O pesadelo em que se transformou o festival de queda de sinais das operadoras de telefonia móvel não é de difícil solução. Ao contrário do que se imagina, o melhor funcionamento do sistema depende mais do cumprimento da legislação do que dos fantásticos investimentos nos quais as concessionárias se prendem para postergar a solução do problema.
Os bilhões de reais em investimentos que estão sendo anunciados pelas operadoras para os próximos anos, embora parte do problema, são necessários para sustentar a ampliação do sistema e sua atualização tecnológica. Definitivamente, porém, deles não depende o fim da queda sistemática das ligações para e entre celulares, que de tão republicanas já não escolhem mais as suas vítimas.
Segundo relato do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, nem a presidenta Dilma Rousseff ou o ex-presidente Lula têm sido poupados pelo descaso das operadoras. Bernardo presenciou uma conversa telefônica entre a presidenta e seu antecessor ser interrompida algumas vezes por queda de sinal. A presidenta disse a Lula que o ministro estava assistindo a conversa e que iria cobrar dele a solução para o problema.
Seria cômico, se não fosse trágico. Até porque a solução começa pelo cumprimento da Lei Geral das Comunicações, fato que não vem sendo observado pelas operadoras. Mas a culpa não é só das operadoras. Cabe também cobrar da Agência Nacional de Telecomunicações o cumprimento das suas obrigações de regulamentar e fiscalizar o sistema. A exigência do compartilhamento das redes pelas concessionárias, por exemplo, já daria um grande passo para garantir acesso e qualidade nas ligações telefônicas.
Também urge a necessidade de alterações na plataforma com uso de tecnologia que permita a compatibilidade de frequências, ampliando o raio de cobertura e, consequentemente, a qualidade do serviço. Dessa forma, com o mesmo aparelho o cidadão poderá ter acesso, por exemplo, às frequências de 2,5 giga-hertz (GHz) e à faixa de 450 Mhz, esta destinada a áreas rurais.
Além do compartilhamento de redes, previsto na legislação, outro caminho para o bom funcionamento da telefonia móvel no país seria eliminar o uso dos dois dígitos das operadoras. Além de mais eficiência, a medida traria maior competitividade entre as operadoras, o que consequentemente ocasionaria maiores descontos e vantagens para o usuário, que decidiria previamente qual operadora melhor lhe atende.
A medida não implica em grandes soluções tecnológicas ou custosas. Aliás, o uso dos dois dígitos já foi eliminado na maior parte dos países, reduzindo os custos dos serviços. Nesse aspecto, também seria importante uma fiscalização do Cade junto às operadoras para verificar se elas não estariam ferindo leis de mercado com comportamentos prejudiciais à concorrência, impedindo o compartilhamento da rede, a universalização dos serviços e a prática de preços justos.
É sabido que os preços da telefonia praticados no Brasil são superiores aos que as operadoras praticam em seus países. E não cabe mais culpar a carga tributária porque o setor tem sido amplamente beneficiado com incentivos fiscais, mas nem por isso se observam reduções tarifárias. Um bom exemplo é o do serviço pré-pago, cujas tarifas são inexplicavelmente mais elevadas dos que as dos planos pós-pagos.
A Anatel precisa também exigir mais empenho por parte das operadoras no tocante ao cumprimento das metas dentro dos critérios de qualidade estabelecidos na legislação e nos contratos de concessão. Não se pode admitir que essas operadoras não pratiquem no Brasil a mesma qualidade de serviço que oferecem nos seus países de origem.
(Folha de S.Paulo, 19/08/2012)