O ministro da Fazenda Guido Mantega afirmou nesta terça-feira (23/08), em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, que já “está na hora de o Brasil começar a pagar menos pelo serviço da dívida”, confirmando que o governo desembolsa uma proporção elevada de suas riquezas para o pagamento de juros. O serviço da dívida é aquele gasto que o governo paga à título de remuneração pelos títulos públicos em circulação no mercado.
“Esse custo entre 5,5% e 6% do Produto Interno Bruto (PIB) poderia evoluir para uma situação onde o governo pagaria menos e com uma redução de 2%, por exemplo, o Brasil zeraria o déficit nominal, hoje correspondente a 1,9% do PIB. O dinheiro que poderia seguir para investimentos”, afirmou.
O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) pediu atenção especial para a contínua entrada de dólares no País porque os juros altos atraem capitais indesejados, por mais que o Governo Federal tenha adotado medidas para inibir a valorização do real, prejudicando o setor exportador.
Ele voltou a pedir a redução dos juros na próxima reunião do Copom, que acontecerá na semana que vem.
Mantega reconheceu que não se pode baixar os juros de forma “voluntarista” porque há o compromisso de controlar a inflação, mas é possível começar a trabalhar com os juros já que a política fiscal está controlada.
Os 6% do PIB que o governo gasta com o serviço da dívida é diferente da situação da Itália, onde a dívida pública está em 100% do PIB. Acontece, no entanto, que lá o serviço da dívida corresponde a 1,5% do PIB e se o percentual fosse como o brasileiro, a Itália já teria quebrado há muito tempo.
Situação dos EUA preocupa
Os senadores da oposição presentes na CAE assistiram com atenção para o alerta dado pelo ministro Mantega para a situação econômica dos Estados Unidos. “Os americanos optaram por usar a política monetária para enfrentar a crise, só que agora terá de usar instrumentos fiscais. E corte de gastos públicos pode levar a uma recessão”, alertou.
A posição do País diante da situação de outros países, conforme planilhas apresentadas por Mantega, exibe um cenário inesperado: o Brasil dizendo o que os EUA e outros países desenvolvidos devem fazer para sair da crise.
As baixas previsões de crescimento dos EUA e da economia européia, em 1,7%, apontam que a recuperação está distante, assim como a geração de empregos, enquanto os bancos americanos contam com depósitos de US$ 1,6 trilhão dispostos a buscarem rentabilidades pelo mundo afora. O Brasil tomou medidas para conter a enxurrada de dólares e adotou ações que limitam a especulação desenfreada no mercado de derivativos de moedas. Isto quer dizer, segundo Mantega, que a confiança dos investidores com os títulos da dívida soberana desses países em crise está caindo.
“Há países com dificuldades para honrar a dívida soberana e é mais difícil de encontrar soluções. O fundo de estabilização europeu, para socorrer os países, tem poucos recursos, algo em torno de 400 bilhões de euros. É uma cifra expressiva, mas os problemas são maiores. Só a dívida soberana da Grécia é de 350 bilhões. Então, ou deixa quebrar ou soluciona o problema. Acho que deveriam colocar 1 trilhão de euros nesse fundo, porque os mercados e a sociedade não demonstram confiança nas soluções adotadas até agora”, salientou.
O quadro nos Estados Unidos é pior, segundo Mantega, porque há conflito político exacerbado e que resultou no rebaixamento do nível de risco americano. “Aqui no Brasil não temos conflito político e isso não ocorre porque temos maturidade”. Outro problema é que a política monetária americana, de sucessivas redução dos juros, para algo em torno de 0,25% ao ano para os “tressury bonds”, os títulos americanos, gerou um estoque de US$ 1,6 trilhão. “Não sou contra a política expansionista quando devida, mas só isso não resolve. Há excesso de liquidez na economia que não é absorvida pelo setor produtivo”, observou, acrescentando que quando não há confiança pode-se injetar dinheiro na economia que não será usado na produção.
Esse excesso de liquidez, na avaliação do ministro, implica a guerra cambial, já que o dólar desvalorizou nos últimos anos cerca de 50%, tornando os produtos americanos baratos demais. Mesmo assim, não houve recuperação, mesmo considerando que o crescimento mundial da economia vem da locomotiva dos países emergentes, hoje responsáveis por 80% desse crescimento.
O Brasil, particularmente, tem uma dependência do mercado externo equivalente a 13%, enquanto os EUA, Alemanha, e outros países dependem de 40%. O mercado interno brasileiro, com a inclusão social, ainda está em crescimento, o que é favorável, assim como a solidez do sistema financeiro nacional. “Não tivemos problemas de subprime, a situação fiscal é melhor do que países avançados e a dívida pública está estabilizada. A inflação subiu recentemente porque tivemos um surto mundial e uma pressão interna, mas o índice está dentro das metas estabelecidas. O Brasil possui confiança”, salientou.
Desindexação
O ministro destacou que também está na hora de iniciar a desindexação da economia, resultado das bases do Plano Real porque no seu lançamento havia muita desconfiança com o Brasil. O que ficou foi o resíduo que obrigou o governo a indexar os contratos de privatização em vários setores – energia elétrica e rodovias – como forma de garantir uma remuneração aos investimentos que seriam realizados. “Hoje temos condições de alterar isso, porque os contratos que estão vencendo comportam ganhos de produtividade”, afirmou.
Outros contratos da economia, como os aluguéis, reajustados pelo IGPM e que na avaliação do ministro não é um bom indexador, embora seja facultado às pessoas determinarem qual indexador utilizar, ele considera que o ideal seria o IPCA.
Já o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), quer que o Executivo dê mais atenção aos programas sociais de distribuição de renda como forma de manter a inclusão social e reforçar o mercado interno.
Marcello Antunes
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Ouça o comentário do senador José Pimentel sobre a audiência com o ministro Guido Mantega
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