Barbosa explica decretos e esvazia hipótese de crime de responsabilidade

Barbosa explica decretos e esvazia hipótese de crime de responsabilidade

“Esse processo vai ser objeto de uma análise detalhada pela nossa História”O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, esvaziou o discurso da oposição de que houve crime praticado pela presidenta da República na edição de seis decretos de suplementação orçamentária e na operação do Plano Safra. Didaticamente e no ponto central da denúncia vazia financiada pelo PSDB, Nelson Barbosa mostrou que a meta fiscal não foi descumprida; que o governo Dilma seguiu normas editadas pelo TCU e que, portanto, não há crime em qualquer hipótese como quer a oposição para justificar o golpe em andamento. “Eu considero que não há fundamento legal para a acusação de crime de responsabilidade por parte da presidenta Dilma Rousseff. E eu tenho certeza de que isso ficará claro ao final deste processo, seja isso agora, no Senado Federal, como eu espero, seja isso no futuro, porque, com certeza, este processo vai ser objeto de uma análise detalhada pela nossa História”, afirmou. 

O ministro disse ser natural, num ambiente em que se respeita a democracia, os questionamentos feitos para o aperfeiçoamento da política fiscal, e a evolução que leva a novos entendimentos devem ter aplicação para a frente, nunca uma aplicação retroativa como querem justificar os defensores do golpe. Isso sendo adotado significa incerteza jurídica e o certo é evitar acusações de irregularidades sem base legal, para que não coloquem em risco o Estado de Direito. 

Nelson Barbosa, na comissão de admissibilidade do impeachment, mostrou porque a denúncia é vazia. “A aceitação do pedido de impeachment está baseada em dois fatos: a edição decretos de crédito suplementar, em suposto desacordo com a legislação, e o atraso no pagamento de subvenções do Plano Safra, que supostamente caracterizariam uma operação de crédito”, explicou. Abaixo, tópicos da exposição do ministro da Fazenda em defesa da democracia. 

Decretos não numerados 

Na sessão de ontem, os advogados do PSDB Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal, autores da denúncia aceita pela Câmara dos Deputados, disseram que é uma irregularidade que os decretos não sejam numerados. Mas Nelson Barbosa esclareceu: 

“Um decreto do ano de 2002, do então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, estabeleceu que decretos sem caráter normativo não precisam ser numerados; eles podem ser identificados somente pela sua data e pelo seu assunto. Esses decretos são públicos. São publicados no Diário Oficial da União. Esses decretos estão disponíveis no website do Governo. Esses decretos não são secretos. 

Porque tais decretos não são numerados: 

Eles somente não são numerados porque foi uma medida correta e simplificadora adotada em 2002, porque decretos, por exemplo, que versam sobre nomeação de cargos, abertura de créditos, declaração de utilidade pública para desapropriação são decretos que não são objeto de numeração. 

O que é decreto suplementar? 

É um decreto que amplia, que suplementa uma ação, uma despesa, um programa que já consta do Orçamento. Por isso leva este nome: decreto de crédito suplementar. Uma ação que já está aprovada pelo Congresso pode ser objeto de suplementação via decreto. Isso é estabelecido no art. 4º da Lei Orçamentária, que contém 29 incisos, para disciplinar os casos específicos em que o Poder Executivo pode, através de decreto ampliar, suplementar valores orçamentários de ações já aprovadas pelo Congresso Nacional. Para que haja uma suplementação, é preciso que haja uma fonte para essa suplementação. E a fonte de recursos para uma suplementação pode vir de três maneiras. 

Quais maneiras?

