamente 40 milhões de estudantes, de modo que R$ 524 milhões equivale a um investimento de somente R$ 13,10 por estudante, o que se revela totalmente insuficiente.
Não há que se falar, portanto, em risco de shutdown, mas sim que o governo Bolsonaro optou pelo shutdown e está escolhendo quais áreas serão primeiramente afetadas pela falta de recursos, tendo eleito a educação pública como alvo prioritário.
Diante de tantos e tamanhos ataques e retrocessos, em um contexto em que metade da população brasileira já se encontra em situação de insegurança alimentar, resta-nos fortalecer a luta em defesa da educação pública e os protestos convocados pelas frentes Brasil Popular e Povo sem Medo, uma vez que o governo Bolsonaro se revela mais perigoso que o vírus e impõe a necessidade da reação popular.