O bonde da história – Folha de S. Paulo – 09/06/2012
A Parada Gay de São Paulo é um marco na luta pelos direitos dos homossexuais no Brasil. O aumento estrondoso no número de participantes a cada ano mostra a evolução do evento. Em sua primeira edição, há 16 anos, cerca de 300 pessoas – em sua maioria homossexuais – reuniram-se para reivindicar a garantia de seus direitos. Eu estava lá.
O evento cresceu enormemente, manteve as reivindicações e transformou-se em motivo de encontro e celebração de diferentes tribos. As famílias foram para a rua declarar sua tolerância e a parada se tornou a maior manifestação gay do mundo. No ano passado, 4 milhões de pessoas lotaram a avenida Paulista e o evento gerou mais de R$ 200 milhões para os cofres da cidade.
Se aos poucos a cobrança de direitos foi ficando diluída, é indiscutível que a parada possibilitou o surgimento de vários outros eventos culturais voltados para o público LGBT e deu enorme visibilidade para as reivindicações da comunidade. Além de outras paradas que criam espaços na mídia e celebram o orgulho da diversidade sexual por todo o país.
Nestes últimos anos tivemos alguns avanços do lado do Executivo (declaração de Imposto de Renda conjunta e INSS) conquistados no governo Lula. Nada do Congresso. O projeto que criminaliza a homofobia encontra-se há anos no Senado ainda com dificuldades de aprovação.
Há um ano o STF concedeu aos casais homossexuais os mesmos direitos e deveres que a legislação brasileira já estabelece para os casais heterossexuais. Durante a votação, o então presidente do STF, o ministro Cezar Peluso, cobrou do Congresso que “assumisse a tarefa que até agora não se sentiu propenso a fazer” e transformasse a conversão em lei. Começamos.
Há poucas semanas a Comissão de Direitos Humanos do Senado aprovou projeto, de minha autoria, que altera artigos do Código Civil para reconhecer como entidade familiar a união estável entre pessoas do mesmo sexo. A proposta dá um passo adiante na decisão do STF permitindo a conversão da união homoafetiva em casamento.
O projeto seguiu para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde será relatado pelo senador Roberto Requião. Aprovado, irá à Câmara dos Deputados.
É uma oportunidade concreta para os parlamentares tomarem o bonde da história, como fizeram recentemente na CCJ aprovando a lei das cotas nas universidades para os mais carentes e os negros. Esse caminho, do cumprimento da Constituição e de ações afirmativas voltadas à garantia dos direitos humanos, está traçado. Pode demorar mais, ou menos, mas é inexorável.
Agora é a vez do Congresso. O Brasil espera e a parada de amanhã exigirá.
MARTA SUPLICY escreve aos sábados nesta coluna.