Senador critica decisão do STF que obriga órgãos públicos a cortar o ponto de servidores em greve (Foto: Alessandro Dantas)Cyntia Campos/ PT no Senado
Consagrado na Constituição de 88 — e, desde então, aguardando uma regulamentação que o Congresso Nacional jamais conseguiu encontrar consenso para deliberar —, o direito de greve do funcionalismo público sofreu um duro revés na última sexta-feira (28), ironicamente a data na qual a categoria comemora seu dia. O Supremo Tribunal Federal decidiu, por maioria, que os gestores de órgãos públicos passam a ter a obrigação de cortar o ponto de servidores em greve.
Não será mais necessário que a greve seja considerada ilegal, como vinha acontecendo nesses 28 anos de vigência da Constituição e ausência de legislação infraconstitucional que regulamentasse a matéria. “É um escândalo!”, resume o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), lembrando que o Judiciário sempre usou a prerrogativa de colocar na ilegalidade paralisações eventualmente abusivas e que prejudicassem o interesse público. “Mas agora, a partir do primeiro dia de greve, tornou-se obrigatório o corte de salários”.
Para o senador, ao analisar uma ação direta de inconstitucionalidade sobre a questão, o STF simplesmente resolveu açambarcar uma prerrogativa do Congresso e decidiu legislar. “Essa proposta não passaria no Legislativo”, avalia. Ele acredita que essa manifestação da Corte Suprema expressa um movimento cada vez mais forte e cada vez mais perigoso para a democracia: “Tenho alertado para essa escalada – estamos caminhando em direção ao Estado de exceção –, um agigantamento do Poder Judiciário”, afirmou Lindbergh em pronunciamento ao plenário, nesta segunda-feira (31).
Essa escalada, recapitulou o senador, também se expressa na hipertrofia de poderes de juízes de primeira instância e em outras decisões do Judiciário que equivalem não à aplicação das leis, mas na criação de toda uma legislação, usurpando a função do Congresso. Ele citou a prisão, no último dia 21, de policiais do Senado Federal. “O próprio ministro Teori [Zavascki, do STF] reconheceu que foi excessiva, porque um juiz de primeira instância não podia mandar prender aqueles policiais sem autorização do Supremo Tribunal Federal”.
Mas mesmo o Supremo tem avançado o sinal, acredita o senador, como no caso da decisão sobre a desaposentação — o direito de o trabalhador aposentado voltar a trabalhar e voltar a contribuir para o INSS e essa contribuição valer para o recálculo dos valores de uma aposentadoria futura. Essa possibilidade foi vetada pelo STF. E tão preocupante quanto o tiro disparado pela Corte Suprema contra o direito de greve no serviço público é a perspectiva da decisão, marcada para o próximo dia 9, a respeito da terceirização do trabalho em todos os níveis de atividade.
A proposta — uma das heranças mais notórias deixadas por Eduardo Cunha, que desengavetou o projeto após 10 anos de ostracismo—foi aprovada na Câmara e, graças a uma grande mobilização, foi travada no Senado. O risco, alerta Lindbergh, é o STF atropelar o legislativo, que ainda não decidiu sobre a matéria, e considerar a terceirização legal.
“Estamos caminhando para uma ditadura do Judiciário, que está fazendo o papel de condutor da retirada de direitos. Todo mundo sabe que a reforma trabalhista tem muita dificuldade de ser aprovada aqui no Congresso. Escolheram outro caminho, é um escândalo!”. Lindbergh cobrou atenção do Senado, como instituição, para impedir qualquer tipo de atropelo às suas prerrogativas. “Não podemos ver isso com naturalidade”.
A senadora Fátima Bezerra (PT-RN) também criticou a decisão do STF, que “fere de morte um direito constitucional”. Para ela, a “decisão infeliz” é mais uma tentativa, agora pela via judicial, de desarticular e reprimir a mobilização dos servidores. “O Brasil inteiro está acompanhando a onda de ataques aos direitos dos trabalhadores promovida pelo governo ilegítimo de Temer”.
Fátima ressalta a “coincidência” de uma decisão do STF com esse teor ocorrer no exato momento em que amplas parcelas dos trabalhadores, especialmente dos servidores, estão em luta para barrar essa agenda de retirada de direitos.
O presidente nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, contesta a tomada de decisões feitas sem uma consulta à sociedade, como é da natureza das decisões do Judiciário, ao contrário do Congresso — que, além de tudo, é quem tem a prerrogativa de legislar e é naturalmente permeável à pressão da opinião pública. “Onde não há debate, onde não há diálogo, as decisões são unilaterais e as chances de conflitos aumentam”.
Para ele, a judicialização da política e das relações de trabalho leva a um sistema totalitário, “que passa por cima do diálogo e das negociações entre os outros poderes”.