A primeira maneira é um remanejamento de recursos. Você pode aumentar uma determinada dotação para uma ação, reduzindo o valor correspondente em outra ação. É isso que é chamado remanejamento de recursos. A outra fonte para fazer uma suplementação é o chamado excesso de arrecadação. A Lei Orçamentária Anual vem com autorização no volume máximo de despesas que o governo pode fazer num ano. E ela vem também com uma previsão de receitas. E é importante enfatizar as palavras “previsão de receita”. O governo, como qualquer agente, não tem certeza de quanto vai receber num determinado ano. Então, há uma previsão de receita. Aquela previsão pode se confirmar, pode ficar abaixo ou pode ficar acima. Acontece, ao longo de ano, que algumas receitas ficam abaixo, como tem acontecido recentemente. A maior parte das receitas tem vindo abaixo da previsão. Mas algumas receitas superam a previsão. Então, nesse caso, quando uma receita vem acima do que estava previsto no Orçamento, há um excesso de arrecadação. Se esse excesso de arrecadação tem uma destinação vinculada, só podendo ser utilizado para uma determinada despesa, é possível, segundo autorização da LOA, abrir um crédito suplementar com base nesse excesso de arrecadação.

A terceira fonte de recursos para um crédito suplementar é o que é chamado superávit financeiro. 

O que é superávit financeiro?

É um excesso de arrecadação, mas que não foi verificado no ano em curso. É um excesso de arrecadação que foi verificado em anos anteriores, mas que não foi utilizado nos anos em que ele se verificou. Então, isso é depositado na Conta Única do Tesouro Nacional, no Banco Central, e transforma-se em superávit financeiro de exercícios anteriores e pode ser utilizado no futuro para as despesas vinculadas a esse tipo de receita. Todos os seis decretos mencionados no pedido de impeachment foram baseados em remanejamento de recursos, excesso de arrecadação ou superávit financeiro. Esses decretos estão completamente de acordo com a Lei Orçamentária. 

Qual o valor desses créditos suplementares?

Esses seis decretos criaram créditos suplementares no valor total de R$ 95,9 bilhões. Isso levou a algumas colocações, no debate na Câmara dos Deputados, de que haveria uma ampliação de despesas no valor de R$ 95,9 bilhões. Essa é uma afirmação incorreta. Por quê? Porque a maioria desse valor foi objeto de remanejamento. Desses R$ 95,9 bilhões de créditos suplementares criados, R$ 93,4 bilhões foram feitos via remanejamento de recursos; ou seja, reduziu-se a despesa de determinada ação para aumentar a despesa de outra ação. Não se aumentou o Orçamento. Dos R$ 95,9 bilhões, R$ 93,4 bilhões foram remanejamentos, redução em uma rubrica, em uma ação para aumentar outra ação. Ou seja, pega-se o orçamento da educação, reduz-se R$100 milhões de um determinado valor e aumenta-se R$100 milhões em outro valor. Quer dizer, o Orçamento continua o mesmo. Então, não há que se falar que houve uma ampliação do Orçamento no valor de R$95,9 bilhões, porque R$93,4 bilhões foram de remanejamentos. 

E como ficaram esses R$ 2,5 bilhões?

Esses R$ 2,5 bilhões restantes foram créditos criados com base em excesso de arrecadação ou superávit financeiro, com fontes novas de receita, não com remanejamentos. No que se refere a esses R$ 2,5 bilhões é importante destacar que R$ 700 milhões foram para o pagamento de juros e não têm impacto sobre a meta fiscal, porque a meta fiscal é uma meta para o gasto e para o resultado não financeiro. É uma meta para o chamado resultado primário, que é o resultado do governo, excluído o pagamento do recebimento de juros. Então, dos R$ 2,5 bilhões restantes, R$ 700 milhões foram criados para pagar juros. E o próprio deputado Jovair Arantes, no relatório aprovado na Câmara dos Deputados, reconhece que sobre esses R$ 700 milhões não há discussão. 

O que está em discussão?

Para homogeneizar a informação e focar a discussão onde ela tem que ser feita: não estão em discussão os R$ 95,9 bilhões. Estão em discussão os R$ 2,5 bilhões de créditos suplementares criados com base ou em excesso de arrecadação ou em superávit financeiro, sendo que desses R$ 2,5 bilhões é preciso retirar R$ 700 milhões. Nós estamos falando de R$ 1,8 bilhão, de um total de R$ 95,9 bilhões, só para dar uma dimensão do que é que está em discussão na questão dos decretos. 

E esses R$ 1,8 bilhão são o quê?

