A SRª MARTA SUPLICY (Bloco/PT – SP. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) – Presidente Mozarildo Cavalcant, caros colegas Senadores e Senadoras, como se sabe, o Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu a união homoafetiva o mesmo status jurídico aplicado à união estável heterossexual. Ao conferir ao artigo 1.723 do Código Civil interpretação conforme a Constituição Federal, a decisão excluiu qualquer interpretação que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como sinônimo perfeito de família.
Várias repercussões surgiram desse entendimento: alguns pedidos de conversão de união estável em casamento foram deferidos. No Distrito Federal, a Justiça, por meio da Vara de Família, possibilitou alguns casamentos diretos entre pessoas do mesmo sexo.
Entretanto, em outros Estados do País, o cenário é diferente. O Judiciário e, mesmo integrantes do Ministério do Público, têm decidido contrariamente aos pedidos de conversão. Sem falar da competência do juízo que também é bastante confusa. Afinal, a competência da conversão seria da família – como no Distrito Federal e Pernambuco – ou da Vara de Registros Públicos, como acontece no Rio de Janeiro e São Paulo?
Há divergências, porém, dentro do próprio estado de São Paulo. Em Franco da Rocha e Bauru, por exemplo, a Vara competente foi a de Família. Em Jardinópolis, no entanto, foi a Vara de Registros Públicos.
Quero parabenizar o Superior Tribunal de Justiça, porque a decisão de ontem da 4o Turma do Superior Tribunal de Justiça, que autorizou a conversão da união estável em casamento representa um avanço considerável na efetivação dos direitos de cidadania LGBT. Provavelmente, tal decisão voltará ao Supremo, fato que pode ser evitado se o Conselho Nacional de Justiça acatar o requerimento apresentado por mim junto…
junto àquele órgão, solicitando a expedição de uma resolução que regulamente as formalidades jurisdicionais pertinentes à união estável em casamento, em consonância à decisão do STF. Senão, nós vamos continuar tendo essa procura, provavelmente.
Esse pedido que fiz é um pedido para que seja feita uma regulamentação, para que nós acabemos com essa dificuldade, com essa humilhação, muitas vezes com essa dor das pessoas do mesmo sexo, que mesmo tendo, depois, obtido no Supremo uma sentença favorável, por unanimidade e com belíssimas falas, ainda dependem da cabeça de cada juiz.
Quanto à ação legislativa, eu já apresentei a esta Casa um projeto de lei, o PLS 612, em tramitação na Comissão de Direitos Humanos. O projeto pode não trazer maiores novidades em relação ao que tem sido decidido pela melhor jurisprudência, mas é relevante, porque ele torna adequada a redação dos artigos 1723 e 1726 do Código Civil, para deles excluir qualquer significado que impeça a conversão da união estável em casamento. Quer dizer, são ações no sentido de que não deixemos nas mãos só do Judiciário, por nossa incompetência legislativa.
Aqui, eu gostaria de fazer um comentário sobre um discurso do meu colega, Senador Marcelo Crivella, feito, eu acho, na última terça-feira, em que ele disse que o Supremo Tribunal Federal considerou como união estável a união entre pessoas do mesmo sexo e, agora, o Superior Tribunal de Justiça a entendeu, pelo número de votos que já foi dado à causa, como casamento.
Ele questiona: “Em primeiro lugar, eu gostaria de perguntar se esse ativismo judiciário realmente faz bem ao Brasil, porque os juízes e os senhores promotores são homens e mulheres treinados para olhar para trás e não olhar para frente.”
Deus, isso até me assusta, porque eles não são treinados para olhar só para trás e decidir sobre o que o Senador, aqui, está imaginando. Eles têm uma capacitação, uma qualificação para estar na Suprema Corte deste País.
Quando ele diz que nós, políticos, olhamos para frente, esta Casa não está olhando para frente. O Congresso Nacional está olhando para trás há muito tempo, em relação às pessoas homossexuais. Ele está olhando para trás, desrespeitando as pessoas homossexuais, tendo preconceito em relação aos homossexuais.
Eu tenho um projeto há 16 anos na Câmara dos Deputados, que nunca foi votado. Está lá, em plenário, sem ser votado. Aqui, nesta Casa, com o projeto que criminaliza a homofobia a gente não consegue caminhar.
Então, eu acredito que quem está para trás é esta Casa. Esta Casa, o Congresso Nacional, tem medo. Aqui fala um pouquinho dos eleitores também. Tem medo dos eleitores e não consegue olhar os direitos humanos de milhares de cidadãos brasileiros que hoje dependem das leis.
E, se o Judiciário hoje faz esse papel de legislar, é porque nós, legisladores, não cumprimos com a nossa função. Nossa função é ter destemor, é ter ousadia, é ter compaixão! E ter, principalmente, respeito à cidadania de uma parcela da população brasileira, homens e mulheres que pagam impostos, que são cidadãos iguaizinhos aos outros e que hoje, além de serem discriminados, sofrem de violência enorme.
Na época em que eu era Deputada, nós, quando olhávamos a vizinha Argentina, víamos como eles eram atrasados em relação a essa questão da homossexualidade. Hoje, a Argentina tem casamento entre homossexuais.
E nós temos espancamento na Avenida Paulista!
É isso o que hoje temos no Brasil: assassinatos cada vez mais numerosos, desrespeito às mais fundamentais relações humanas que poderíamos ter entre pessoas. Isso vem de uma intolerância e, sinto muito, vem muito também de uma intolerância religiosa frente a essa diversidade sexual, frente aos pleitos que fazem os homossexuais.
O Brasil é um país laico. O Brasil é um país onde, graças a Deus, nós conseguimos ter esse caminho. Estou dando até risada do “graças a Deus”. Mas é isso mesmo: nós somos isto, nós conseguimos ter essa laicidade na nossa Constituição, e isso é muito importante, e é isso que temos de preservar.
Os que pensam de uma forma e frequentam uma igreja não se abalarão com união homossexual alguma, com casamento homossexual. E dizer que casamento homossexual, que união homoafetiva vai acabar com a família é não ter noção de Psicologia ou até da realidade, de olhar a realidade, porque todos os homossexuais que eu conheço são filhos de heterossexuais.