No Dia Internacional Contra a Homofobia, um dos países de maior diversidade cultural e populacional do planeta não tem o que comemorar. O Brasil acumula 45% dos assassinatos de transgêneros no mundo – e olha que pelos menos 13 nações condenam à morte lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e intersexuais (LGBTI). O dado foi apresentado em audiência pública, nesta quarta-feira (17), na Comissão de Assuntos Sociais do Senado (CAS).
Os números são assustadores. A cada 25 horas, uma pessoa LGBTI é morta no Brasil, de acordo com dados do Grupo Gay da Bahia, com base em notícias e informações passados por grupos e pessoas conhecidas das vítimas. Só em 2016, foram 343 mortes de homossexuais.
Para os participantes da audiência, o grande problema no Brasil é o descaso com o tema. Inclusive no Congresso Nacional, chamada de a “Casa do Povo”, onde parlamentares como o deputado tucano João Campos (GO), autor do projeto de lei da “cura gay”: o texto sugeria a suspensão de artigos de uma resolução do Conselho Federal de Psicologia, que proíbe profissionais de participar de terapias para tentar alterar a orientação sexual de pacientes e tratar a homossexualidade como doença.
“O Congresso Nacional está em dívida com as agendas voltadas para a cidadania da comunidade LGBTI no Brasil. O que temos visto é uma Casa extremamente hostil, fechada, anacrônica, arcaica. É preciso que o Legislativo cumpra o seu papel para a igualdade de direitos de todos e todas”, afirmou a presidenta da Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo, senadora Fátima Bezerra (PT-RN). “Ainda bem que há mobilização da comunidade LGBTI. Graças a essa mobilização que temos conseguido avanços no Supremo. Mas esta Casa continua surda, completamente surda para esse tema”, emendou.
Respeito zero
O descaso no Brasil é tão grande que vai além da violência contra a comunidade LGBTI. Passa até mesmo pela falta de garantias básicas, como reconhecimento de identidade de gênero nas escolas – onde 73% da comunidade afirma ter sido agredida verbalmente e, outros 36%, fisicamente.
“Queremos colocar na base comum curricular a questão de orientação sexual e identidade de gênero. Não queremos transformar ninguém em gay ou lésbica. Queremos transformar as pessoas em cidadãos e cidadãs que se respeitem”, destacou o secretário de Educação da ABGLT, Toni Reis.
Esse tipo de discriminação acontece até mesmo onde jamais deveria ocorrer. Que o diga a presidenta do Transgrupo Marcelo Prado, Rafaelly Wiest, desrespeitada até mesmo para entrar na Casa do Povo.
“Sou uma mulher trans, fiz retificação de nome. Mas antes do título trans, a Constituição diz que eu sou brasileira. Vim seguidas vezes ao Senado, mas não consta o meu nome nos registros desta Casa. Só há o nome dado pela minha mãe. Estava com documento formal, mas na portaria não era a Rafaelly que estava entrando”, criticou a presidenta do Transgrupo Marcelo Prado.
Esse é um exemplo dos milhares de desrespeitos diários. São episódios de violência e agressão verbal que começam dentro de casa e passam por desrespeitos na escola, no ambiente de trabalho e na rua. De acordo com a coordenadora LGBT da Secretaria de Direitos Humanos, Marina Reidel, o Disque 100 registrou 1.286 denúncias de agressões a homossexuais no País. E o número pode ser assustadoramente maior.
“No caso da população de travestis, muitas vezes o registro [de violência no Disque 100] nem acontece. Por isso sequer podemos dizer ter dados fidedignos do problema”, lamentou Reidel.
Respeito à Constituição
Mesmo com importantes reconhecimentos recentes à comunidade – como a decisão do Supremo Tribunal Federal de reconhecer a união homoafetiva, em 2011 –, ainda falta muito para mudar a cultura homofóbica no Brasil. Mas o que as pessoas LGBTI pedem é o respeito ao que está escrito na lei.
“Sou uma cidadã brasileira. Não há nada na Constituição que diga que um transexual não tem a garantia de seus direitos, como à segurança”, reforçou Rafaelly Wiest.
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