A explosão popular no Chile alertou os donos do dinheiro no mundo, ou seja o sistema financeiro internacional, para o aprofundamento da desigualdade. A crise do neoliberalismo tem sua matriz nos Estados Unidos, mas se alastra, principalmente pela Europa e nos países da América Latina.
Diante disso, seus porta-vozes apostam em capturar a bandeira do “combate à desigualdade”, como uma tentativa de contornar a situação e manter a espoliação selvagem. No entanto, assim como na maioria dos países latinos, especialmente no Brasil, há uma combinação de fatores que apontam para o agravamento da desigualdade.
Para o economista Bruno Moretti, são várias as razões que tornam o novo discurso neoliberal apenas demagogia, a começar pelos empregos. “O mercado de trabalho não gera as ocupações formais necessárias para alterar o quadro de desemprego e precarização”, diz ele. A política fiscal restritiva trava a geração de emprego e renda, pois reduz investimentos públicos.
O fim da política de valorização do salário mínimo, por outro lado, deve afetar 48 milhões de brasileiros, retirando R$ 7 bilhões da economia em 2020. A redução de 30% a 40% nos benefícios previdenciários, resultado da reforma da Previdência recentemente aprovada, agrava ainda mais o quadro.
Outras medidas restritivas adotadas pelo governo tornam ainda mais inviável qualquer proposta neoliberal de “combate à desigualdade”, destaca Moretti.
Na proposta orçamentária de 2020, a primeira da gestão Bolsonaro, o Bolsa Família teve queda real. Os investimentos públicos estão num patamar inferior a R$ 20 bilhões (menos de 30% do previsto em 2014). O programa Minha Casa Minha sequer alcança R$ 3 bilhões (menos de 20% do previsto em 2014). A saúde, por sua vez, perde mais de R$ 10 bilhões, em razão do congelamento do piso mínimo a ser investido no setor.
“O cenário mais provável, portanto, é o de manutenção de um mercado de trabalho fraco, com queda da renda previdenciária (que foi central na crise para compensar a queda da renda do trabalho) e das transferências governamentais e serviços públicos fortemente redutores da desigualdade (Bolsa Família, saúde, educação, entre outros”, diz Moretti.
Para o economista, “pode até mesmo haver algum efeito sobre o PIB entre o último trimestre e o início do ano, frente a medidas temporárias de impulso da demanda como a liberação do FGTS e o rateio do bônus da cessão onerosa, mas elas se dissiparão”, conclui Moretti.
O receituário neoliberal de desregulamentação trabalhista, redução unilateral de tarifas de importação, privatizações que não ampliam investimentos e encarecem o acesso a bens e serviços de utilidade pública (como deve acontecer com os combustíveis com a venda das refinarias da Petrobrás), redução das políticas sociais e dos investimentos públicos e ausência de medidas para tributar renda e patrimônio do “andar de cima” deverá implicar no aumento das desigualdades e manter a economia com uma taxa de desemprego elevada, próxima a 12%, pelo menos até 2020.