A COP26 confirmou o senso de urgência para que ações de enfrentamento às mudanças climáticas saiam do papel. Embora ainda não seja possível cravar os principais resultados das negociações, o evento confirma que vivemos um momento decisivo e inadiável diante de uma situação que precisa ser enfrentada imediatamente.
As palavras do Papa Francisco foram categóricas: “A COP26 deve contribuir ativamente para a construção consciente de um futuro onde as condutas cotidianas e os investimentos econômico-financeiros possam realmente salvaguardar as condições de uma vida digna da humanidade de hoje e de amanhã num planeta saudável”.
Um dos maiores desafios do evento foi garantir que as metas climáticas pactuadas consigam ser de fato alcançadas por cada Nação. Neste sentido, o destaque foi o comprometimento com o fim do desmatamento. Entre as soluções abordadas, estava a criação de ferramentas para rastrear e identificar produtos vindos de regiões com desmatamento.
Representantes de mais de cem países, entre eles China e Brasil, assinaram o acordo Forest Deal para proteger as florestas e zerar o desmatamento no mundo até 2030. O anúncio foi encabeçado pelos EUA numa clara tentativa de se manter na liderança da Agenda do Clima e mitigar reveses internos, como a não aprovação, no Senado norte-americano, do pacto trilionário para investimentos verdes.
Enquanto líderes mundiais se reuniam na COP26, milhares de jovens ocuparam as ruas de Glasgow no Global Day Of Action. Foi uma grande emoção estar presente nesta marcha por justiça climática e caminhar ao lado de trabalhadores, indígenas, lideranças do movimento negro, ambientalistas e ativistas de todo o mundo para exigir medidas urgentes de combate às mudanças do clima.
A presença de representantes indígenas brasileiros também merece destaque. A jovem Txai Suruí se tornou o centro das atenções ao discursar na abertura do evento, denunciando a perseguição do governo brasileiro aos povos originários e exigindo a participação ativa dos indígenas nas negociações. Além disso, rostos como o de Sônia Guajajara e de Célia Xakriaba compuseram o cenário, com cartazes distribuídos pelas ruas de Glasgow.
Aproveitamos para apresentar o trabalho da Comissão de Meio Ambiente do Senado Federal e lançar o Observatório Parlamentar sobre Mudanças Climáticas e Transição Justa. A iniciativa, em parceria com a CEPAL/ONU, conta com a participação de parlamentares da América Latina e Caribe. Unidos, vamos impulsionar um novo paradigma de desenvolvimento que vise uma transição com economias sustentáveis.
Assinamos documento nos comprometendo a intensificar nossa atuação nos debates ambientais. O envolvimento de diferentes países é fundamental para promover a implantação da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e o cumprimento do Acordo de Paris. Convidamos parlamentares de todo o mundo a somarem esforços a esta iniciativa e nos ajudar a fortalecer o cuidado com o Meio Ambiente, contribuindo com a redução da desigualdade e a criação de empregos e condições dignas.
A COP26, lamentavelmente, não foi capaz de melhorar a péssima imagem do Brasil diante do mundo. Uma situação agravada pela postura ecocida do ex-ministro do Meio Ambiente e por declarações irresponsáveis do presidente da República. A realidade é que passamos a ser vistos como um país que convive com crimes ambientais como recordes de desmatamento e de queimadas, e invasões de Terras Indígenas.
Após sucessivas cobranças e pressão nacional e internacional, o presidente pareceu ter dado um passo atrás, modulando seu discurso durante o encontro. Espero que ele tenha compreendido os reais riscos e impactos negativos que sua postura provoca não só na nossa imagem, mas também na nossa economia, especialmente no comércio exterior, que exporta as chamadas commodities agrícolas para o mundo.
A comunidade internacional ainda segue cautelosa em relação ao Brasil e só o tempo dirá se a mudança de discurso deste governo será convertida numa mudança real da sua política ambiental que, até o momento, é marcada pela destruição do patrimônio natural e pelo desmonte dos órgãos de fiscalização.
Por outro lado, Glasgow mostrou que, felizmente, muitas organizações e fundos de investimento estão interessados em aplicar recursos para enfrentar a crise climática e fortalecer uma política global de desenvolvimento sustentável. E isto acontece não apenas pela obrigação com a preservação do planeta, mas também pelo cuidado com a própria imagem. Aqueles que não abraçarem esta causa, certamente não sobreviverão neste novo momento.
Neste sentido, chamou atenção o debate sobre Mercados de Carbono. Precisamos pensar em um fundo global que cobre multa de empresas que emitirem acima do permitido e gere um bônus para as que ficarem abaixo do limite de emissão, pelo comprometimento com o planeta.
Para além dos resultados que virão a partir das negociações, a COP26 já deixa seu recado para o mundo: a defesa do Meio Ambiente é urgente e obrigatória para todos: governos, gestores públicos, parlamentares, iniciativa privada, imprensa e demais setores da sociedade.
Insisto no argumento de que, para além de disputas políticas ou ideológicas, cuidar do Meio Ambiente é uma questão de sobrevivência. Os líderes globais precisam entender que esta é uma pauta definitiva que deve estar na linha de frente de qualquer projeto de governo. O tempo de promessas ficou para trás. O Planeta pede socorro e precisamos agir rápido para garantir um futuro digno para as próximas gerações.
Artigo originalmente publicado na revista Carta Capital