Desse R$ 1,8 bilhão, que foi criado com base em excesso de arrecadação ou superávit financeiro, qual foi a principal destinação disso? A maior parte desses recursos foi destinada a despesas do Ministério da Educação: R$ 1,256 bilhão. Em segundo lugar, aparece um pedido de crédito suplementar da Justiça do Trabalho, com R$ 171 milhões. Em terceiro lugar, aparece um pedido de crédito do Ministério da Defesa, com R$121 milhões. 

Há exemplos?

Foi autorizado um crédito suplementar para a Justiça Eleitoral, com base em excesso de arrecadação decorrente de tarifas de inscrições em concursos públicos. Houve um concurso público. Havia uma previsão de receita. Essa previsão de receita acabou sendo maior, porque mais pessoas se inscreveram nos concursos públicos. Com base nesse excesso de arrecadação, a Justiça Eleitoral pediu um crédito suplementar para realizar concurso público para cargos de analistas e técnicos judiciários. É um pedido que vem de outro Poder para o Poder Executivo. Segundo exemplo: no caso do Ministério da Justiça, houve um superávit financeiro de taxas e multas pelo exercício de poder de polícia, e de multas provenientes de processos judiciais de exercícios anteriores. Isso ficou depositado na Conta Única do Tesouro Nacional. Essa receita tem uma destinação, uma vinculação específica. Foi pedido pelo Ministério da Justiça um crédito suplementar para utilizar esse superávit financeiro, para utilizar esse superávit financeiro proveniente de multas provenientes de processos judiciais para realizar escoltas de cargas dimensionadas e curso de formação de servidores. Terceiro exemplo: Ministério da Educação. Houve também um superávit financeiro devido a contribuições maiores para o salário-educação do que havia sido previsto em exercícios anteriores. Isso não foi utilizado nos anos anteriores, ficou depositado na Conta Única do Tesouro Nacional. Essa é uma receita carimbada, essa é uma receita vinculada. É uma receita que tem que ser utilizada na educação. Pois bem, houve um pedido do Ministério da Educação para que se utilizasse esse superávit financeiro para o apoio à manutenção da educação infantil, conforme autoriza a Lei Orçamentária. 

Qual a diferença entre crédito orçamentário e limite financeiro?

Um crédito suplementar aumenta a dotação de uma determinada ação. Ele aumenta o valor, por exemplo, que pode ser utilizado para manutenção de universidades, para manutenção de hospitais. Ele altera esses valores. Ele altera a autorização orçamentária que o Congresso deu para determinadas ações e programas, mas ele não autoriza imediatamente uma despesa. Essa é a grande diferença. Um crédito suplementar muda as alternativas em que pode ser gasto um determinado valor financeiro. 

E o que determina esse valor financeiro?

É o decreto de contingenciamento; é o decreto de limite financeiro, que é feito sempre no início do ano, quando o governo faz a sua programação fiscal e orçamentária. A diferença entre orçamento e limite financeiro é a mesma, por exemplo, entre uma lista de supermercado e o volume de recursos que você tem no bolso para fazer as compras no supermercado. Quando você vai ao supermercado, você tem uma lista dizendo que você tem tanto para comprar de arroz, feijão, macarrão e ovo; e você tem um volume de recurso no bolso, ou seja, R$ 100,00 no bolso. O orçamento é a lista de supermercado; é no que você vai gastar aquele recurso. O limite financeiro é o quanto você tem no bolso para gastar esses recursos. 

Qual é o fato irônico que comprova a irregularidade desse pedido de impeachment?

O momento em que o pedido de impeachment foi aceito pelo presidente da Câmara dos Deputados foi a mesma data em que se mudou a meta fiscal. Então, aceitou-se um pedido de impeachment baseado em uma suposta edição de decretos irregulares que seriam incompatíveis com a meta fiscal, que foi mudada no mesmo dia em que se aceitou o pedido de mudança de meta fiscal. Só esse fato já torna irregular, inadequado caracterizar esses decretos como irregulares. O Congresso mudou a meta fiscal. No meio da votação – alguns parlamentares podem se lembrar dessa data –, da mudança de meta fiscal, o presidente da Câmara abre um processo de impeachment, baseado, dentre outras coisas, em uma irregularidade de decretos de crédito suplementar com a meta fiscal, sendo que a meta estava sendo mudada naquele momento. 

