No “Valor”, líder pede maior integração do governo com o Congresso

Em entrevista à repórter Raquel Ulhôa, de Brasília, o senador Wellington Dias (PI), líder do PT e do Bloco de Apoio ao Governo, faz um balanço dos principais temas que tramitam no Congresso à espera de votação, admite que várias arestas precisam ser aparadas com o principal aliado do PT, o PMDB, e espera que os ministros tenham maior autonomia para negociar e decidir com os parlamentares.

Leia, abaixo, a íntegra da reportagem publicada nesta sexta-feira (25/05) pelo mais importante jornal de economia e negócios do País.

“Ministros precisam ter presença mais constante no Congresso”, diz líder do PTValor Econômico

O líder do PT no Senado, Wellington Dias (PI), joga a toalha: a reforma do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) fracassou e dificilmente será retomada neste governo. Atribui a dificuldade de aprovação ao “ambiente de insegurança” dos Estados com suas receitas e não a problemas na articulação política do governo, embora admita que este problema tem causado outras derrotas ao Palácio do Planalto.

No caso do ICMS, o petista diz que o projeto de resolução apresentado pelo governo para unificar as alíquotas do imposto foi “completamente desfigurado” para atender às reivindicações de Estados. E, sem sua votação, perderam sentido a medida provisória editada para compensar perdas dos Estados com o fim da guerra fiscal e o projeto de lei complementar que trata da renegociação das dívidas dos entes federados com a União.

Em entrevista ao Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, Dias fala da falta de orientação do governo às lideranças no Congresso, da necessidade de maior diálogo da presidente Dilma Rousseff com seus aliados e dos problemas causados à base por não haver ministros com autoridade para dar respostas às demandas parlamentares.

Bancário e escritor, filho de caminhoneiro e professora, esse piauiense que foi vereador, deputado estadual e federal e governador do Estado por dois mandatos consecutivos (2003 a 2010) foi um dos vencedores da queda de braço contra o governo na disputa pela mudança no critério de distribuição dos recursos do petróleo.

Agora, ele cobra decisão rápida do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a constitucionalidade da lei aprovada no Congresso que trata desse assunto e diz que, enquanto a regra estiver sub-júdice, o Plano Nacional de Educação (PNE) não pode avançar no Senado.

“Amigo e companheiro” do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Dias afirma ter sido uma “decisão pessoal” dele não disputar a Presidência da República em 2014. O ex-presidente argumenta que é um direito de Dilma e afirma que, após Fernando Henrique Cardoso e ele terem tido o direito à reeleição, seria “preconceito” tirar isso da primeira presidente mulher do país. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: Tem solução o problema de falta de articulação política do governo, que leva a tantas derrotas e tornou tão difícil a aprovação da Medida Provisória dos Portos?

Wellington Dias: Deixa eu falar do lado bom. Numa matéria complexa, polêmica, e com um ambiente difícil gerado na Câmara, com denúncias e divisão na base liderada pelo líder do segundo maior partido da base [Eduardo Cunha (RJ), do PMDB], ainda assim, essa MP foi aprovada.

Valor: Mas foi um sufoco para o governo, especialmente com uma base tão numericamente expressiva.

Dias: Houve o problema do PMDB, mas reconhecemos que a motivação do voto contrário de parlamentares de outros partidos da base foi outra. Ouvimos dos demais líderes que um parlamentar telefona para um membro da equipe do Executivo e não é atendido, que procedimentos administrativos acertados com o governo não são encaminhados e que há insatisfação sobre a execução das emendas parlamentares ao Orçamento da União. Temos dialogado com o governo, para que trate desse tema.

Valor: Falta empenho pessoal da própria presidente no diálogo com o Congresso?

Dias: Ela criou um ambiente muito positivo em reuniões com as bancadas, no fim do ano passado e começo deste ano. Agora não pode ser uma vez e pronto. Não pode ser tantas vezes que tranque a agenda da presidenta, mas não pode ser tão pouco. Precisaria pelo menos uma vez por semestre ter momentos com a presença dela. Avalio que precisa ter um conjunto de ministros, principalmente as da Casa Civil [Gleisi Hoffmann] e de Relações Institucionais [Ideli Salvatti], com mais poder de solução e presença mais constante. Uma das coisas que eu, como líder, tenho cobrado é que haja uma ou mais pessoas com condições de resolver o que for possível. Ou de responder, de forma definitiva, o que não tiver solução. Nunca a solução é de 100% nem na mesma hora.

Valor: As derrotas que o governo vem sofrendo no Congresso estão servindo de alerta ao Planalto?

Dias: As ministras Ideli e Gleisi, ao agradecer aos partidos e aos parlamentares que compreenderam a responsabilidade da aprovação da MP dos Portos, reconheceram os problemas levantados por alguns. Foram assumidos dois compromissos: em projetos estratégicos como esse promover diálogo [com a base] antes mesmo do envio da matéria. Segundo, ter presença no dia a dia do parlamento, para que problemas de simples solução possam ter respostas mais rápidas.

Valor: O governo acaba de desistir da reforma do ICMS e da proposta de mudar o indexador da dívida de Estados e municípios com a União. É mais uma derrota?

