“O objetivo é quebrar os braços das organizações criminosas”, diz Pimentel

A presidenta Dilma Rousseff deverá sancionar nos próximos dias as mudanças na Lei nº 9.613 de 3 de março de 1998, que modernizam o combate ao crime de lavagem de dinheiro. Na última terça-feira (05/06), o plenário do Senado aprovou as mudanças contidas no relatório do senador José Pimentel (PT-CE) ao projeto (PLS nº 209/2003) de autoria do senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE). As alterações colocam o Brasil na chamada terceira geração da lei de combate ao crime de lavagem de dinheiro, como acontece em diversos países, por estender a abrangência do crime praticado por organizações a pessoas que emprestam seus nomes para ocultar bens. A nova lei aumenta o valor da multa que antes podia chegar a até R$ 200 mil e a a partir de agora poderá atingir até R$ 20 milhões. “O objetivo é quebrar os braços dessas organizações criminosas”, afirma o senador José Pimentel, que também é líder do Governo no Congresso. Em entrevista ao site da Liderança do PT no Senado, Pimentel explica o motivo dessa lei ser tão importante para o Brasil.

Liderança do PT no Senado – Senador José Pimentel, na terça-feira o plenário aprovou a nova lei de combate ao crime de lavagem de dinheiro. O que vem a ser um crime de lavagem de dinheiro ou crime de colarinho branco?

José Pimentel – Esses crimes são originários das organizações criminosas, do tráfico de drogas, do tráfico de armas, da contravenção do jogo do bicho e da corrupção. Portanto, a origem dos recursos dos crimes em que são enquadrados como lavagem de dinheiro são esses. Nós temos, nos últimos anos, tentado construir uma ferramenta para que o Estado possa desmontar essas organizações criminosas. No entanto, essas organizações têm inovado cada vez mais. Um exemplo melhor é a organização criminosa do contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, que estamos investigando no Congresso Nacional.

O crime de lavagem de dinheiro fica restrito ao Brasil ou aos crimes transnacionais?

José Pimentel – Nós temos legislações tão avançadas como esta que terminamos de aprovar em vários outros países, principalmente nos países mais democráticos, como é o caso dos Estados Unidos, da Itália, do México e tantos outros que já haviam se antecipado nesse processo.

A Previdência Social enfrentou um caso sério que foi protagonizado pela ex-procuradora do INSS, Jorgina de Freitas, que comandava um esquema que desviou mais de R$ 500 milhões em aposentadorias. Tivemos o caso do Banco Marka, onde o presidente do banco, Salvatore Cacciola, condenado por crime contra o sistema financeiro, fugiu para outro país. A nova lei vai combater esses tipos de crime?

José Pimentel – O caso Jorgina de Freitas aconteceu no final dos anos 80 e início dos anos 90 (Jorgina foi condenada em 1992 e solta depois de cumprir pena de 14 anos). Portanto, esse processo foi anterior à primeira legislação que é de 1998. Já o caso do Banco Marka, seu controlador, Salvatore Cacciola, foi preso pela existência da primeira legislação de lavagem de dinheiro. Exatamente por isso ele tinha sido preso aqui no Brasil. Mas aí um ministro do Supremo Tribunal Federal (o ministro Marco Aurélio Mello), acolhendo um pedido de habeas corpus, concedeu sua licença numa sexta-feira e naquele mesmo final de semana fugiu do Brasil . Quando foi negado seu instrumento legal ele já estava fora do Brasil. Então, pedimos apoio da Interpol  e, em seguida,  foi preso na Europa e cumpriu dois terços de sua pena no Brasil, no presídio de Bangu, no Rio de Janeiro.

Quer dizer que nos últimos anos o crime organizado também teve ampliado seu raio de atuação? Por isso é que a lei de combate à lavagem de dinheiro é modernizadora?

