Um processo de livre negociação como está proposta no texto da reforma trabalhista só é possível construir num ambiente de pleno emprego e de crescimento econômico, quando a demanda por mão de obra contribui para reduzir o desequilíbrio entre a força de quem emprega e a fragilidade de quem vive de seu trabalho. Além disso, é preciso que haja legitimidade do governo para conduzir uma mudança dessa magnitude. “É tudo o que não temos hoje”, resume o presidente nacional da CUT, Vagner Freitas.
“Que legitimidade ou credibilidade tem um presidente da República que acaba de ser indiciado criminalmente pela Procuradoria-Geral da República — fato inédito na história — e pode cair a qualquer momento?”, questiona o sindicalista. Ele foi um dos debatedores das audiências públicas realizadas nesta terça-feira (27) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para analisar o projeto de reforma trabalhista, que deve ser votado pelo colegiado nesta quarta-feira (28).
Sem legitimidade
“O Senado e a CCJ não têm a menor condição de votar uma reforma trabalhista nesta conjuntura”, reforça o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ). Ele defende que se paralise a tramitação de todas as reformas.
Vagner Freitas ressalta que no cenário atual — uma profunda depressão econômica, com 14 milhões de desempregados e a maior crise social, política, moral e ética da história do Brasil— não pode haver ilusão: as mudanças contidas na reforma vão desorganizar completamente o mercado de trabalho. “E isso sem nenhuma negociação com os trabalhadores, de forma unilateral, seguindo apenas o ponto de vista da bancada patronal no Congresso”.
Prejuízo para o País
O prejuízo, alerta ele, não será apenas de quem vive de salário, mas de toda a sociedade. O trabalho organizado, com carteira assinada, constitui a possibilidade de consumo no Brasil. Ao precarizar os vínculos trabalhistas, ao institucionalizar o bico, a reforma vai resultar em milhões de trabalhadores que não terão mais como comprovar renda. “O mercado de crédito vai decrescer, o comércio e os serviços vão decrescer”, explica o presidente da CUT.
Os efeitos sobre a Previdência também serão devastadores. Ao desregulamentar o mercado de trabalho e reduzir os vínculos laborais formais, também serão reduzidas as contribuições previdenciárias, colocando em risco o sistema e sua capacidade de pagar futuras aposentadorias. “A reforma trabalhista já faz a reforma da Previdência”, adverte Vagner. O risco, aliás, não é só para as próximas gerações. Quem já está aposentado hoje pode ficar sem seu benefício, já que a precarização do vínculo reduzirá o volume das contribuição dos ativos de agora.
“Isso é a desconstrução da previdência pública e a criação da previdência privada, acessível apenas a 15% ou 20% da população, que vai comprar planos de aposentadoria nos balcões de bancos. A maioria dos trabalhadores, porém, não vai se aposentar nunca mais”, alerta o sindicalista.
Modernidade não é tirar direitos
Para quem aponta a “modernidade” de colocar condições de trabalho negociadas individualmente entre patrões e empregados acima do que está na lei, Vagner Freitas lembra que é no mínimo incoerente deflagrar a reforma trabalhista sem qualquer negociação com os trabalhadores. “Se é verdade que querem enfatizar a negociação coletiva, se é verdade que querem enfatizar os contratos de trabalho, então, senhores e senhoras, retirem essa proposta neste momento, porque aqui o que está sendo feito é exatamente o inverso da negociação”.
Para o presidente da CUT, a atualização da legislação trabalhista pode e deve ser discutida, mas em outro ambiente político, social e econômico. “Vamos restabelecer a normalidade democrática, convocar eleições diretas, voltar a ter um governo com legitimidade. Aí sim, vamos instituir uma mesa nacional de negociação entre patrões e empregados e estabelecer critérios novos que venham a dar modernidade às relações de trabalho. E modernidade não é sucateamento de direitos”.
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