Plano Safra, o que é subvenção?

O governo tem vários programas de incentivo, tem programas de bolsa – o Bolsa Família, a assistência à educação via Fies, a assistência ao investimento –, e uma das modalidades de programas de incentivo de governo é incentivar algumas atividades como agricultura, investimentos, inovação, via equalização de taxa de juros. O que é equalização de taxa de juros? O Governo proporciona ao tomador final do recurso uma taxa de juros menor, mas paga ao banco uma taxa de juros maior. Então o banco vai para um agricultor, por exemplo, no Pronaf (Programa de Assistência à Agricultura Familiar), e empresta recursos a 6%, mas, naquela operação, o banco vai receber 8%. Esses 2% de diferença é coberto pelo governo como equalização de taxa de juros. Isto que é equalização de taxa de juros: é uma despesa primária. Toda equalização de taxa de juros, toda subvenção, para ser feita como qualquer despesa, tem que ser aprovada pelo Congresso Nacional. Todo pagamento de equalização está amparado por lei do Congresso Nacional, e todas essas leis determinam o quê? Determinam o limite, que valores podem ser objeto de equalização e determinam como deve ser executado esse programa. Todas essas leis atribuem ao Conselho Monetário Nacional e ao Ministério da Fazenda a regulamentação e a execução dos programas de subvenção. Então, nesse caso, não se trata nem de ato da presidente da República. É um ato infralegal, é um ato dos ministros, que regulamenta como deve ser implementado um programa de subvenção com base na autorização do Congresso Nacional. 

Equalização de taxa de juros é diferente de empréstimo?

O programa de equalização de taxa de Juros existe há muito tempo. Existe muito antes da LRF. Existe desde que tem crédito agrícola. A metodologia de pagamento de equalização de taxa de juros já vem sendo utilizada há muito tempo e não foi objeto de questionamento por parte do TCU até 2015. O TCU analisou as contas de 2012, as contas de 2013 e não apontou isso como uma irregularidade. Em 2015, ao analisar as contas de 2014, o TCU resolveu aperfeiçoar o seu entendimento, o que é normal. A lei é aperfeiçoada. 

O que o TCU apontou?

No processo de execução de equalização de taxa de juros, apontou que o governo não deve acumular saldos elevados junto aos bancos públicos, nem saldos por um período muito longo de tempo, porque isso poderia, supostamente, caracterizar uma operação de crédito. O governo apresentou seus argumentos, recorreu do então questionamento do TCU por entender que isso não caracteriza operação de crédito. Mas, a partir do momento que a recomendação do TCU se tornou final, a partir do momento em que houve um acórdão, em que o TCU, então, fechou a questão e recomendou uma mudança na prática na metodologia de pagamento de equalização e taxa de juros, o que ocorreu? O governo, imediatamente, aplicou a recomendação do TCU. Em outubro, de 2015, o governo, diante da decisão do ministro Augusto Nardes, submeteu ao Congresso Nacional um pedido de adequação do seu requerimento de mudança de meta fiscal, solicitou ao Congresso Nacional que incluísse no pedido um valor para que fosse possível pagar todos os passivos apontados pelo TCU. Esse pedido foi aprovado pelo Congresso Nacional em dezembro e, no final de dezembro, o governo, com a autorização dada pelo Congresso Nacional, pagou os passivos apontados pelo TCU. Não só fez isso, também modificou o regulamento de pagamentos de equalização de taxas de juros, fazendo com que agora esses valores sejam apurados em bases semestrais e pagos imediatamente nos primeiros cinco dias úteis do semestre seguinte. Portanto, sobre essa questão de pagamento de equalização de taxas de juros, que vulgarmente ficou conhecida pela imprensa como pedalada fiscal, é um assunto que foi questionado, respondido e resolvido em 2015. Resolvido, tanto do ponto de vista financeiro – o que foi apontado foi pago –, como também resolvido do ponto de vista administrativo – o governo adotou as portarias necessárias para aplicar a recomendação do TCU. E, como qualquer recomendação nova, o meu entendimento é que isso se aplicar para a frente, não se aplica retroativamente. 

Marcello Antunes

 

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