A comissão de senadores oposicionistas que esteve na semana passada na Venezuela agiu com “falta de cuidado e de equilíbrio” e contribuiu apenas para acirrar os ânimos em um país já conflagrado, avalia o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que em pronunciamento ao plenário nesta segunda-feira (22) fez duras críticas à postura assumida pelos oito parlamentares que integraram a comissão externa escalada para a vista ao país vizinho, na última quinta-feira (18). “Optaram pelo factoide”, afirmou.
Além da postura completamente oposta ao que se exige de uma missão diplomática — que é não tomar partido e não se imiscuir em assuntos internos de outras nações — os senadores liderados por Aécio Neves (PSDB-MG) trataram desde o início como oportunidade de fazer política partidária interna a missão oficial aprovada pela Comissão de Relações Exteriores da Casa e executada mediante utilização de recursos públicos. Como apontou Lindbergh, o uso de inverdades permeou todo o processo. “Primeiro, disseram que o governo brasileiro tinha negado o jato da FAB para levá-los. Segundo, disseram que o governo da Venezuela havia negado autorização para o pouso, quando essa ainda estava em processo de solicitação”, começou a enumerar o senador petista.
Além disso, os senadores da oposição construíram a versão de que teriam sido “abandonados” pelo embaixador brasileiro na Venezuela, Ruy Pereira, que os recebeu no aeroporto e que já havia comunicado previamente á comissão que não poderia acompanhá-la. “E sabem porque não podia? Porque isso feriria todas as regras diplomáticas”, apontou Lindbergh, já que Aécio Neves e seus sete colegas levariam na van providenciada pelo governo brasileiro as principais lideranças do setor mais radicalizado da oposição venezuelana, ligados a Leopoldo López, preso acusado de promover distúrbios violentos que resultaram em mortes e a quem os brasileiros pretendiam visitar.
“O embaixador simplesmente não poderia ir, mas todos os senadores já sabiam disso. Houve, inclusive, um diálogo com o senador Aécio” [sobre essa impossibilidade], destacou Lindbergh.
Até a oposição venezuelana elogia postura do governo brasileiro
A quarta inverdade apontada pelo petista na versão apresentada pelo grupo de oposicionistas é sobre a posição do governo brasileiro sobre a Venezuela. “A posição do governo brasileiro é pela legalidade democrática, pela realização de eleições. Tudo o que o governo brasileiro não quer é que a situação da Venezuela descambe para uma guerra civil. Isso é ruim pra Venezuela, é ruim pra América Latina e é ruim pro Brasil”. O papel mediador desempenhado pelo Brasil na crise venezuelana é reconhecido e elogiado até mesmo por Henrique Capriles , candidato oposicionista derrotado por pequena margem de votos, na última disputa presidencial naquele país.
O senador petista leu em plenário trechos da entrevista de Capriles ao jornal Folha de S Paulo, publicada no último domingo (21). “Após os protestos de 2014, todos os chanceleres da Unasul vieram a Caracas. Ao fim da reunião, o então Chanceler Luiz Alberto Figueiredo disse que havia sido instruído pela Presidenta Dilma a conversar a sós comigo. Apresentei a situação para que ela não tenha só a visão do governo. Na última reunião de chanceleres e oposição em março, o governo venezuelano vetou minha participação, disseram: ‘Capriles não vai’. Sabe quem me pôs lá? O Brasil”, afirmou o oposicionista à Folha.
Lindbergh destacou ainda a condenação de Capriles à opção de Aécio e sua comissão de dialogar apenas com os setores mais radicalizados da oposição venezuelana, que vem promovendo a violência e contribuindo para que os mortos de ambos os lados, nos protestos, já chegue a 43.
Senadores da oposição optaram pelos radicais
Ao final da última disputa presidencial na Venezuela, com Capriles derrotado pelo chavista NIcolás Maduro por apertada margem, foi convocada uma manifestação de protesto, questionando o resultado das urnas. Como consequência dos distúrbios, oito militantes chavistas foram mortos o que levou Capriles a se afastar de Leopoldo Lopez. Este organizou um grupo chamado La Salida, que trabalha não para derrotar o chavismo nas urnas, mas por meio da violência. Desde fevereiro, a convocação das chamadas guarimbas [barricadas] tem resultado em confrontos cada vez mais violentos. Dos 43 venezuelanos mortos nessas manifestações — oposicionistas, chavistas e cidadãos sem filiação partidária — sete eram membros da Guarda Bolivariana Nacional, que é o equivalente á polícia militar naquele país. Três deles foram executados com tiro na cabeça.
“O clima está terrível na Venezuela, clima quase de guerra civil”, lamentou Lindbergh, que defende a posição do governo brasileiro de buscar a conciliação, defender a legalidade democrática, apoiar a realização de eleições e o diálogo. “Quem errou foi a comissão”, diz o petista, referindo-se ao grupo liderado por Aécio. “Eles podiam ir lá como líderes partidários fazer o discurso que quisessem, mas, no momento em que virou uma comissão oficial do Senado Federal, representando o Brasil, a postura tem que ser de equilíbrio. Tem que agir como um bombeiro, não como incendiário”.
Contribuir com o diálogo
Nesta quarta-feira, nova comissão do Senado vai visitar a Venezuela, conforme requerimento aprovado na semana passada. Lindbergh, um dos autores da proposta, pretende que integrantes da oposição participem desse grupo, que precisa ser suprapartidário — ao contrário da missão liderada por Aécio, que reuniu exclusivamente oposicionistas. “Vamos conversar com todo mundo. Não apenas com um setor da oposição”, avisou o senador petista. O objetivo maior, aponta ele, é apoiar uma saída dentro da legalidade democrática. “Não vamos aceitar alguns que tentam dar golpes”.
Guantánamo
Em seu pronunciamento Lindbergh também anunciou que apresentará requerimento à Casa para que seja discutida a situação dos presos na base militar americana de Guantánamo. “Vejo tantos recém-convertidos à defesa dos direitos humanos, tanta gente que apoiou a ditadura militar. Seria importante que os recém-convertidos em democratas e defensores dos direitos humanos também se posicionassem sobre um ponto importante como esse”, afirmou o petista. A maioria dos presos de Guantánamo sequer respondem a processo.
Cyntia Campos