O governo Bolsonaro acaba de dar mais uma demonstração de desrespeito à autonomia das instituições. Além das investidas contra o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), a Receita Federal e a Polícia Federal — forçando inclusive a troca de comando nesses dois órgãos — o ocupante do Planalto resolveu desagradar ao conjunto do Ministério Público indicando um nome estranho à lista tríplice votada pela categoria para comandar a Procuradoria-Geral da República (PGR).
“Jair Bolsonaro procura permanentemente interferir na autonomia das instituições, destruir o republicanismo que nós implantamos a partir da Constituição de 88”, aponta o Líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), para quem a busca de um PGR alinhado politicamente com o governo é apenas mais do mesmo movimento que busca submeter os órgãos de controle aos desígnios do chefe do Executivo.
Proteger aliados?
“Qual é o objetivo? É proteger aliados? É proteger pessoas da proximidade pessoal do Presidente da República? É para usar essas nomeações para perseguir os inimigos políticos?”, cobra o senador petista, chamando a atenção para o contraste dessa postura de Bolsonaro com o procedimento adotado nos governos petistas.
“Nós demos autonomia à Polícia Federal. Nós não procuramos, em nenhum momento, restringir a autonomia e a independência do Ministério Público Federal. Durante os governos do PT, todos os procuradores-gerais da República foram aqueles que foram escolhidos em primeiro lugar na eleição do próprio Ministério Público Federal”.
Embalem Mateus
A escolha do procurador Augusto Aras para a PGR provocou as lamúrias de integrantes da Lava Jato, como Deltan Dallagnol, que usou o Twitter para choramingar sua saudade do respeito à lista tríplice. Ele lembrou que o método “favorece a escolha de um PGR testado e aprovado em sua história e seus planos, assim como a independência do Ministério Público”.
Os vagidos de Dallagnol não passaram em branco. “Vocês trabalharam ativamente para eleger Jair Bolsonaro. O chefe de vocês, Sergio Moro, hoje é ministro da Justiça e conselheiro do presidente para esses temas, a turma da Lava Jato está toda no poder. Está reclamando de quê? Quem pariu Mateus, que o embale!”, reagiu Humberto Costa no Twitter.
Fora da lista
Bolsonaro anunciou a indicação de Augusto Aras na última quinta-feira (5). Se for aprovado pelo Senado, ele irá suceder a Raquel Dodge no comando da PGR. Aras não consta da lista tríplice elaborada pelos membros do Ministério Público — os três nomes mais votados foram os procuradores Mário Bonsaglia, Luiza Frischeisen e Blal Dalloul.
Durante os governos do PT, Lula e Dilma adotaram o procedimento de indicar para a Procuradoria-Geral da República o mais votado pelo MP. Em 2017, Michel Temer escolheu a segunda colocada da lista, Raquel Dodge, que agora chegou a ter esperanças de ser reconduzida ao cargo.
Saudades do PT
As insistentes intervenções de Bolsonaro em instituições como a PF, a Receita e o Ministério Público, lembra Humberto, deve estar provocando saudades dos governos petistas nos integrantes desses órgãos.
“Fico vendo os procuradores, boa parte deles, se colocam contra nós. Muita gente na Polícia Federal se colocava e se coloca contra nós e agora? Deviam ter a dignidade de publicamente dizer: ‘Estamos com saudade do tratamento que os governos do PT davam às instituições”.
Moro Humilhado
O senador ressalta que o maior desconforto com essa realidade deve ser o de Sergio Moro. “A maior vítima de todo esse processo é o ex-paladino da moralidade, o ex-paladino da ética, que está ali caladinho, humilhado”.
Moro está vivendo um evidente processo de fritura no governo. Seu indicado como diretor da Polícia Federal, Maurício Valeixo, está por um fio no cargo. Bolsonaro já busca um nome para substitui-lo, sem qualquer participação do outrora “superministro”, que também não foi ouvido sobre o novo PGR.
Vergonha Alheia
A permanência de Moro no governo “toda hora ouvindo galhofa do presidente da República”, só se explica pelo exacerbado “gosto por um carguinho”, avalia Humberto. “Até nóaté nós estamos com vergonha alheia”.
Da tribuna do Senado, nesta sexta-feira (6), Humberto aconselhou Sérgio Moro: “Tenha dignidade, peça demissão deste governo, que eles não querem você lá. Saia deste Governo enquanto é tempo, para não sair numa situação pior do que a que está vivendo agora”.
O senador ainda preveniu o ex-juiz: “Tenha juízo, porque se sair do Governo Bolsonaro para ser secretário lá em São Paulo do João Doria, pelo amor de Deus, não faça isso não, vá para casa, vá fazer um ano sabático, vá responder aos processos que você vai ter que enfrentar por tudo que fez de parcialidade”.