Impeachment sem crime pode ser um caminho sem volta, avalia Roberto Muniz

Impeachment sem crime pode ser um caminho sem volta, avalia Roberto Muniz

Se o Senado der continuidade ao processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff sem provas de crime de responsabilidade poderá estar criando o caos e um caminho sem retomo, afirmou o senador Roberto Muniz (PP-BA). “Pergunto aos meus colegas senadores, ao encerrar esta sessão, supondo a continuidade deste processo, ao apagarmos as luzes e abrirmos as portas do Brasil com esse novo farol legal, como ficará a situação de diversos, centenas, talvez milhares de gestores públicos deste País?”, questionou ele, ao falar contra a pronúncia da presidenta, na noite desta terça-feira.

Muniz lembrou que não há provas de que, Dilma tenha determinado previamente a adoção de meios inadequados aos órgãos técnicos para atingir as finalidades escolhidas por ela. “A gestora agiu baseada por expressos posicionamentos dos órgãos técnicos, que afirmavam a legalidade dos atos, até então. Concluo, então, que não há dolo e nem omissão”, atestou o senador. “Mesmo que se tenha constatado uma irregularidade fiscal, isso não alcança o patamar de crime de responsabilidade”. 

Leia a íntegra do pronunciamento do senador Roberto Muniz (PP-BA):

 

Exmo Sr. Presidente desta Sessão, Dr. Ricardo Lewandowski, senhores e senhoras, Senadores e Senadoras, caros ouvintes da rádio e telespectadores da TV Senado.

Meus caros, desde que tomei posse no Senado, há pouco mais de dois meses, pude analisar dados, dialogar com meus pares, meus assessores, com eleitores e acompanhar a imprensa. De fora, acompanho esse momento desde o início, como todos os brasileiros, alguns perplexos, outros felizes, mas todos ávidos por um final. Quis o destino me colocar aqui, neste momento tão importante para a democracia brasileira.

E, como entendo que a democracia é um aprendizado, vejo nesse rito um rito de passagem em que forças democráticas se fortalecem. A democracia tem um traço de genialidade, tal qual a Catedral da Sagrada Família de Gaudí, uma obra-prima que, apesar de inacabada, o tempo aperfeiçoa.

Quero deixar registrado: Dilma Rousseff é e será para nossa história a primeira mulher Presidente do Brasil. Caros colegas, registro esse fato histórico para que não possamos mais prescindir da presença da mulher nos mais altos postos de comando desta Nação.

Não devemos permitir uma fotografia de disputa de gêneros ou de preconceitos. Temos todos a obrigação de preservar o espaço das mulheres. Uma caminhada de luta que tem a força de símbolos como Maria Quitéria, Princesa Isabel, Olga Benário, Anita Malfatti, Zilda Arns, Rachel de Queiroz, Irmã Dulce, Chiquinha Gonzaga e muitas outras.

Por isso eu repito: Dilma Rousseff é e será para nossa história a primeira mulher Presidente do Brasil. E que muitas outras mulheres possam chegar a este cargo.

Diversidade é uma marca do nosso povo! Vamos continuar lutando pela afirmação da diversidade como patrimônio social do nosso País.

Senhoras e senhores, a responsabilidade me impele, no meu primeiro voto neste processo, não julgar com o olhar na pessoa Dilma Roussef, mas sim fazê-lo estritamente limitado na moldura processual e no relatório do Senador Antonio Anastasia, a quem de público parabenizo e a todos os membros da Comissão do Impeachment pela dedicação aos trabalhos.

Assista ao discurso do senador Roberto Muniz (PP-BA)Sem paixão, mas com o olhar daqueles que aqui dentro têm a árdua tarefa de participar desta sessão, tenho a convicção de que o Parlamento brasileiro não está aquartelado fisicamente. Mas temos que destacar que entre as pretéritas batalhas de baionetas e flores novas formas de defender e impor interesses surgiram na sociedade moderna e do conhecimento. E exatamente por isso deveremos ser e seremos soberanos nas nossas escolhas para reafirmar a democracia em nosso País.

Não há provas. Agora, vamos analisar os fatos e o relatório.

A Presidente é acusada da emissão de seis decretos de crédito suplementar e da chamada pedalada fiscal em 2015. Ou seja, a Presidenta Dilma é uma gestora acusada de atos impróprios.

A Acusação entende que o gasto da gestora ocorreu sem autorização legislativa e a pedalada é uma maquiagem fiscal. A Defesa entende que os decretos foram remanejamentos e não ampliação dos gastos públicos. E, sobre as pedaladas, afirma se resumir a atrasos de pagamentos ao banco estatal.

Como ficou a posição das instituições externas instadas à análise do problema?