José Pimentel – Essa legislação de 1998 e a criação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) no mesmo ano foi um processo bastante avançado para combater as organizações criminosas e também a lavagem de dinheiro. No entanto, ela era insuficiente porque os chamados crimes antecedentes, que são aqueles praticados pelos laranjas e pelos testas-de-ferro, aqueles que colaboram para a organização criminosa, não tinham seus bens confiscados e nem tampouco vendidos. Exatamente por isso essa nova legislação vai ao coração da organização criminosa, porque permite o confisco do patrimônio tanto daqueles que estão diretamente vinculados a ela quanto os testas-de-ferro e os laranjas. A nova lei permite que o Poder Judiciário, de imediado, poderá vender todo o patrimônio e com isso desarticular integralmente essas organizações. A legislação de 1998 só permitia a venda do patrimônio após o trânsito e o julgado de um processo que às vezes se arrasta por oito, dez anos, e nesse período a organização criminosa terminava se beneficiando, se realimentando. Agora não. Com essa nova legislação você confisca previamente todo esse patrimônio.

A Polícia Federal nos últimos anos fez inúmeras apreensões de veículos, aeronaves e obras de arte, mas essas apreensões demandam gastos do governo para acomodação desses bens. A partir de agora esses bens poderão ser leiloados imediatamente?

José Pimentel – Quem determina a feitura do leilão é o juiz da causa. O processo continua com a busca e a apreensão. O Brasil tem hoje 68 aeronaves retidas de organizações criminosas; algo em torno de 1.300 embarcações; mais de 36 mil veículos recolhidos aos pátios dos Detrans ou da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária; mais de dois mil imóveis urbanos e rurais, além de joias, computadores e uma série de outros equipamentos. Agora, com a nova legislação, o juiz da causa, de imediato, pode vender todo esse patrimônio, evitando assim a deterioração. Esse dinheiro ficará depositado à disposição da Justiça brasileira. Ao término da ação, se o réu for condenado, os recursos vão para os cofres públicos. Se algum deles for absolvido, os bens daquele que foi absolvido a ele será devolvido seu depósito.

A nova lei prevê um dispositivo sobre os crimes antecedentes. Quer dizer que uma pessoa que participa indiretamente de uma organização criminosa também será incriminada?

José Pimentel – Esse é um dos grandes objetivos desta legislação, que é ferir de morte a organização criminosa. A partir de 1998, aquele que praticava esses crimes normalmente não colocava em seu nome o patrimônio. Um exemplo concreto: já quebramos o sigilo bancário e fiscal do senhor Carlos Cachoeira e no seu nome quase que não há patrimônio porque ele utilizava laranjas e terceiros. O objetivo dessa legislação é exatamente este, chegar a todos os braços da organização. No caso concreto da organização do senhor Carlos Cachoeira, ele tem uma atuação no braço criminoso e tem outra atuação no braço formal, criando empresas. E isso a legislação de 1998 só alcançaria na parte das ações tidas como criminosas. Na mesma maneira, o senhor Cachoeira montou um conjunto de atores sociais para dar cobertura às suas ações, envolvendo Câmara de Vereadores, deputados estaduais, deputados federal e senador; envolvendo agendes do aparelho judicial brasileiro, agentes da segurança pública e, inclusive, delegados da Polícia Federal. Portanto, todos esses que de uma maneira direta ou indireta contribuem com a organização criminosa, após a sanção dessa lei pela presidenta Dilma, também terão seus bens confiscados.

Quer dizer que o projeto segue na semana que vem para sanção presidencial e já poderá surtir efeitos no Caso Cachoeira?

José Pimentel – Terminamos a votação do projeto no plenário do Senado Federal. Agora será encaminhado para sanção presidencial e a Presidência da República tem até quinze dias para sancioná-lo. A partir daí o Poder Judiciário poderá utilizar essa nova ferramenta jurídica para ajudar no combate ao crime organizado. No estado democrático de direito é o Poder Judiciário que fará a aplicação da Lei.

Marcello Antunes

Confira os sites

www.coaf.fazenda.gov.br

www.interpol.int

Confira discurso do senador José Pimentel (PT-CE) feito na tribuna do Senado na quarta-feira (06/06), um dia após o projeto que moderniza a Lei de Combate à Lavagem de Dinheiro ser aprovado.

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