O ex-presidente Lula considera urgente debater um projeto nacional para solucionar os problemas reais da população, como a volta da fome e do desemprego, resultados do desgoverno Bolsonaro. Para Lula, a elite precisa parar de ignorar o verdadeiro Brasil, que não está na Faria Lima. “A gente fica vendo na televisão, ‘a Bolsa cresce, o XP não sei das quantas, bancos de investimento, fundo de pensão’”. Eu quero saber qual é a economia que vai resultar em emprego para o povo, em salário, em garantia para o povo viver dignamente”, afirmou o ex-presidente, em entrevista (ouça aqui) à Rádio Sagres, de Goiás, na manhã desta sexta-feira (17).
Para o ex-presidente, o governo está completamente sem rumo e a consequência direta é um desastre econômico sem precedentes. “Estamos vendo o preço da comida totalmente descontrolado, a inflação voltar a dois dígitos, o gás de cozinha fugir do controle do poder de compra do povo”, apontou Lula.
“O litro da gasolina subiu 39%, o etanol, 62%, o diesel, 35%, o gás, 31%, a energia, 21%. A carne vem subindo de forma extraordinária. Você pega os dados do Dieese, o óleo de soja subiu 68%, o arroz, 32%, patinho e músculo, 36%, feijão, 17%, o ovo, 15%… Ou seja, o governo perdeu o controle da inflação. E a inflação, quando volta da forma que está voltando, prejudica a parcela mais pobre da população”, lamentou o ex-presidente.
A solução, com tem repetido o petista, passa por um modelo de economia que seja socialmente mais justo e que dê oportunidades à população mais vulnerável. “Quando o pobre recebe R$ 20, R$ 30, ele não vai comprar dólar, ele não vai aplicar na Bolsa. Vai aplicar na barriga, ele vai comprar uma caixa de lápis, um chinelo, um vestido para a filha, uma camiseta… Quando você faz com que o dinheiro circule na mão do povo, a economia cresce”, defendeu.
“Não precisa ser mágico para entender que é preciso desconcentrar a economia para fazer com que o dinheiro chegue na mão do povo, para que possa comprar comida, comprar coisas que dão o direito de viver dignamente”, observou Lula.
Frente ampla
O ex-presidente opinou sobre o debate em torno de uma frente ampla contra Bolsonaro. Para ele, formar uma coalisão apenas para se livrar de Bolsonaro não resolve o problema. “Se for possível construir um programa que leve em conta a necessidade de acabar com a fome, o desemprego – e quem está falando é uma pessoa que tem experiência sobre como acabar com o desemprego: tive o prazer de governar esse país no momento em que criamos 20 milhões de empregos com carteira assinada, quando o país atingiu a posição de sexta economia do mundo”, explicou.
“Se houver um programa”, continuou, “que coloque o pobre no orçamento da União, do estado e do município, e o rico no imposto de renda, que faça com que o povo possa comprar feijão, carne, arroz, o gás, é possível construir uma frente ampla. Agora se a frente ampla for só para tirar o Bolsonaro e manter o Guedes, para quê frente ampla? Para manter tudo como está? Manter o povo esquecido, passando fome? Como se explica o Brasil ser o terceiro produtor de alimentos no mundo, primeiro produtor de proteína animal, e ter gente passando fome?”, indagou.
“Frente ampla tem que ser para desmontar um programa de destruição da política econômica brasileira e colocar um programa para reconstruir o país. É o que está em jogo e é o que nós nos propomos a fazer. O PT já tem um programa de reconstrução para fazer o Brasil voltar a crescer, gerar empregos e distribuir renda”, insistiu Lula.
Impeachment
“Precisamos exigir que o Bolsonaro seja interditado, ou por uma decisão da Justiça eleitoral, em função do que houve na campanha de 2018, ou pela quantidade de crimes que ele já cometeu nesse país”, ressaltou o ex-presidente. “Inclusive, o apelido de ‘genocida’ é pela quantidade de pessoas que morreram, e que o governo tem responsabilidade. Se o governo não fosse irresponsável, teria evitado quase metade das mortes das quase 600 mil pessoas”.
“O que a oposição tem que fazer? Ir pra rua denunciar, exigir que o presidente da Câmara coloque um dos quase 150 pedidos de impeachment. Não acredito que ele vá colocar em votação, porque a Câmara tem um orçamento de R$ 20 bilhões do relator, para que se possa negociar com os deputados. Então não coloca, a não ser que haja muita pressão da sociedade. Por isso que temos de ir pra rua, fazer pressão”, opinou.
2022
De acordo com o líder petista, se Bolsonaro não sair pelas vias institucionais, será removido no voto. “Se nada disso resolver, vamos esperar que o povo, em outubro de 2022, resolva o problema do país, colocando alguém que gosta da democracia, do povo, que respeita nossos parceiros internacionais e que vá governar efetivamente para a população e não para militares da reserva e milicianos”, sugeriu.
Caso o PT volte à Presidência da República, Lula disse esperar um Brasil muito diferente da catástrofe bolsonarista, um governo que só olha para uma ínfima parcela da população. “Vamos governar para todos, mas o pobre estará em primeiro lugar. Se o Estado não cuidar do pobre, se não levar luz para todos, água, se não garantir que as pessoas mais pobres tenham direito de acesso às coisas, elas continuarão pobres a vida inteira”, esclareceu.
“A sociedade tem que saber que eu não vou governar o Brasil para 35% da população para quem a elite sempre governou”, apontou. “Quero que o pobre possa voltar a viajar de avião, que vá a restaurante, que tenha emprego com carteira profissional assinada, que coma carne, contra-filé, picanha, costela, que tome sua cervejinha”.
“O pobre precisa trabalhar, estudar, ter acesso à cultura, lazer. Tenho certeza de que é possível fazer mais e fazer melhor. Vamos governar para todos. Tem um pessoal do agronegócio que muitas vezes reclama de barriga cheia, porque ganharam muito dinheiro no meu governo”, lembrou Lula.
Ele argumentou ainda que é hora de pacificar o país e isso só se consegue com um presidente que fale para todos, inclusive para a oposição. “É da divergência que a gente constrói a democracia. Eles têm que saber que no meu governo haverá menos armas e mais livros. Menos violência e mais educação, menos bravata e mais paz”, prometeu.
7 de setembro e MBL
O presidente falou ainda sobre os atos do 7 de Setembro, o fiasco das manifestações do MBL e o aparente recuo de Bolsonaro, que divulgou nota redigida pelo golpista Temer. “Eu não sei se alguém acreditou na nota feita pelo Temer ao Bolsonaro, não sei se alguém acreditou que o Bolsonaro estava falando sério. Na verdade, o Bolsonaro assinou, naquela carta, apenas uma demonstração da fragilidade dele, da falta de comportamento de um presidente da República”, comentou.
“Não deveria ser necessário alguém dar conselho ao presidente, de que ele precisa governar esse país em harmonia, que ele precisa respeitar as pessoas, que precisa respeitar as instituições. Porque esse é o papel de um presidente da República. Não é fazer provocações, fazer agitação. O papel do presidente é governar o país pensando em todas as pessoas, respeitando pessoas e instituições”, disse Lula.
Sobre o MBL, foi taxativo: “Nunca acreditei na capacidade de mobilização do MBL. O MBL surgiu no ápice da campanha do impeachment da presidenta Dilma, quando os meios de comunicação convocaram aqueles atos de forma aberta, coisa que eu jamais tinha visto na política brasileira”.