Em discurso no Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences Po), nessa terça-feira (16), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ser necessário reconstruir as instituições internacionais sobre novas bases. Lula disse ser urgente, neste momento pós-pandemia, convocar uma conferência mundial, com representação de todos os Estado, e participação da sociedade civil, para definir uma nova governança global, justa e representativa.
O ex-presidente foi homenageado mais uma vez pela Sciences Po, que celebrou os dez anos da entrega do título Doutor Honoris Causa. Lula cumpre agenda de dois dias na capital francesa. Antes da palestra no Instituto, um dos mais prestigiados do mundo na área de ciência política e social, Lula almoçou com a prefeita de Paris, Anne Higaldo. Nesta quarta, ainda em Paris, o ex-presidente receberá o prêmio Coragem Política, entregue pela revista Politique Internationale.
“Não podemos continuar governados por um sistema criado após a Segunda Guerra Mundial. Hoje a ONU não tem nenhum poder. É preciso mudar”, disse Lula, lembrando que, quando presidente, já trabalhava pela ampliação da quantidade de países no Conselho de Segurança da ONU.
Questionado sobre a posição do Brasil na disputa entre Estados Unidos e China, Lula disse que é preciso aperfeiçoar a integração na América Latina e tentar reestabelecer o acordo com a União Europeia. Lula disse que conversou sobre o assunto no encontro que teve com o vencedor das eleições alemãs, Olaf Scholz, há alguns dias. Ele se encontrou também com o presidente da França, Emmanuel Macron, nesta quarta-feira (17) e, deve ainda se reunir com o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, nos próximos dias.
O ex-presidente destacou a necessidade de desenvolver a indústria nacional para ampliar o comércio do Brasil com os outros países. “Nós queremos desenvolver do ponto do vista industrial, para exportar produtos de maior valor agregado”, afirmou. Ele lembrou o setor produtivo já representou 30% do PIB brasileiro, mas hoje participa com apenas 11%. “Ou seja , acabou a indústria nacional, temos que fazer um esforço extraordinário para industrializar o país”.
Para o ex-presidente, o Brasil deve conversar tantos com os Estados Unidos quanto com a China. “Eu acho que o Brasil tem autoridade moral. Na hora que o Brasil tiver um presidente democrático, uma pessoa civilizada, o Brasil vai sentar com a União Europeia, com Índia, China… É um trabalho que o Brasil pode fazer, quando voltar à normalidade democrática, ética, da civilização, pode ter um peso nessa discussão e ajudar a encontrar saídas”.
Lula, que no discurso disse que o mundo sente falta do protagonismo internacional que o Brasil já teve, afirmou após a palestra que, “neste instante a Europa precisa do Brasil como suporte para fazer um acordo e ter um bloco mais forte”. “O mundo é composto de blocos, precisamos nos juntar para que a gente possa ter força e fazer a economia mundial ser mais solidária”.
O ex-presidente disse ser “inevitável comparar a posição que o Brasil havia alcançado nas relações internacionais com o isolamento entre as nações em que o país se encontra hoje”. Ele destacou que a mudança não ocorreu por acaso. “É o resultado de uma disputa pelo poder que extrapolou os limites da Constituição e do respeito à democracia, até culminar no golpe do impeachment sem crime da presidenta Dilma Rousseff, em 2016, e tudo o que veio depois”, afirmou.
Lula disse ainda que “foi para interromper aquele projeto de país soberano e retomar o ciclo neoliberal que mentiram ao país até levar um governo autoritário e obscurantista à presidência da República”. “Na realidade, o processo de destruição nacional em curso no Brasil só poderia ser conduzido por um governo antidemocrático, num país envenenado pela indústria das fake news e em que a oposição é excluída dos debates nos grandes meios de comunicação”, afirmou.