Fausto Salvadori / Ponte Jornalismo, para CUT Nacional
Em nome do “resguardo da ordem social, hoje tão vulnerada por desvios da espécie”, a juíza Marcela Filus Coelho decidiu nesta sábado (29/4) manter a prisão de três militantes do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto) detidos em Itaquera, na zona leste de São Paulo, durante a greve geral de sexta-feira (28): o pedreiro Luciano Antonio Firmino, 41, o frentista Juraci Alves dos Santos, 57 anos, e o motorista Ricardo Rodrigues dos Santos, 35.
Em sua decisão, a juíza converteu a prisão em flagrante de Luciano, Juraci e Ricardo por incitação ao crime, incêndio e explosão em prisão preventiva, baseando-se principalmente na palavra dos PMs.
Para a magistrada, “a materialidade dos fatos e os indícios de autoria se encontram indelevelmente demonstrados pelas provas coligidas em solo policial, em especial pelo relato dos policiais militares que descreveram que abordaram os indiciados após vê-los praticar os delitos”. E justifica: “trata-se de crime grave, que além de poder causar danos físicos a terceiros, prejudica a livre manifestação daqueles que não são criminosos, além de tumultuar a cidade”.
À Ponte, o advogado Alexandre Pacheco, do MTST, disse que vai entrar com um pedido de habeas-corpus no Tribunal de Justiça de São Paulo para os três militantes presos.
No dia da prisão, o delegado Marcos Luiz Gomes, plantonista do 65º DP (Artur Alvim), havia anunciado que autuaria os ativistas por associação criminosa, crime punido com até três anos de reclusão, mas recuou. No final do dia, mudou o enquadramento para incitação ao crime, que prevê pena máxima de até seis meses de detenção.
Além da incitação ao crime, porém, o delegado enquadrou os militantes em delitos mais graves. Luciano, acusado de tentar botar fogo em pneus para obstruir a avenida José Pinheiro Borges, foi autuado por incêndio, enquanto Juraci e Ricardo, suspeitos de dispararem rojões contra os policiais militares, respondem por explosão – os dois crimes são punidos com penas de três a seis anos de reclusão.
As prisões aconteceram por volta das 6h40 de sexta, quando policiais militares pertencentes ao 4º Baep (Batalhão de Ações Especiais de Polícia, grupo criado em 2014 para, entre outras atribuições, fazer “ações de controle de distúrbios civis e de antiterrorimo”) reprimiram com bombas um grupo de manifestantes que havia fechado a Avenida José Pinheiro Borges, perto da Radial Leste.
Os policiais afirmam que, durante a dispersão, detiveram Luciano com um galão de quatro litros de gasolina, que seria usado para incendiar pneus na pista, dois isqueiros e um saco com 137 pregos retorcidos, chamados de “miguelitos”, utilizado para furar pneus. Segundos a versão dos PMs, Luciano teria admitido que pretendia incendiar os pneus.
Depois que os manifestantes se reagruparam e foram novamente dispersados pelas bombas da PM, os policiais prenderam Juraci e Ricardo, acusando-os de terem disparado rojões contra eles. Ambos negaram as acusações e, na delegacia, se submeteram a exames residuográficos para detectar traços de pólvora nas mãos, que ainda estão sendo analisados.
Os policiais não apresentaram provas materiais nem testemunhas que comprovassem o suposto disparo de rojões. As testemunhas ouvidas no distrito policial, como o padre Paulo Sérgio Bezerra, pároco da Igreja Nossa Senhora do Carmo e um dos participantes do protesto, negaram ter visto rojões com os grevistas. “Todas as bombas que estouraram vieram da polícia”, disse o padre à Ponte.
O mesmo padre relatou que teve sua casa invadida pelos policiais do Baep, que entraram sem permissão em seu quintal para revistar o carro de Luciano que estava estacionado ali (clique aqui e veja o vídeo). A suposta invasão não consta do boletim de ocorrência elaborada pelo delegado Gomes. E, embora tenha recebido um pen drive com imagens da PM jogando bombas sobre os manifestantes, o delegado restringiu a acusação de explosão a Juraci e Ricardo.
Outro lado
A Ponte enviou a seguinte pergunta para as assessorias de imprensa da Secretaria da Segurança Pública e da Polícia Militar:
Durante a operação policial na sexta-feira (28), PMs do Baep entraram sem autorização na casa do padre Paulo Sérgio Bezerra, como mostra o vídeo https://youtu.be/2_HYMr4Ifqg. Qual o embasamento legal para esta ação? Os policiais serão investigados por ela?
Até o momento, não houve resposta.
Frentes pedem liberdade imediata para os presos políticos da greve
A Frente Brasil Popular e a Frente Povo Sem Medo divulgaram nota pública cobrando a imediata libertação dos cidadãos presos por atuarem na greve geral do último dia 28. Veja a íntegra:
Nota pública – Libertem os presos políticos da Greve Geral já!
Três militantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto estão presos por participarem das atividades da greve geral no último dia 28 de abril. Exigimos a liberdade imediata dos militantes.
A prisão dos militantes, assim como a forte repressão dos movimentos sociais, dezenas de prisões e sérias agressões como a do jovem de Goiás, Mateus que está em coma com traumatismo craniano e outras agressões de milhares que foram às ruas na greve geral, é uma clara evidência do Brasil pós – golpe que busca a todo momento criminalizar os movimentos sociais. Lutar não é crime.
Por acreditar que a luta é o único caminho para reverter os retrocessos que o país está vivendo é que, nos quatro cantos do país, 40 milhões de pessoas participaram de paralisações e atos pacíficos para dizer não reforma trabalhista e da previdência.
Continuaremos na luta até que todos os presos políticos sejam soltos. Permaneceremos na luta em defesa dos nossos direitos.
Frente Brasil Popular
Frente Povo Sem Medo