Após dois recordes anuais consecutivos – em 2020 (19,40%) e 2021 (28,39%) – a inflação de “porta de fábrica” novamente ameaça a indústria. O Índice de Preços ao Produtor (IPP) subiu 1,00% em junho, ante 9,03% em maio. É a segunda maior variação para o mês desde o início da série histórica (2014). No primeiro semestre de 2022, o indicador já chegou a 10,12%. No acumulado em 12 meses, os preços da indústria subiram 18,78%.
Divulgado nesta quinta-feira (28) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o IPP das Indústrias Extrativas e de Transformação mede preços de produtos sem impostos e fretes, e abrange as grandes categorias econômicas: bens de capital, bens intermediários e bens de consumo (duráveis, semiduráveis e não duráveis). Em junho, das 24 atividades analisadas pelo IBGE, 15 tiveram alta de preços.
Destaque do mês, a indústria de refino de petróleo e biocombustíveis apresentou a maior variação (4,05%) e a maior influência: 0,52 ponto percentual (p.p.). Com isso, avançaram tanto o acumulado no ano (de 26,37%, em maio, para 31,48%) quanto no acumulado em 12 meses (de 53,79% para 59,69%). A alta foi puxada pelos derivados como o querosene de aviação, a gasolina e, principalmente, o óleo diesel.
“O aumento desses produtos ocorre, em parte, por conta dos maiores preços do petróleo bruto, que está com uma demanda global aquecida desde meados de 2021, mas que não está sendo acompanhada por um crescimento da oferta. Fatores como a guerra entre a Rússia e Ucrânia acabam limitando ainda mais essa oferta mundial”, explica o analista da pesquisa, Murilo Alvim.
Outro destaque foi o setor de alimentos, cujos preços avançaram pelo quinto mês consecutivo. Em grande medida, por conta dos maiores preços de leite e derivados. “O grupo de laticínios mostra variação de 14,91% no mês, sendo esse o maior resultado em toda a série nesse indicador”, ressalta o analista.
“Essa alta é consequência do início do período de entressafra do leite, que acabou limitando uma oferta já escassa devido a questões climáticas e por maiores custos de produção”, explica Alvim. “Outro produto que ajuda a explicar essa alta de alimentos são os açúcares, produtos exportáveis com demanda externa aquecida. Além de ter ocorrido aumento do dólar no mês, de 1,9%, que aumenta o preço recebido em real pelo produtor.”
Preço de commodities caem no mercado internacional
Os quatro setores com maiores variações, em termos absolutos, foram refino de petróleo e biocombustíveis (4,05%); impressão (3,97%); indústrias extrativas (-2,89%); e alimentos (1,99%). As maiores influências ocorreram em refino de petróleo e biocombustíveis (0,52 p.p), alimentos (0,46 p.p.), indústrias extrativas (-0,17 p.p.) e metalurgia (-0,10 p.p.)
Em contraponto aos setores que impulsionaram os preços de junho para cima, a indústria extrativa sofreu queda de 2,89%, com a variação menos intensa observada no setor nesse primeiro semestre. Segundo Alvim, os dois produtos de maior peso da área caminharam em direções contrárias. Os óleos brutos de petróleo apresentaram alta no mês, mas foram mais que compensados pela queda em minérios de ferro.
“Os resultados estão de acordo com a variação dessas commodities no mercado internacional”, esclarece o analista. “No caso dos minérios de ferro, a queda ocorre por conta de uma demanda desacelerada pelo produto, em especial por parte da China. E a desaceleração econômica nos Estados Unidos e na Europa também tem impactado o preço da commodity”, esclarece o analista.
Bolsonaro e Guedes abandonaram a indústria
Após a supressão de iniciativas e investimentos federais ocorrida sob Michel Temer, o desgoverno Bolsonaro agravou deliberadamente o abandono da indústria transferindo responsabilidades para o “mercado”. A ausência de Estado levou ao vácuo de propostas e projetos para o país que marca o último ano de Jair Bolsonaro no Planalto.
O alto desemprego e o arrocho salarial criados pela “reforma trabalhista” de 2017 também se agravaram sob Bolsonaro, afetando a capacidade de consumo das famílias, reduzindo a demanda da sociedade, aniquilando o dinamismo da atividade produtiva e retroalimentando a queda de empregos e de renda.
A desindustrialização no Brasil se acelerou nos últimos sete anos, agravando-se ainda mais desde que Jair Bolsonaro e seu ministro-banqueiro Paulo Guedes abandonaram os setores da economia produtiva para privilegiar o capital financeiro. Concomitantes, financeirização e desmonte do parque industrial fecharam as portas de milhares de fábricas e desempregaram um milhão de trabalhadores nos últimos dez anos.
Desde 2011 até 2020, a indústria perdeu 9.579 empresas, ou 3,1% do total, aponta a Pesquisa Industrial Anual (PIA): Empresa e Produto 2020. Apenas entre o primeiro e o segundo ano de Bolsonaro (2019/2020), 2.865 empresas encerraram as atividades enquanto Guedes cortejava seus pares no mercado financeiro.
Em suas entrevistas, Luiz Inácio Lula da Silva vem destacando a importância dos investimentos públicos para reativar a depauperada economia que restará como legado do bolsonarismo.
“Para se transformar em um país industrial, é preciso que você faça investimento em ciência e tecnologia, é preciso que você faça mais universidades, mais escolas técnicas”, apontou Lula em entrevista concedida em abril para a Rádio Conexão 98 de Palmas (TO). “Não existe política de desenvolvimento do Bolsonaro. O que existe é uma política de venda daquilo que foi construído ao longo de tantos e tantos anos porque não tem política de desenvolvimento, não tem projeto industrial.”
Nesta quinta, Lula reafirmou seu compromisso com a ciência e a tecnologia como fator de desenvolvimento e prosperidade. “Estou certo de que seremos capazes de fazer com que a pesquisa científica, a inovação e a educação sejam revalorizadas como alavancas para o crescimento econômico, a reindustrialização do país e a redução da pobreza, buscando uma economia ambientalmente sustentável e solidária”, disse Lula na 74ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), na Universidade de Brasília (UnB).
Com informações da Agência IBGE