Em sintonia com a chamada “guinada verde” defendida pelo presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado, Jaques Wagner (PT-BA), o economista Márcio Pochmann, presidente do Instituto Lula, descreve em artigo movimentos internacionais nas últimas décadas para rever remédios que não deram certo no combate às mudanças climáticas.
No Brasil, a transição ecológica está no centro do debate que deve resultar em políticas públicas para o próximo governo, a partir de 2023.
O texto foi publicado originalmente no site Terapia Política.
Os caminhos da transição ecológica
A temática ambiental foi sendo incorporada à agenda política do desenvolvimento a partir da virada dos anos 1960, quando se tornaram públicos os primeiros estudos tratando dos limites da natureza impostos pelas contínuas exigências do progresso material. Inicialmente, houve o reconhecimento, por parte dos países de capitalismo avançado, de que a reprodução do modo de vida estabelecido pelo estilo american way of life condenaria no longo prazo a vida no planeta.
A partir da denúncia técnico-científica formulada naquela época, conformou-se certa convergência política mais ampla em torno da necessária reação ao movimento de incompatibilidade entre as bases tradicionais do crescimento econômico e a sustentabilidade ambiental. Concomitantemente, a emergência de um novo sujeito social cada vez mais consciente do seu papel a ser materializado pela difusão de instituições sociais e políticas voltadas para a defesa do meio ambiente.
A produção do relatório Brundtland no final da década de 1980 se mostrou fundamental para aglutinar governos de diferentes países na perspectiva de minorar os efeitos nefastos do modo de produção e consumo sobre a natureza, introduzindo o conceito do desenvolvimento sustentável. A realização de conferências, compromissos e metas estabelecidas, bem como a organização interna dos governos em ministérios e políticas públicas, e também instituições da sociedade civil, geraram a expectativa de que o problema ambiental estaria sendo enfrentado de forma adequada.
Uma nova rodada de conscientização técnico-científica emergiu do relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) no âmbito das Nações Unidas que, entre outros estudos, passou a colocar em questão a possibilidade de o conceito do desenvolvimento sustentável ser alcançado. Diante da manutenção do paradigma de produção mecânico-químico introduzido desde a industrialização inglesa no século 18, a saída pela via dos mercados, inclusive com mudanças tecnológicas, continuava a comprometer o meio ambiente, o que sugeriria uma espécie de autoengano coletivo.
Decorridas três décadas de iniciativas em prol do desenvolvimento sustentável, os resultados alcançados estavam muito longe das metas originalmente estabelecidas. Não somente os problemas já denunciados há mais de meio século não tinham sido superados, como outros mais graves se imporiam diante da mudança do regime climático.
A aceleração do Antropoceno estaria apontando para uma situação climática irretornável, exigindo outro rumo que não a continuidade do paradigma mecânico-químico. Isso porque, mesmo com o conjunto de modificações introduzidas por dentro do mesmo paradigma técnico-científico de produção e consumo, a insustentabilidade do desenvolvimento não só se manteria como se aprofundaria.
Foi nessa oportunidade que o caminho para a transição ecológica começou a ganhar consistência técnica e política. Ainda que a mobilização social e política em torno da temática da transição ecológica se mostre apequenada, os relatório do IPCC seguem indicando que novas ações são necessárias para barrar a continuidade da devastação geradora de novo regime climático no mundo. A pandemia do coronavírus em 2020 representa um alerta de dimensão global que se vincula à problemática ambiental.
Os diversos registros de problemas decorrentes da escassez dos recursos naturais e dos efeitos nefastos da exploração ambiental sobre populações residentes parecem indicar que o mundo está diante de uma batalha jamais vista acerca da sobrevivência humana no planeta. Diante disso, a transição ecológica oferece pelo menos dois tipos de possibilidades em paralelo ao paradigma técnico mecânico-químico.
A primeira possibilidade se refere às regiões e populações localizadas nos biomas ainda sustentáveis, mas que necessitam de iniciativas governamentais direcionadas ao desenvolvimento humano, capaz de permitir a prevalência da natureza ao longo do tempo. A segunda, às regiões e populações situadas em territórios completa ou parcialmente comprometidos pelo elevado grau de internalização do modo de produção e consumo derivado do paradigma mecânico-químico.
As perspectivas atuais decorrentes dos esforços nos Estados Unidos, União Europeia, China e outros, apontam, por exemplo, para iniciativas de grande mobilização financeira em torno da temática ambiental. Ao que parece, trata-se de tentativas de convergir a prevalência do lucro no setor privado para que se torne regulado e coordenado pelo Estado. Se isso produzirá resultados ativos e positivos, só o tempo mostrará.