O acidente no metrô e o caos – Por Marta Suplicy

Em artigo publicado no Brasil247, a Marta fala sobre as deficiências do transporte público de SP.

Guardadas as devidas proporções, a cena remetia a atentados terroristas em estações de metrô como o de  julho de 2005 em Londres, o cometido em março de 2004 em Madri ou o de 2003 em Moscou. Pessoas em pânico, portas que demoraram 15 minutos para abrir, energia cortada aumentando o sentimento de insegurança, janelas de emergência quebradas, gritos e correria.

Mas a cena provocada pelo trem da linha 3-Vermelha do metrô de São Paulo não foi resultado de um atentado, e sim de falha num equipamento de segurança, e isso num ramal que transporta 1,1 milhão de passageiros por dia.

As imagens correram mundo, sempre acompanhadas da informação de que o acidente ocorrera na linha que levará torcedores ao Itaquerão para o jogo de abertura da Copa de 2014.

Não fosse a perícia do jovem condutor do trem, que acionou o freio de emergência, o número de feridos seria muito maior do que as mais de 100 pessoas que foram atendidas nos hospitais públicos e, certamente, haveria muitas vítimas fatais.

O acidente vem se somar ao grande número de ocorrências graves registradas nas linhas do transporte ferroviário na cidade. Desde 2007, ano em que sete pessoas morreram nas obras da linha 4-Amarela, foram quase 100 panes nas linhas do metrô e 124 nas linhas ferroviárias da CTPM.

Algo está errado e muito precisa ser feito.

Mas, em entrevista logo após o acidente, o secretário de Transportes Metropolitanos, Jurandir Fernandes, aconselhava aos usuários do metrô a não andarem \”distraídos\” daqui para frente! E o governador Alkimin, em peregrinação política pela Zona Norte, anunciava investimentos futuros numa nova linha para atender a região!

A verdade pura e simples é que a situação do transporte público em São Paulo é de caos completo. E as autoridades responsáveis pouco têm feito.

Em 2011, dos R$ 4,5 bilhões previstos para a expansão do metrô, o governo do estado executou somente R$ 1,2 bilhão. Já na CPTM os investimentos na compra de trens foram reduzidos praticamente à metade. Os investimentos na linha vermelha encolheram 20% e, em todo  o sistema  a redução foi 19,6%.

Além da falta  de investimentos necessários na ampliação e manutenção da rede, sobram denúncias de corrupção nunca apuradas, como compras superfaturadas de trens, cancelamento da licitação da linha 5, nomeação de um presidente com condenação na justiça e por aí vai. E apesar da inércia, o governo do estado continua prometendo 200 quilômetros de linhas do metrô até 2018, apesar de nos últimos17 anos, os governos tucanos construíram meros 25 quilômetros.

Recentemente, a revista The Economist, tratando do assunto, disse que o metrô de São Paulo ainda não é digno da maior cidade da América do Sul. E não é mesmo. Com 71 quilômetros de extensão é menor que o metrô da cidade do México (200 quilômetros) e que o de Seul (400 quilômetros). Santiago do Chile, cidade com um quarto do tamanho de São Paulo, tem, como lembrou a revista, uma rede metroviária 40% maior.

O padrão europeu privilegia, por meio de subsídios, o transporte coletivo, numa  escolha que contempla preocupação com a sustentabilidade ambiental. No Brasil, lamentavelmente, tem perdurado a prioridade ao transporte individual rodoviário. A situação da mobilidade urbana, sobretudo na região metropolitana de São Paulo, evidencia o equívoco da prevalência dessa opção.

Estudos da Associação Nacional de Transportes Públicos indicam que é preciso tirar de circulação 30% dos automóveis das ruas da capital paulista. Não se trata, evidentemente, de impedir que as pessoas adquiram e usem seu carro. Trata-se de ofertar transporte público em quantidade e qualidade, de forma a inibir o uso indiscriminado e excessivo do automóvel particular.

Os números mostram que, infelizmente, estamos longe disso. Desde 1997 o Datafolha pesquisa a avaliação do sistema de transporte público de São Paulo. No último levantamento, pela primeira vez, menos da metade da população aprovou a qualidade do metrô, que tem batido recorde histórico de superlotação.

O sistema de transporte por trilhos de São Paulo passou a atender 7,1 milhões de passageiros em média por dia. Para se ter uma idéia da dimensão do problema, só o volume que aderiu  ao sistema em um ano – 1,2 milhão de pessoas – é igual ao total transportado no sistema do Rio de Janeiro.

O problema é enorme e se avoluma. E sua solução não se restringe a enfrentar os problemas do metrô, que é o melhor sistema de transporte de massa. Entretanto, nas condições ainda vigentes no Brasil, a responsabilidade primeira do prefeito é com a melhoria e desenvolvimento do transporte coletivo por ônibus e, se puder, contribuir para o incremento do metrô. Eu, infelizmente, com a pesada herança das gestões de Maluf e Pitta, tive limitados os recursos para isso.

Entretanto, fizemos cinco corredores de ônibus  na nossa gestão, que deram maior fluidez ao trânsito. Foram 67 quilômetros de corredores construídos, além da reforma dos então existentes. Outros 219 quilômetros estavam planejados e ficariam prontos até 2008.

Tudo foi abandonado. E São Paulo tem investido pouco no metrô e praticamente zero nos corredores.
 

Artigo publicado no portal Brasil 247

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