Lindbergh lançará livro sobre o pacto federativo

A discussão sobre a nova distribuição dos royalties do petróleo para todos os estados brasileiros inspirou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) a escrever um livro a respeito do tema que nos últimos três meses ficou em evidência no Senado Federal. Mas como o debate também se estendeu para a necessidade de estudar melhor a concentração das receitas em poder da União, os escritos ganharam vulto e vão abordar o pacto federativo, a influência ainda existente no Brasil das oligarquias, a desproporcional representatividade dos estados no Congresso Nacional e a relação clientelística que pode ser notada em estados dependentes das transferências constitucionais, onde a população só tem como alternativa de emprego a máquina pública.

Em entrevista para o site da Liderança do PT no Senado, Lindbergh explicou que o livro ainda não recebeu um “título” e sua expectativa, inicialmente, é promover o lançamento no Rio de Janeiro no final deste mês e depois em outros estados.

Royalties do petróleo
“No começo do debate, nós estávamos restritos aos royalties do petróleo. Nós percebemos que não dava para discutir isso sem discutir o Fundo de Participação dos Estados (FPE), sem discutir a dívida dos estados e sem discutir a federação. Um crescimento expressivo da arrecadação nas mãos da União enquanto notamos, por um lado, uma situação de dificuldade enfrentada pelos estados e municípios brasileiros e, por outro lado, na questão da federação não só quanto à concentração da arrecadação, mas também um desequilíbrio horizontal. Quando caímos na discussão da arrecadação per capita, sobre tudo o que é arrecadado e sobre tudo o que é distribuído, pessoa a pessoa, percebemos que tinham distorções.

Representatividade
Qual é o estado que tem a maior arrecadação per capita do País? Poderíamos dizer, de imediato, que é São Paulo. Mas não é. É Roraima. Roraima tem R$ 5.500,00 per capita e isso se repete nos estados de Rondônia, Tocantins e Amapá. Desenvolvi uma tese no livro e a tese se fundamenta na existência de uma distorção na representatividade política na Câmara dos Deputados. À essa distorção se acrescenta o peso do Senado Federal. Claro que o Senado Federal é a casa da federação e todos os estados têm três representantes.

Mas, somado a esse peso político maior do Senado e com essa distorção na representatividade política da Câmara dos Deputados me convenci que um determinado bloco político ligado às oligarquias regionais capturou o Poder Legislativo. Isso explica se formos analisar as presidências do Senado e do Congresso Nacional e as pessoas no comando: Antonio Carlos Magalhães (BA), Jader Barbalho (PA), Renan Calheiros (AL) e José Sarney (AP). O que eu tento mostrar é que essa não é só uma distorção na representatividade política. Essa distorção na representatividade política acabou gerando também uma distorção na distribuição de recursos pelos entes federados, pelos estados, privilegiando, inclusive, a alimentação dessas oligarquias que têm peso em determinadas regiões.

Dependência
Tive o maior cuidado na construção do livro, mas eu digo, por exemplo, que o estado de Roraima a renda per capita é R$ 5.500,00 e 75% dos recursos arrecadados são transferências da União, que foram arrecadados em outros estados e foram para lá. É uma economia pouco autônoma, ou seja, esses recursos não vão acabar com as desigualdades regionais ou melhorar a distribuição de renda. Chegam na estrutura do estado e então o emprego gira todo em torno dessa máquina pública estadual. Eu acho que há um problema claro e vou mostrar com dados no livro dessa distorção na federação, tanto a concentração de recursos nas mãos da União quanto nessa distorção horizontal favorecendo oligarquias regionais.

Distorções
Esse é um processo que nem a Constituição Federal conseguiu enfrentar e desarmar. Eu faço essa constatação e o livro aponta um caminho sim, que é a discussão do pacto federativo a ser conduzido pela União, pela presidenta Dilma Rousseff, sob o risco de a gente jogar a decisão no Supremo Tribunal Federal (STF). A federação tem que ter mais equilíbrio. Eu trago alguns dados que tenho repetido no Senado Federal. A União arrecadou do Rio de Janeiro R$ 115 bilhões em 2009 e as transferências, incluindo royalties, para o meu estado somaram R$ 14 bilhões. Na discussão dos royalties o que está havendo é uma ofensiva por parte da situação financeira difícil enfrentada pelo conjunto dos estados da federação ao invés de tentar discutir a relação com a União quanto a essa concentração de recursos.

Ofensiva
Há uma ofensiva, no caso localizado dos royalties, em cima do Rio de Janeiro e do Espírito Santo. Note: dos 115 bilhões arrecadados pelo Rio de Janeiro, R$ 14 bilhões voltam para o estado. Estão querendo nos retirar esse R$ 14 bilhões e aqui o jogo da representatividade do Congresso Nacional não pode passar por cima de coisas muito concretas sob o tamanho das populações. Essa é a grande distorção que tem na distribuição dos recursos do País. A região sudeste representa 40% da população brasileira e sua representação política aqui no Congresso é muito pequena.

Novos estados
Podemos incluir nesse debate a criação de dois estados, Tapajós e Carajás, no Pará. É outro problema a ser criado. Eu vi um deputado defendendo a divisão com a alegação que vai ser melhor para eles. O Pará vai ter nove senadores com a divisão. No mínimo oito deputados por estados e vão ganhar mais recursos, porque o Fundo de Participação dos Estados vai ter mais recursos. Acontece que há uma distorção muito grande e estamos chegando a um ponto de criar uma fratura na federação. Se não houver uma mediação – e quem tem que fazer essa mediação é a União – você têm estados se sentindo penalizados. Eu acho que esse debate, sendo franco, não é puxar só para o Rio. Acho que o debate da lógica per capita tem que prevalecer. Se você ver bem quais estados são os mais prejudicados, são os do Nordeste. São os grandes estados em especial o Ceará, Bahia e Pernambuco, porque esses estados têm grandes populações. E a forma de distribuição de recursos, hoje, foi construída de forma equivocada que não privilegia essas grandes populações, mas estados menores com populações menores cujo vínculo é mais forte com as oligarquias que saem de lá.

Oligarquias                                  
Imagine só: se 75% dos recursos são transferências constitucionais para Roraima, a economia é muito fraca do ponto de vista de sua autonomia. Então há uma dependência de trabalhar no estado. Nesse raciocínio, lembro Vitor Nunes Leal que é o autor do livro “Coronelismo, Enxada e Voto”, não dizendo que há um coroneslimo, mas que a relação da clientela existe. Em alguns lugares de forma mais clara ainda porque há essa dependência dos serviços públicos, do emprego estatal. E essa clientela é abastecida por uma distribuição fiscal equivocada. Volto a dizer, de uma oligarquia que capturou o Poder Legislativo. Fernando Henrique teve que negociar com ela. Lula teve que negociar com ela. Dilma teve que negociar e o próximo presidente terá que negociar com essa turma que não representa o povo da região mais pobre na sua essência, mas tem essa relação. E é isso que está armado aqui no Congresso Nacional. Então esse debate dos royalties está abrindo uma discussão que é muito mais profunda.

Marcello Antunes

Ouça o senador Lindbergh Farias (PT-RJ)

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