Baere: não se pode traçar uma linha no tempo e fazer um corte, porque as metas são anuaisO ex-consultor jurídico do Ministério do Planejamento, Walter Baere de Araújo Filho, servidor de carreira de advogado da Advocacia Geral da União (AGU), afirmou nesta quarta-feira (15), na comissão do impeachment, que o orçamento da União é dinâmico e não estático. Isso quer dizer que, quando há uma meta fiscal de determinado valor, para o ano inteiro, não significa nada olhar, botar a lupa só num mês específico e dizer que um decreto de abertura de crédito desrespeito a meta fiscal e por isso houve crime de responsabilidade. Não é assim que funciona. O que vale é a meta anual, de acordo com a legislação.
“Não podemos traçar uma linha no tempo e fazer um corte. As metas são anuais, sob pena de uma interpretação errada de olhar só um mês, para toda vez que se editar decreto de crédito suplementar. Todos os mecanismos de controle de execução financeira passam pela Secretaria de Orçamento Federal. Há relatórios bimestrais. Se notar que a gestão financeira ultrapassa a meta, então é feito um contingenciamento do gasto, conforme determina a Lei de Responsabilidade Fiscal”, explicou.
Testemunha é uma coisa, informante é outra
Walter Baere, antes de iniciar sua participação, entregou uma declaração em que assinou na condição de informante do juízo, que serve para basear tanto a acusação quanto a defesa. Fez isso porque havia sido indicado como testemunha pela defesa, mas assim decidiu por ter participado na condição de advogado da AGU da defesa do governo Dilma quando o TCU apresentou 13 questionamentos sobre a execução orçamentária relativa a 2014. Esses questionamentos foram feitos em 2015.
A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), por considerar relevante a postura de Walter Baere, de pedir a mudança de condição de testemunha para informante da comissão, deveria ter sido adotada pelo procurador junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Júlio Marcelo, porque apresentou-se como testemunha da acusação, mesmo sendo um servidor público como Baere. “Vamos entrar com recurso para que o depoimento de Júlio Marcelo seja considerado não como testemunha, mas como informante”.
Faz sentido esse pedido já que o procurador Júlio Marcelo e não o conjunto dos ministros do TCU decidiu ainda sobre as contas de 2015, embora esse procurador tenha declarado na comissão que o TCU não é a “babá” do governo para avisar-lhe sobre se um decreto estava ou não de acordo com as metas fiscais.
Para a senadora Gleisi Hoffmann isso é sério. Mesmo que a comissão cuja maioria deseja o afastamento de Dilma Rousseff sem discutir o mérito da acusação, a Comissão Mista de Orçamento do Congresso fez diversas audiências públicas para discutir as contas fiscais do governo e nenhum alerta foi feito pelos parlamentares. Gleisi perguntou a Walter Baere se ele havia recebido alerta.
A resposta dele surpreendeu: “O Congresso poderia ter alertado se percebesse descasamento entre as receitas e as despesas orçamentárias. Não chegou nenhum alerta”, disse ele.
É por essa razão que Gleisi Hoffmann questiona qual é a moral do Congresso para dizer que as metas foram desrespeitadas por Dilma. “Em nenhum momento o governo recebeu alerta. A Lei de Responsabilidade Fiscal diz que cabe ao Congresso analisar as contas a cada quatro meses e não consignou preocupação. Nem mesmo o TCU”, apontou. Como órgão auxiliar do Congresso Nacional, caberia ao TCU essa manifestação, oficial, ao contrário do que prega o procurador Júlio Marcelo de que o TCU não é a “babá” do governo.
Papelzinho
Na tentativa de criar constrangimento ao advogado da AGU, o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), apoiador incondicional do golpe parlamentar, disse que tinha em mãos um documento de Júlio Marcelo que identificou o dolo da presidenta Dilma. Deselegante que é, passou a acusar os senadores do PT dizendo que o “show” tinha acabado. Mas Caiado caiu do cavalo com a resposta de Walter Baere.
“Primeiro agradeço a pergunta. Entendo que é oportunidade republicana de esclarecermos os fatos. Não estou em mãos com os documentos que mostrou à distância. Ainda que tivesse qualquer provocação do Ministério Público junto ao TCU, a posição não é do plenário do tribunal. Para ser uma manifestação precisaria ser na forma de um acórdão aprovado pelos ministros do TCU”, explicou.
Ele acrescentou que “faz parte da vida republicana” que o tribunal de contas suscite dúvidas sobre a execução orçamentária, e faz parte o Poder Executivo dar a resposta. Sobre os treze questionamentos, por exemplo, o TCU sequer tomou decisão ainda. O mesmo vale para as contas de 2015 que estão em discussão na comissão do impeachment.
Por isso que o senador Lindberhg Farias defende a suspensão dos trabalhos da comissão para que o TCU vote o parecer sobre as contas de 2015 e encaminhe para o Congresso Nacional para votação, se aprova ou não as contas de Dilma. “É uma loucura, uma incoerência o que estamos fazendo. O que está em análise são decretos de 2015 que sequer receberam parecer do próprio TCU”, afirmou.
Marcello Antunes