Dias: O governo encaminhou uma proposta [de uniformização das alíquotas do ICMS em 4%, para acabar com a guerra fiscal entre os Estados], se dispôs a colocar cerca de R$ 500 bilhões em dez anos, sob a forma de fundo de compensação, de fundo de desenvolvimento regional e redução de encargos das dívidas, para permitir um ambiente no pacto federativo favorável à aprovação da chamada reforma do ICMS. O objetivo era simplificar, uniformizar regras, reduzir encargos e imposto. O governo acredita que, isto acontecendo, teria uma queda na carga tributária de 3 a 3,5 meio pontos percentuais, maior segurança para investidores e redução dos custos dos nossos produtos. A ideia era ter uma alíquota só. Mas, na tramitação, passou para três, depois já falavam em quatro. Não houve entendimento e começaram a particularizar. O governo não concordava com as mudanças e isso levou a um impasse.

Valor: Voltou à estaca zero?

Dias: Voltou. Mas, nesse caso, não foi problema de articulação política. Não teve nenhum caso mais conversado do que esse. Antes de o governo enviar o projeto, houve inúmeras negociações com a própria presidenta da República. Ela chegou a sentar-se à mesa em reuniões do fórum dos governadores. O ministro Guido Mantega tratou com o Confaz, com os governadores e recebeu o setor empresarial. Havia um entendimento. Mas o que se tem hoje já é um picotado. A proposta foi completamente desfigurada ao longo do tempo. O maior problema para esta reforma é o ambiente de insegurança nas receitas das unidades da federação, impactadas pela crise mundial e com um crescimento econômico mais baixo. Essa opinião foi manifestada pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ) e eu concordo com ele. No momento os Estados estão com baixa capacidade de investimento, a receita oscilando e, ao mesmo tempo, tem a discussão da divisão dos royalties do petróleo, do Fundo de Participação dos Estados. Essas mudanças que também causam impactos.

Valor: Há chance de retomar o assunto neste governo?

Dias: O governo tentou, foi até seu limite. O ministro Guido Mantega [Fazenda] disse, em uma das audiências, que a reforma do ICMS corresponde a 70% de toda a reforma tributária no Brasil. Não foi a primeira vez que houve impasse em torno da reforma tributária. No governo Fernando Henrique Cardoso foi tentada e no governo Lula também. Desta vez, fomos até muito longe, tínhamos muita chance de ter êxito. Mas não tivemos.

Valor: O senhor citou a discussão sobre a divisão de royalties e participação especial do petróleo. A constitucionalidade da lei aprovada no Congresso, cujo texto original é de sua autoria, ainda não foi julgada pelo Supremo Tribunal Federal. Os Estados não sabem, ainda, como vai ficar a regra?

Dias: Estamos na mão do Supremo. Estão sendo feitas algumas consultas. É bom um diálogo com o Judiciário em dois caminhos: primeiro, que o Supremo decida sobre a lei. Se ela for considerada constitucional – que é o que eu espero e o que apontam os pareceres da Procuradoria-Geral da República [embora, neste, a entrada em vigor seria em 2015] e da Advocacia-Geral da União – teríamos a divisão dos recursos de abril com base na nova regra. Essa distribuição teria de ser feita em maio. Mas a distribuição prossegue com base na lei anterior ao projeto do Congresso, como se inconstitucional fosse. Há outro problema. O projeto que trata do Plano Nacional da Educação está parado, aguardando definição da fonte de recurso. O dinheiro dos royalties e da participação especial pode ser a grande fonte. Há necessidade de posicionamento do Supremo para o projeto andar. E tivemos agora leilões de exploração de petróleo em mar. Em tese, teriam de respeitar a nova regra. O Supremo tem o seu rito próprio, mas é uma emergência nacional pautar esse tema.

Valor: O senhor concorda com a decisão do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de não colocar em votação qualquer MP enviada pela Câmara com prazo de validade inferior a sete dias?

Dias: Tem sido uma prática da Câmara não apreciar as MPs dando o tempo necessário para o Senado debater. Sobre isso, o parâmetro para solução já está dado, com a aprovação, no Senado, de uma proposta de emenda constitucional que estabelece prazos para cada Casa votar. É preciso algumas mudanças na proposta, mas a Câmara tem que votá-la. Sobre a decisão do presidente do Senado, depende de um acordo de liderança. Nosso objetivo é resolver um problema entre Câmara e Senado. Vamos prejudicar o Executivo porque não chegamos a uma solução?

Valor: Há gente no PT que ainda sonha que o ex-presidente Lula seja o candidato em 2014…

Dias: Foi uma decisão pessoal dele [não disputar no próximo ano]. Ele tinha o legítimo direito de pleitear ao partido e de se apresentar para os outros partidos como um possível candidato em 2014. E essa decisão permite um bom diálogo sobre candidaturas, por exemplo, com o governador Eduardo Campos [pré-candidato do PSB]. Com a relação de amizade, afeição e conterraneidade que tem com Eduardo Campos, ele pode dizer que a presidenta Dilma, com o patamar de avaliação que tem, tem o direito de disputar a reeleição. E pode dizer: ‘Se eu abri mão, em prol de um projeto que ela encabeça, como você não pode fazer isso?’ E mais do que isso, o presidente Lula pode dizer que, se ele e Fernando Henrique Cardoso tiveram direito à reeleição, não seria um preconceito tirar esse direito da primeira mulher presidente?

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