A participação do presidente do Brasil na Cúpula de Líderes sobre o Clima demonstrou não somente um país isolado mundialmente na frente ambiental – como já era sabido – mas, principalmente, como vamos demorar a recuperar a credibilidade no enfrentamento da crise climática. E o pior, esse movimento geopolítico acontece no momento em que o país poderia consolidar ganhos reais de proteção aos biomas e de bem-estar à população.
As razões para tal descrédito são muitas. Senadores americanos enviaram carta pedindo a Joe Biden que não feche qualquer tipo de acordo com o Brasil sem que o país mostre avanços substanciais no fortalecimento de agências fiscalizadoras, como o IBAMA e o ICMbio – que tiveram seus orçamentos e equipes reduzidos, além da implosão dos espaços de participação social. Pediram também que estratégias contra as máfias da grilagem fossem apresentadas para evitar conflitos em terra indígena e assassinatos de lideranças ambientalistas.
Outra razão é que, mesmo depois de anunciar a todo o planeta que endossava a meta de desmatamento ilegal zero até 2030, o governo brasileiro cortou, no dia seguinte, R$ 240 milhões do Ministério de Meio Ambiente, resultando no menor orçamento da pasta dos últimos 21 anos. Essa instabilidade e discrepância entre fala e ação mina a posição do Brasil internacionalmente. Não só o acordo entre o Mercosul e a União Europeia está congelado, como há o risco de afetar indústrias inteiras, em especial o agronegócio – cada vez mais sensível ao desenvolvimento sustentável do setor. Isso atinge diretamente os trabalhadores, no campo e na cidade.
Durante sua fala, o presidente brasileiro também mendigou recursos para executar a proteção ambiental. Erra ao delegar o futuro da biodiversidade brasileira apenas aos investimentos estrangeiros e ignora os R$ 2,9 bilhões parados no Fundo Amazônia devido à conduta equivocada do seu governo. Outro exemplo de erro são os investimentos já liberados pelo Green Climate Fund (maior fundo verde do mundo, que apoia metas do Acordo de Paris), que estão parados no BNDES em vez de serem aplicados na agricultura familiar sustentável no Semiárido do Nordeste.
Ao término da Cúpula do Clima, EUA, Reino Unido e Noruega anunciaram um novo fundo verde para florestas tropicais em ameaça climática de mais de R$ 5,5 bilhões – valores que não chegaram ao Brasil, mesmo que sejamos donos da maior floresta tropical do planeta. O pior não é o dinheiro parado ou o discurso de pastel de vento na Cúpula. O pior é o impacto negativo ao Brasil e aos brasileiros. O recorde de desmatamento na Amazônia ou os 26% de área queimada do Pantanal só em 2020 impõem uma situação dura: a falta de credibilidade e o nosso atraso frente à crise climática.
A ministra de Energia dos EUA, por exemplo, anunciou investimentos em infraestrutura para que o país deles possa se integrar aos mercados verdes, que são estimados, só em energia limpa, em mais de US$ 23 trilhões no mundo. No Brasil, estudos apontam que apenas o setor de serviços de ecossistema, aqueles que geram renda a partir da biodiversidade, tem um potencial de R$ 7 trilhões, quase o PIB brasileiro inteiro. Mas o governo daqui vai na contramão e fomenta a destruição ambiental para que a boiada passe. Enquanto isso, pesquisas apontam que nos EUA os empregos verdes, relacionados com energia limpa e setores ambientais, pagam até 19% a mais que empregos comuns.
É hora de pararmos no Brasil com a ideia de que desenvolvimento só se faz destruindo árvores. O futuro chegou e nele o desenvolvimento vem com as florestas de pé. O que o Brasil precisa é de um projeto consistente para que as novas gerações vivam num país ecológico. A mudança precisa vir agora.
Artigo originalmente publicado no jornal O Globo