Porque o promotor paulista que persegue Lula deve ser afastado do caso

Porque o promotor paulista que persegue Lula deve ser afastado do caso

Perseguição de Conserino a Lula deveria afastar promotor do casoA primeira palavra para definir este texto não pode ser outra: coerência. Não, o promotor Cassio Conserino não deve ser preso pelas recentes ações arbitrárias e parciais contra o ex-presidente Lula. Mas levanta o debate sobre a atuação do agente público no caso. O pedido de prisão do maior presidente da história do País tem como base “garantir a ordem pública” – um dos cincos requisitos para esse tipo de punição previstos no Artigo 312 do Código de Processo Penal. A pergunta que fica é o que pode mais perturbar a ordem pública: um ex-presidente que se diz indignado com a perseguição que vem sofrendo ou um promotor que parece atuar de forma política?

Movimentos sociais pretendiam protestar no domingo (13) contra a perseguição a Lula, no mesmo dia em que ocorrerão manifestos em favor do golpe contra à presidenta Dilma. Para evitar o que poderia ser um derramamento de sangue, devido à possibilidade de enfrentamento entre esses dois grupos, tanto o Partido dos Trabalhadores quanto os movimentos sociais vinham convencendo a militância a ir às ruas em outras datas.

Com a divulgação da peça que pede a prisão de Lula pelos promotores de São Paulo (que pode ser lida na íntegra aqui), os movimentos sociais reagiram. Se antes a possibilidade de protestos simultâneos aos dos golpistas no domingo era improvável, agora é quase impossível que não haja atos em defesa do ex-presidente.

O pedido de prisão feito pelos promotores paulistas Cassio Conserino, José Carlos Blat e Fernando Henrique Araújo é carregado de polêmicas. Entre as mais absurdas, estão a de que Lula inflamou a população contra as investigações criminais, que as redes de apoio a ele são “violentas”, que parlamentares do PT estariam utilizando de manobras para impedir o processo e até mesmo citam a visita da presidenta Dilma ao ex-presidente um dia após a ação coercitiva impetrada pelo juiz Sérgio Moro, na semana passada, pela Operação Lava Jato. E isso sem considerar o erro histórico de citar que as condutas de Lula deixariam envergonhados Karl Marx e Friedrich Hegel – na verdade, o parceiro de Marx na famosa obra “O Manifesto Comunista”, referida pelos promotores, foi Friedrich Engels.

A ação dos promotores, ainda por cima, é contaminada pela assinatura de Conserino, que está sendo investigado pela Corregedoria Nacional por ter antecipado à revista Veja, no dia 22 de janeiro, que entraria com denúncias contra Lula antes mesmo de ouvi-lo. Somada à absurda peça de prisão, caracteriza-se um caso claro de motivação política ao ser feita dias antes de uma manifestação que pede o impeachment da presidenta Dilma.

A fogueira de ânimos no País acabou recebendo combustível desnecessário promovido por um órgão que deveria zelar pela Justiça, não pela inflamação de ânimos.

Um caso clássico onde a Justiça esteve envolvida na insurgência popular ocorreu nos Estados Unidos, no século XIX. Um dos estopins da Guerra de Secessão no país, que deixou a marca de 600 mil mortos, foi a decisão da Suprema Corte norte-americana de 1857 sobre Dred Scott. Scott foi um escravo que fugiu de uma propriedade do Sul do país – região notoriamente escravocrata – para um território federal, o quê, na época, garantiria a ele a liberdade.

Ao retornar para o Sul e visitar familiares, o antigo dono de Scott reivindicou que ele voltasse a ser seu escravo. O pedido foi acatado pela Supremo Corte, que sentenciou que pessoas de ascendência africana, importadas para o país e mantidas como escravas não estavam protegidos pela Constituição dos Estados Unidos e nunca poderiam se tornar cidadãos daquele país, garantindo que escravos eram como bens privados e não poderiam ser retirados dos seus donos sem o devido processo legal. Decidiu, ainda, que o Congresso não tinha autoridade para proibir a escravidão nos então territórios federais da União.

Dadas às devidas proporções, não há de se comparar o caso norte-americano com o brasileiro. Não haverá uma guerra civil ppr aqui por causa de uma peça polêmica. Fica, no entanto, a provocação: se o risco de Lula era acirrar os ânimos, o que dizer de uma ação que provocou reações fortes entre os brasileiros, possibilitando até mesmo confrontos físicos?

O caso leva, no mínimo, a uma análise da Justiça se não seria o caso de afastar Conserino do processo, revisando a decisão do Conselho Nacional do Ministério Público de mantê-lo à frente das investigações. Devido às circunstâncias do pedido de prisão, o que ocorre agora é uma onda contrária, de críticas até mesmo da oposição à peça sem fundamentação jurídica e a inflamação de uma militância de esquerda que promete reagir à altura a atuação arbitrária. Antes que o caso se torne o estopim de conflitos nas ruas, é razoável avaliar até que ponto vale manter na ação do MP paulista um fiscal da Lei que pode acirrar o ódio no País.

 

Carlos Mota

Assessor da Liderança do PT no Senado

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