Humberto: nunca um governo, ainda que interino, apresentou um “pacote de misérias tão absurdas” à população em tão pouco tempoCorte de mulheres e negros nos ministérios, ameaça de extinção da Previdência Social, extinção do Ministério da Cultura, riscos aos direitos dos índios e dos quilombolas, proposta de cobrança de mensalidades em universidades públicas, desmonte de órgãos de controle, como a Controladoria Geral da União (CGU). É extensa a lista de horrores perpetrada a cada dia pelo governo provisório do usurpador Michel Temer e não há como conciliar com o desmonte já em curso, em menos de uma semana de governo, afirma o líder do Governo Dilma no Senado, Humberto Costa (PT-PE).
“Vejo alguns senadores nos pedirem calma porque é um governo que está apenas começando – e vai acabar logo, eu tenho certeza. Mas que condescendência se pode ter com essa junta provisória, cujos primeiros atos se assemelham a um roteiro de filme de terror?”, questionou Humberto em pronunciamento ao plenário, nesta terça-feira (17).
O senador avisou que não haverá conciliação com uma condução política que já deixou claro que não respeita as políticas públicas que retiraram o Brasil do atraso secular e da miséria desumana. “Não haverá transigência com o desmonte do Estado que está sendo perpetrado por esse governo golpista nefasto”, assegurou.
Fim do SUS
Nesta terça-feira, os jornais trazem declarações do ministro interino da Saúde, Ricardo Barros — o mesmo que, quando relator do Orçamento-Geral da União, em 2015, pretendeu cortar 40% dos recursos do Bolsa Família — alegando a necessidade de suprimir direitos constitucionais e de “reduzir o tamanho” do Sistema único de Saúde.
“Olhem bem: o ministro da Saúde de Temer diz que direitos como o acesso e a cobertura universais à saúde serão retirados. O ministro da Saúde desse governo golpista vem anunciar o fim do SUS”, protestou Humberto.
Para Barros, “quanto mais gente puder ter planos de saúde, melhor”. O ministro interino só esqueceu de explicar à população que seu maior doador de campanha é justamente uma grande empresa do ramo dos planos de saúde. “Essa é a lógica do governo ilegítimo que chegou sem voto ao Palácio do Planalto: o cidadão paga imposto não é para melhorar o sistema público, é para depender de um plano privado”, apontou o senador.
Para completar o escárnio, o interino Barros critica o “excesso de direitos” contido na Constituição e sugere uma “repactuação” similar à realizada na Grécia, onde houve um corte radical nas aposentadorias. Mais grave que um ministro da Saúde defender o fim do SUS, como destacou Humberto, é afirmar que essa questão deve ser tratada não por sua Pasta, mas pela área econômica. “É um escândalo entregar as políticas sociais nas mãos dos tecnocratas”, declarou o senador, que foi ministro da Saúde no primeiro mandato do presidente Lula.
Golpe contra Bolsa Família e Minha Casa, Minha Vida
Outro descalabro já aventado pela “junta provisória” de Temer é o corte de até 30% no número de beneficiários do programa Bolsa Família. A alegação é de que o programa estaria “inchado”. O real motivo, explicitado no programa Ponte para o Futuro – “essa obra literária do golpismo só comparada em estilo aos poemas do seu autor”, como descreveu Humberto – afirma que o Brasil gasta muito com políticas públicas. “É essa a visão de junta provisória: o povo custa muito”, ironizou o senador.
Outra vítima da junta provisória é o Minha Casa Minha Vida. Nesta terça-feira, duas portarias do Ministério das Cidades revogaram R$ 300 milhões destinados pela presidenta Dilma Rousseff ao financiamento direto de moradias para famílias de baixa renda organizadas em cooperativas habitacionais ou associações sem fins lucrativos.
Os atos do ministro interino Bruno Araújo, do PSDB, revogam a construção de mais de 35,6 mil unidades habitacionais em 104 municípios de 20 Estados brasileiros. Desse total, 836 delas seriam erguidas em Pernambuco. “É esse um dos primeiros atos com o qual o ministro das Cidades pernambucano presenteia a população do seu estado”, apontou Humberto.
Pacote de misérias – e trapalhadas
Para o senador petista, nunca um governo, ainda que interino, apresentou um “pacote de misérias tão absurdas” à população em tão pouco tempo.
“É maldade atrás de maldade, que a gente toma conhecimento de manhã e que, logo à tarde, os próprios autores ou o chefe correm para tentar desmentir e desfazer o mal-estar. A gente até acha que é uma versão renovada d’Os Trapalhões que anda sendo gravada, tão grande é o bate-cabeça dentro da junta provisória”, criticou o senador.
Ridículo internacional
O líder petista lamentou que o Brasil, que conquistou tanto respeito no mundo a partir dos governos Lula e Dilma, seja hoje motivo de ridículo global. Ele citou a reportagem do jornal americano New York Times, publicada nesta terça-feira, que chama o Congresso Nacional de “circo” e aponta a presença, entre os parlamentares, de “suspeitos de homicídio, de narcotráfico e de pedofilia”. O Jornal também questiona as condições morais desse Legislativo para remover Dilma Rousseff da Presidência da República.
Humberto também citou a relatora especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para os direitos indígenas, Victoria Tauli Corpuz, das Filipinas, que criticou a extinção da Secretaria de Direitos Humanos e do Ministério da Cultura. A dirigente da ONU também alertou para o risco de violências, violações de direitos, inclusive com efeitos etnocidas, de uma política que privilegia os interesses das elites em detrimento da proteção a grupos vulneráveis.
Outro constrangimento internacional vivido hoje pelo Brasil, em consequência do golpe, foi a corajosa manifestação da equipe e elenco do filme Aquarius, em pleno tapete vermelho do Palácio do Cinema de Cannes, durante o tradicional e prestigiado festival realizado naquela cidade do Sul da França. Liderados pelo cineasta pernambucano Kleber Mendonça Filho, diretor da película, e pela atriz Sonia Braga, o grupo denunciou o golpe contra a democracia brasileira, com repercussão na imprensa de todo o mundo.
“Não haverá acordo ou condescendência com esse governo interino, autor de um roteiro das páginas mais tristes que este país já viveu na sua história recente”, garantiu Humberto Costa. “Vamos bradar, seja neste Congresso Nacional, seja nas ruas, contra as atrocidades e aberrações que esses golpistas cometeram antes e que, tomado o poder de assalto, insistem em cometer contra o Estado democrático de Direito e contra a população brasileira”.
Cyntia Campos