A ideia do “Estado mínimo” (para os outros) que alimenta o neoliberalismo do ministro-banqueiro Paulo Guedes e sua trupe de Chicago está elevando ao nível máximo a desigualdade no país e poderá comprometer toda uma geração. As crianças e adolescentes que hoje vivem na extrema pobreza, caso não recebam a atenção devida do governo federal, poderão se tornar dependentes do Estado pelo resto da vida.
A previsão é do diretor do Centro Brasileiro de Pesquisa Aplicada à Primeira Infância (CPAPI), Naércio Menezes Filho. O “círculo vicioso, nocivo para a perpetuação da pobreza e para a economia”, disse à Folha de São Paulo, começa na primeira infância.
“Uma criança que vive num lar de dificuldades, em que vê a mãe preocupada com dinheiro, tendo que trabalhar sem ter com quem deixar os filhos, que não interage, essa criança vai demorar mais para começar a falar, a andar e, depois, terá muita dificuldade de aprendizado”, enuncia o economista.
“No início, o Bolsa Família foi criado para eliminar a pobreza extrema e não deixar que nenhuma família passasse fome. Ele chegou a atingir o objetivo. Só que duas coisas aconteceram depois”, explica Naércio. “Primeiro, o valor não foi reajustado de acordo com a inflação e hoje está baixo (o último reajuste foi em 2018). O segundo é que sua cobertura não foi ampliada de acordo com o aumento da pobreza.”
“Ela vai ser uma daquelas crianças conturbadas. Dificilmente sairá bem formada de um ensino médio e conseguirá um emprego formal, onde há mais produtividade e onde se paga mais impostos”, conclui.
Menezes lembrou que para cada R$ 1 per capita oferecido em um programa como o Bolsa Família, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita do município onde a verba é aplicada sobe R$ 4. Dessa forma, o Bolsa Família impulsionou a economia dos pequenos municípios brasileiros e gerou um ciclo virtuoso com benefícios macroeconômicos, acelerando a ascensão social e criando um “país de classe média”.
Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), baseado em dados de 2001 a 2017, revelou que políticas como o Bolsa Família reduziram a pobreza em 15% e a extrema pobreza em 25%.
“Os recursos (orçamentários) existem. A questão é como mexer na distribuição, com uma minoria que capturou esses recursos. Como, por exemplo, com os subsídios a grupos e setores [quase R$ 310 bilhões/ano]”, afirmou o economista. “Isso passa por muita coisa, porque o Brasil é um país estruturalmente desigual.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a insegurança alimentar caía no Brasil desde 2004, mas voltou a subir em todas as suas formas na esteira da forte recessão de 2015-2016, que encolheu o PIB em 7,2% para desembocar no golpe contra Dilma Rousseff. A partir dele, o usurpador Michel Temer destruiu os investimentos públicos com sua maldita regra do “teto de gastos”.
“No início, o Bolsa Família foi criado para eliminar a pobreza extrema e não deixar que nenhuma família passasse fome. Ele chegou a atingir o objetivo. Só que duas coisas aconteceram depois”, explica Naércio. “Primeiro, o valor não foi reajustado de acordo com a inflação e hoje está baixo (o último reajuste foi em 2018). O segundo é que sua cobertura não foi ampliada de acordo com o aumento da pobreza.”
A partir de 2019, o desgoverno Bolsonaro esvaziou várias políticas públicas que faziam parte do escopo do Programa Fome Zero e submeteu a política econômica aos interesses do mercado. Dolarização de preços, desemprego recorde, inflação descontrolada e queda da renda completaram o serviço, com um componente de perversidade a mais.
“Os recursos (orçamentários) existem. A questão é como mexer na distribuição, com uma minoria que capturou esses recursos. Como, por exemplo, com os subsídios a grupos e setores [quase R$ 310 bilhões/ano]”, afirmou o economista. “Isso passa por muita coisa, porque o Brasil é um país estruturalmente desigual.”
Como forma de combater essa desigualdade, Naércio propõe a transferência direta de dinheiro aos mais pobres. “Não é necessário criar novo ministério ou estrutura administrativa. Basta dar um cartão para essas pessoas. Já temos a tecnologia para fazer isso. Temos o Bolsa Família, o Cadastro Único e o registro das pessoas que precisaram receber o auxílio emergencial”, defendeu.
“De fato, aumentamos muito os gastos com educação e saúde nos últimos 30 anos. No ensino médio, aumentou cerca de três vezes de 2000 para cá. Mas só o gasto com educação não é suficiente para eliminar a pobreza de forma definitiva”, concluiu o economista.
Pesquisa da Rede PENSSAN mostra que 116,8 milhões de pessoas não tinham acesso pleno e permanente à comida em dezembro de 2020, sendo q 19,1 milhões passavam fome. Caos de Bolsonaro tá estampado na capa do jornal francês Le Monde que destaca que “Brasil afunda na pobreza extrema”
— Gleisi Hoffmann (@gleisi) October 13, 2021
Falta de vergonha de quem governa
A presidenta nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), chamou a atenção para o levantamento mais recente da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.
“Pesquisa da Rede PENSSAN mostra que 116,8 milhões de pessoas não tinham acesso pleno e permanente à comida em dezembro de 2020, sendo q 19,1 milhões passavam fome. Caos de Bolsonaro tá estampado na capa do jornal francês Le Monde que destaca que “Brasil afunda na pobreza extrema”, diz a postagem em seu perfil no Twitter.
Divulgado pela Folha nesta quarta-feira (13), o estudo revela que 20 milhões de brasileiros declaram passar 24 horas ou mais sem ter o que comer em alguns dias. Mais 24,5 milhões não têm certeza de como se alimentarão no dia a dia e já reduziram quantidade e qualidade do que comem.
“A fome não é um fenômeno da natureza, a fome é um fenômeno da falta de vergonha na cara de quem governa este país. Porque nós mostramos que é possível acabar com ela”
— @LulaOficial#ContraAFomeForaBolsonaro— PT no Senado (@PTnoSenado) October 14, 2021
Outros 74 milhões vivem inseguros sobre se vão acabar passando por isso. No total, mais da metade (55%) dos brasileiros sofriam de algum tipo de insegurança alimentar (grave, moderada ou leve) em dezembro de 2020.
O inquérito, conduzido pelas pesquisadoras que validaram no país a Escala Brasileira de Segurança Alimentar usada pelo IBGE, se refere a dados anteriores à disparada inflacionária dos últimos meses. O quadro, portanto, deve ter piorado.
Em setembro, o índice de difusão do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para alimentos, que mostra o percentual de itens com aumentos, estava em 64%. Em 2019, quando a inflação oficial equivalia a menos da metade da atual, a difusão nos alimentos era pouco superior a 50%, o que não limitava tanto a substituição de produtos.