Senhor presidente, caros colegas senadores e senadoras,
ouvintes da Rádio Senado,
espectadores da
Venho hoje a esta tribuna trazer um tema que mobilizou a sociedade brasileira e em especial as sociedades pernambucana e goiana. Refiro-me ao assassinato do jornalista goiano Lucas Cardoso Fortuna, encontrado morto no domingo passado, na praia de Calhetas, no Cabo de Santo Agostinho, litoral sul de Pernambuco. As razões do crime ainda são desconhecidas, mas há suspeitas de que Lucas tenha sido morto por motivos homofóbicos.
O jovem, de 28 anos, era árbitro de voleibol e estava em Pernambuco a serviço da Federação Goiana para participar de um campeonato. Lucas também era presidente do Partido dos Trabalhadores no município de Santo Antônio de Goiás, Região Metropolitana de Goiânia, e fundador do Grupo Colcha de Retalhos, que luta pela causa LGBT na Universidade Federal de Goiás.
Segundo informações do Instituto de Medicina Legal (IML), Lucas morreu por afogamento, mas colegas do jovem relatam que o corpo apresentava também sinais de violência física, como espancamento. Há também a informação de que os pertences de rapaz foram encontrados juntos do cadáver. Ontem, quarta-feira, o jornalista foi sepultado
Caro presidente, gostaria de registrar meu voto de pesar e solidariedade à família e aos amigos de Lucas. Essa foi mais uma vida retirada precocemente, e de forma brutal – a vida de um jovem que teria tanto a contribuir para a nossa sociedade, e, em especial, na luta pelos direitos dos homossexuais. Como disse o pai de Lucas, a morte do seu filho deve servir para que a sociedade reflita o que está fazendo com os jovens.
Vamos ainda aguardar o resultado das investigações que apontarão os reais motivos do assassinato e, sobretudo, que poderão identificar o autor do crime. Esperamos que o culpado por essa covardia seja encontrado e devidamente punido.
Esse caso, caros colegas senadores e senadoras, reascende um debate muito importante
Somente no ano passado, o Brasil registrou mais de 278 assassinatos por motivos de homofobia – isso só os casos noticiados pela mídia. Os dados são da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.
A partir de denúncias ao poder público, referentes à violação de direitos humanos cometidas contra a população LGBT em
É importante nos debruçarmos sobre esses dados para que possamos entender melhor essa triste realidade, identificando as ocorrências da violência e suas características. O relatório mostrou que, de janeiro a dezembro de 2011, foram denunciadas 6.809 violações de direitos humanos contra a população LGBT. Por meio desse levantamento, foi possível identificar o padrão de sobreposição de violências cometidas contra vítimas que apresentam um comportamento semelhante. Ou seja, a repetição dos registros de violência aponta um desejo de destruir – fisicamente, moralmente, ou psicologicamente – não somente o indivíduo, mas o grupo ao qual ele representa.
A pesquisa sugere ainda que as agressões muitas vezes são realizadas por um grupo de pessoas que se reúne para espancar os homossexuais. No que diz respeito ao sexo biológico, 67,5% das vítimas nasceram do sexo masculino e 26,4% do sexo feminino e outros 6,1% não informaram.
O levantamento da Secretaria de Direitos Humanos evidencia também que a violência psicológica é predominante. Ela representa 42,5% dos casos registrados em 2011. Em seguida, vem a discriminação, com 22,3% das notificações realizadas e depois a violência física, correspondendo a 15,9% dos registros. Entre as agressões físicas, as mais comuns são as lesões corporais – representando 55,7% delas – e, depois, vêm os maus tratos, com 31,8% das notificações. Em seguida temos a tentativa de homicídio, com 3,7% dos casos verificados, e o homicídio, que correspondem a 3,5% das ocorrências.
Apesar da importância desse levantamento, é preocupante observar ainda o elevado grau de subnotificação dos dados relacionados à violência – tal qual ocorre com as agressões contra as mulheres. Isso significa que a violência por motivos homofóbicos pode ainda ser maior do que o retratado. Essa subnotificação pode estar associada à naturalização da violência como o único tratamento possível; às vítimas que às vezes culpam a si mesmas; ao receio do preconceito por parte dos órgãos que recebem as denúncias; ou, ainda, à falta de informação sobre os meios de denúncia.
A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República vem firmando parcerias com algumas entidades para ajudar na divulgação do Disque Direitos Humanos – Disque
Mas, além de subsidiar o governo e as entidades da sociedade civil com dados importantes, o Disque 100 encaminha todas as denúncias recebidas para a apuração dos órgãos competentes com o objetivo de assegurar a proteção da vítima e a responsabilização do agressor. Vale lembrar que esse serviço se destina não somente à população LGBT, mas às crianças, aos adolescentes, aos idosos, às pessoas com deficiência e de outros grupos sociais mais vulneráveis, que se sentirem ameaçadas e agredidas.
É importante que as pessoas – vítimas, amigos ou quem quer que seja – ao presenciarem algum ato de violência, não tenham medo de denunciar os agressores ou de buscar a defesa dos seus direitos. Isso ajudará no empoderamento de grupos da sociedade que, infelizmente, ainda são muito discriminados. Dessa forma, nossa sociedade poderá se fortalecer e se tornar mais harmoniosa e igual.
Os Comitês Estaduais de Enfrentamento à Homofobia, que estão sendo instalados em todo o País, assim como a Campanha Faça do Brasil um Território Livre também são outras importantes iniciativas da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Precisamos ajudar na divulgação e no fortalecimento desses instrumentos.
O Programa Brasil sem Homofobia foi lançado em 2004, depois de uma série de discussões do governo federal com a sociedade civil organizada. Seu objetivo é promover a cidadania e os direitos humanos da população LGBT a partir da igualdade de direitos e do combate à violência e à discriminação homofóbicas.
São várias as ações que compõem o programa: o apoio a projetos de fortalecimento de instituições públicas e não-governamentais que atuem na promoção da cidadania LGBT; a capacitação em direitos humanos para profissionais e representantes do movimento LGBT que atuam na defesa de direitos humanos; a disseminação de informações sobre a promoção da autoestima LGBT; o incentivo à denúncia de violações dos direitos humanos da população LGBT; e a troca de experiências de sucesso em políticas públicas com vários países do mundo, dentre outras iniciativas.
O Brasil, nos últimos anos, deu passos importantes para garantir a cidadania e a igualdade de direitos à população LGBT. Podemos citar o reconhecimento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) da união estável entre pessoas do mesmo sexo, assim como a aprovação de leis estaduais e municipais definindo multas e sanções para os casos de discriminação e a criação do Conselho Nacional de Combate a Discriminação. Mas, para obtermos essas conquistas, foram necessárias muita luta e mobilização. E, infelizmente, muitas dessas vitórias vêm da dor e do sofrimento decorrentes das agressões aos militantes da causa.
Precisamos ainda avançar para que nós, brasileiros, tenhamos uma sociedade mais tolerante e humana. Devemos repudiar veementemente os crimes bárbaros de motivação homofóbica, como esse que, tudo indica, vitimou Lucas Cardoso Fortuna. É preciso, sempre, refutar qualquer e ato de violência e de discriminação.
Muito obrigado.