Humberto “Os democratas verdadeiros não querem repetição do que aconteceu no passado”Sessenta e um anos depois de Getúlio Vargas tirar a própria vida com um tiro no peito, as mesmas elites, hoje, tentam forçar a queda de um governo democraticamente eleito. Essa foi, em síntese, a mensagem deixada pelo líder do PT no Senado, Humberto Costa, um dos oradores da solene do Congresso que lembrou a morte do ex-presidente.
Humberto, que subiu à tribuna representando o Partido dos Trabalhadores, traçou vários paralelos e semelhanças entre o momento político atual e as dramáticas circunstâncias criadas pela pressão desmedida de algumas empresas de mídia e políticos conservadores para desestabilizar um governo popular, inconformados com a derrota colhida nas eleições presidenciais.
“Parece que estamos assistindo ao mesmo vídeo, onde os poderosos de sempre, que nunca tiveram compromisso com a democracia e a liberdade, tentam reproduzir o mesmo quadro”, afirmou o senador pernambucano, ao relacionar também que os opositores que hoje acossamdo governo Dilma Rousseff na mídia “não têm o mesmo brilhantismo de Carlos Lacerda”.
O Corvo
Lacerda, conhecido como pela alcunha de “o Corvo”, além de político, era também dono de jornal para alimentar a oposição violenta das elites contra Getúlio Vargas e o trabalhismo que, pela primeira vez, reconhecia direitos dos trabalhadores. Com instrumentos e o amplo emprego da “meia verdade e da calúnia”, frisou o líder do PT, uma classe média furiosa levantou-se contra a implementação de medidas voltadas para o trabalhador, como a criação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que instituiu os direitos trabalhistas, a criação da Petrobras, o voto feminino e a ampla participação do povo por meio do voto secreto, também instituído por Getúlio Vargas.
A tática de ataque dos oposicionistas era acusar Vargas de corrupção e de ser o líder de uma quadrilha que havia criado um “mar de lama” no Brasil.
Qualquer semelhança entre o sentimento de aversão ao governo popular artificialmente criado na época e as últimas manifestações contra o governo Dilma não é mera coincidência.
Getúlio, num gesto definido por Humberto como “corajoso”, suicidou-se. Com isso, acredita o líder do PT, o presidente evitou que se instalasse uma ditadura militar no País, já que a morte do chefe do Executivo acabou por virar o jogo e colocou a população ao lado do falecido. “A instalação da ditadura infelizmente acabou ocorrendo em 1964, quando depuseram João Goulart”, lamentou Humberto.
Para Humberto, Getúlio Vargas foi o inspirador de todos os movimentos sociais e de esquerda. “Embora vindo de uma família de elite, foi capaz de se sensibilizar com as desigualdades; mesmo vivendo nos costumes da Velha República, liderou a Revolução de 30 que modificou a história do Brasil e implementou mudanças estratégicas além de criar uma infraestrutura mínima para podermos ser o que somos”, disse.
“Neste momento político da Nação, está na hora de juntar os verdadeiros democratas que não querem a repetição do que aconteceu no passado”, concluiu.
Para o ministro do Trabalho, Manoel Dias, a defesa da soberania nacional, da liberdade e da democracia foi a mensagem mais importante deixada por Vargas. “Ele sofreu tanta pressão quanto João Goulart, Leonel Brizola e a atual presidenta, Dilma Rousseff”, observou.
Na sessão ordinária do Senado, à tarde, o senador Jorge Viana (PT-AC) também fez questão de homenagear Getúlio Vargas. Ele observou que o legado da Era Vargas une realizações e contradições, como ocorreu com o governo de Juscelino Kubitschek. “Talvez tenham nos deixado, ambos, uma grande lição: o melhor caminho é cumprir a Constituição, o melhor caminho é o da tolerância em vez do ódio, o melhor caminho é o fortalecimento das instituições e não a destruição delas”, disse senador.
Audiência
No início da manhã, em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH), senadores trabalhistas, historiadores e lideranças sindicais se uniram para alertar contra duas ameaças aos princípios trabalhistas herdados de Getúlio Vargas: o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 30/15, que trata da terceirização, e o Projeto de Lei do Senado (PLS) 131/15, que revoga participação mínima da Petrobras na exploração do petróleo localizado em reservas do pré-sal.
“Estamos aqui revivendo a história do povo brasileiro, de pessoas como Getúlio, cuja vida estava diretamente envolvida com a história do nosso povo”, disse o senador Telmário Mota (PDT-RR), que foi o autor do requerimento para a realização da audiência e da Semana do Trabalhismo.
O presidente da CDH, senador Paulo Paim (PT-RS), lembrou a perda que representou a morte do presidente. “Eu era um guri de quatro anos quando isso aconteceu. Minha família chorou a perda de Getúlio. Mas meus pais nunca me deixaram esquecer da importância do trabalhismo para nós de classe trabalhadora”, disse.
Para o historiador José Augusto Ribeiro, autor do livro “A era Vargas”, o ataque das forças internacionais interessadas em explorar o petróleo brasileiro e as riquezas em estado bruto do país, como as commodities, foi o real motivo da violenta campanha desencadeada contra Getúlio. A difamação e a constante propaganda por parte do sistema de mídia instalado no país, à época comandado por Assis Chateaubriand, dos Diários Associados e comandados pelo jornalista Carlos Lacerda, teriam sido determinantes para colocar a opinião pública contra o então presidente, explicou o autor.