Nenhum direito a menos

Governo ataca projeto histórico de moradia popular

MTST ocupou a Avenida Paulista, garantiu a retomada das contratações de moradia na faixa 1 – voltada para as famílias de mais baixa renda e deu exemplo para a luta de outros setores
Governo ataca projeto histórico de moradia popular

Foto: Divulgação

Casa própria para quem precisa é uma bandeira do PT. Financiamento público para moradia sempre foi uma reivindicação dos movimentos sociais. Criado em 2003, durante o primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o Programa Minha Casa, Minha Vida tinha o objetivo de garantir moradia para os menos favorecidos. Tinha.

O governo Michel Temer deu uma guinada no conceito original e partiu para outro “mercado”, bem mais rentável: a classe média alta. A mudança de rumo é muito clara: enquanto na faixa 1,5 – dedicada a famílias com rendas mais baixas – o reajuste para o limite de renda familiar é de 10,74%, (de 2,35 mil para R$ 2,6 mil) na faixa mais alta, o teto tem um belo “puxadinho”: de R$ 6 mil para R$ 9 mil, crescendo nada menos que 38,46%. Apesar disso, o Palácio do Planalto, em sua página oficial, fala em correção modesta, pelo INPC: 7,69%.

Os movimentos sociais que lutam por moradia digna sentiram o golpe e foram para as ruas. Por vinte e dois dias, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) ocupou a Avenida Paulista, coração econômico de São Paulo. Acampado em frente ao escritório da Presidência da República, exigiu a retomada das contratações de moradia na faixa 1 – voltada para as famílias de mais baixa renda. Elas estavam suspensas desde a chegada do grupo de Michel Temer ao poder.

Encurralado pela resistência, o ministro das Cidades, Bruno Araújo comprometeu-se a publicar, ainda este mês, uma nova resolução para os projetos e a imediata retomada das contratações de moradias para famílias com renda mensal não superior a R$ 1,8 mil (a faixa 1). O governo diz que já estudava a medida e que a resistência do MTST não teve nenhuma relação com a decisão. Acredite quem quiser.

O sucesso do acampamento demonstra o temor governista das mobilizações sociais. O líder do movimento, Guilherme Boulos destaca que, embora o governo se recuse a admitir que cedeu à pressão, ela representa um marco para os movimentos sociais. “A conquista de um movimento sempre é um exemplo do que pode ser feito em termos de luta pela garantia dos direitos”, disse.

“O acampamento atingiu seu objetivo. Foram 22 dias de muita resistência, formação e cultura. Agradecemos a todas e todos que contribuíram de algum modo com esta grande luta. Aos que doaram alimentos, colchões, roupas. Aos que se apresentaram na tenda cultural, compartilhando seu conhecimento ou sua arte. A todos os movimentos, sindicatos e ativistas que foram solidários e passaram, em algum momento, por lá”, afirmou o movimento, em nota.

Sobre a promessa do governo de baixar portaria, diz que o que leva o MTST a acreditar é o fato de o governo ter admitido receber e negociar com o movimento. “Foi a luta de 22 dias do movimento e a história de luta que fez com que chegássemos a isso, diz Boulos.

E, se o governo não cumprir? “Se o governo não cumprir o acordo de baixar a portaria até o dia 31 e retomar as contratações para as faixas 1 e 1,5 nós voltaremos à luta”, disse

Ótica do mercado

Direcionar um grande programa habitacional, com garantia de financiamento do caixa do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e taxas de juros muito inferiores às praticadas pelo mercado encantou bancos, incorporadoras e corretores de imóvel. Na internet, é fácil encontrar matérias supostamente jornalísticas comemorando “um novo conceito de moradia” ou a “movimentação do mercado de imóveis” .

A mudança de rota no programa revela o interesse do governo em subsidiar a classe média. “Para os bancos, é muito mais interessante e menos arriscado conceder crédito para quem tem renda maior e pode pagar prestações mais altas”, enfatiza a ex-secretária de Orçamento, Esther Dweck.

O objetivo do programa era garantir moradia para quem não tinha onde morar. Privilegiar a classe média alta em muito pouco ou absolutamente nada contribuirá para resolver o déficit habitacional brasileiro, estimado em mais de seis milhões de unidades (dados de 2014).

Modalidade entidades

Quando se reuniu com o MTST para tratar da desocupação da Paulista, o ministro Bruno Araújo disse que, entre as novidades a serem anunciadas até o final deste mês, está a meta de contratação de 35 mil unidades por meio da modalidade”entidades”.

Trata-se de uma linha especial para tornar a moradia acessível às famílias organizadas por meio de cooperativas habitacionais, associações e demais entidades privadas sem fins lucrativos.

O programa, ligado à Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades, é dirigido a famílias de renda familiar mensal bruta de até R$ 1.600,00 e estimula o cooperativismo e a participação da população como protagonista na solução dos seus problemas habitacionais.

A meia-volta do governo, segundo o MTST, mostra a força dos movimentos sociais. “A união entre a cultura e a luta por moradia mostrou-se a principal arma de atração popular, fazendo com que a os constantes ataques e tentativas de deslegitimar o movimento fossem inúteis. A cada dia, mais e mais pessoas se encantavam com o que viam no acampamento, situado logo na esquina com a Rua Augusta, uma das mais badaladas da cidade, e bem em frente ao Escritório da Presidência da República”, diz o texto publicado na página do MTST para anunciar o fim da ocupação.

Parlamentares petistas estiveram presentes para dar seu apoio ao movimento e deixar clara a sua indignação com o desvirtuamento das políticas sociais criadas pelos governos Lula e Dilma.

Reprodução autorizada mediante citação do site PT no Senado

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