O Tribunal de Contas da União não se pronunciou ainda. No Senado Federal, a perícia realizada por especialistas afirma que não houve ATO DA PRESIDENTE nas chamadas pedaladas. Restando três decretos assinados pela gestora sem a permissão do Legislativo. O Ministério Público Federal em investigação externa concluiu pela inexistência de ilegalidade nos atos.

Em resumo, no emaranhado de relevantes teses jurídicas e contábeis, sobram dúvidas e apenas três decretos em desconformidade legal. Sobrando as dúvidas e os três decretos, o nobre Relator conclui inicialmente pelo processamento e depois pelo julgamento favorável ao impeachment.

A Acusação sustenta sua tese em dois pontos: primeiro, que cabe aos gestores públicos a obrigação e presunção do conhecimento pormenorizado e inequívoco pela dimensão das operações financeiras realizadas.

Segundo, que havia uma vontade expressa de fazer as operações, demonstrando dolo no ato da gestora.

Não há provas. Sr. Presidente, de que a gestora determinou previamente a adoção de meios inadequados aos órgãos técnicos para atingir as finalidades escolhidas por ela.

A gestora agiu baseada por expressos posicionamentos dos órgãos técnicos, que afirmavam a legalidade dos atos, até então.

Por fim, ainda havia debate entre as áreas técnicas do Tribunal de Contas e do Executivo e havia até ausência de registros dessa prática por parte do TCU.

Concluo, então, que não há dolo e nem omissão.

Porém, o mais importante que acho é entender que, mesmo que se tenha constatado uma irregularidade fiscal, o mesmo não alcança o patamar de crime de responsabilidade.

O precedente que podemos estabelecer hoje me faz resgatar as celebres palavras do jurista baiano Calmon de Passos: “Como tem demonstrado a história, em mais de uma oportunidade, quase sempre a reação a determinado estado de coisas leva a posturas radicais no sentido contrário”.

Processar e penalizar sem aferir a dosimetria, Presidente, é tender a uma pena injusta, sem proporcionalidade.

A pena compensação como um mal pelo mal é uma pena desnecessária! Processar e penalizar sem aferir a dosimetria é tender a uma pena injusta, sem proporcionalidade.

A banalização do instituto do impeachment poderá servir de mecanismo para espancar, submeter ou mesmo sub-rogar a legitimidade popular.

E chamo ainda atenção, que por processos semelhantes, Presidente, todos os Tribunais de Contas de Estados e Municípios são rotineiramente instados a se posicionarem sobre as contas de gestores públicos e municipais, principalmente, nas questões referentes à abertura de créditos suplementares sem a devida autorização legislativa.

Perplexo fico, chegando a esta Casa, ao perceber que a pena máxima adotada até então, em todos os outros casos que a mim chegaram, é a rejeição das contas.

Os pareceres dos Tribunais de Contas sempre foram pela rejeição ou aprovação das contas públicas.

E todos os debates, nas câmaras e assembleias legislativas, foram no sentido de tentar traduzir se deveria permanecer ou não essa rejeição ou aprovação.

E aqui o que fazemos hoje senão o mesmo processo?

O resultado dos julgamentos feitos no Legislativo nunca ensaiou o que estamos vivendo aqui neste momento.

E agora, o que fazemos? Inauguramos um novo caminho processual.

Então, eu pergunto aos meus colegas Senadores, ao encerrar esta sessão, supondo a continuidade deste processo, Sr. Presidente, e ao sairmos, ao apagarmos as luzes e abrirmos as portas do Brasil com esse novo farol legal, como ficará a situação de diversos, centenas, talvez milhares de gestores públicos deste Pais?

Ilmº Sr. Presidente do Supremo Tribunal Federal, Dr. Ricardo Lewandowski, aqui presidindo esta sessão, pergunto a V. Exª se todas essas disputas que antes estavam restritas à rejeição de contas não vão desaguar no âmbito do STF para que se possa fazer com governadores e prefeitos a mesma aplicação dessa penalidade proposta.

Estamos criando o caos? Um caminho sem retomo?

Olhando para o passado, assentado sob o manto da rejeição das contas, já chegamos até a inelegibilidade futura do gestor. No entanto, entendo que a dúvida da intensidade da pena proposta pelo relatório do Senador Anastasia persistirá na história do Brasil.

E só o futuro trará a resposta.

Para finalizar: assim, Sr. Presidente, visto dessa forma, percebendo as dúvidas técnicas que pairam sobre a matéria e a insegurança jurídica que isso representa, quero registrar em alto e bom som que, analisando o relatório e as provas colhidas, retirando a figura da Presidente Dilma Rousseff, pensando no futuro e na governabilidade das várias instâncias do meu País, eu voto pelo não prosseguimento do processo.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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