Operação Zelotes desvia foco dos sonegadores para tentar atingir Lula

Operação Zelotes desvia foco dos sonegadores para tentar atingir Lula

OPERAÇÃO ZELOTES a incrível farsa de como a investigação sobre fraudes no CARF virou investigação sobre aprovação de medidas provisórias para tentar atingir Lula.

 

Por Tânia Maria Oliveira, assessora jurídica da Bancada do PT no Senado

No último final de semana o jornal O Globo trouxe o “erramos” sobre a matéria de capa do dia 11 de outubro, quase um mês antes. A retificação do jornal admite que Fernando Baiano não citara o nome do filho e de nenhum outro familiar do ex-presidente Lula na delação premiada na operação Lava Jato. O “equívoco”, contudo, já havia causado diversos prejuízos e gerado ações graves e juridicamente questionáveis, além da forte repercussão com o objetivo de atingir a imagem de Lula e as tentativas de convocação de Fábio Luís Lula da Silva para depor em CPI e impulso na investigação conduzida pela Polícia Federal.

A chamada “Operação Zelotes” teve início no dia 26 de março de 2015. O esquema apurado, de acordo com a Polícia Federal, consistia em pagamento de propina para integrantes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – Carf, órgão colegiado vinculado ao Ministério da Fazenda, com o objetivo de anular ou reduzir débitos tributários de empresas com a Receita Federal. Segundo as investigações o esquema teria fraudado até R$ 19 bilhões da Receita. As investigações apontam que conselheiros suspeitos de integrar o esquema criminoso passavam informações privilegiadas de dentro do Carf para escritórios de assessoria, consultoria ou advocacia. Esses escritórios, de acordo com os investigadores, procuravam empresas multadas pela Receita Federal e prometiam controlar o resultado dos julgamentos de recursos.

A Polícia Federal aponta que, para isso, além de promover tráfico de influência, o grupo corrompia conselheiros envolvidos com o julgamento dessas multas e manipulava o andamento dos processos com a venda de pedidos de vista ou alteração da pauta de julgamentos. Muitas dessas consultorias, ainda conforme as investigações, tinham como sócios conselheiros e ex-conselheiros do Carf.  Em troca dessas facilidades, empresas multadas pagavam propina. Segundo os investigadores, boa parte dos supostos honorários pagos pelas empresas a título de consultoria era, na verdade, repasse de propina.

Até esse ponto, nenhuma novidade no procedimento. Os órgãos de justiça agiam dentro do que é considerado corriqueiro em investigações: ouviam envolvidos, expediam mandados de busca, produzem hipóteses para definir linhas.

Contudo, a partir do dia 26 de outubro a Operação Zelotes deflagrou uma mais-que-estranha “nova etapa”, que se desvincula das decisões do Carf para focar na edição de medidas provisórias. Segundo a Polícia Federal, um consórcio de empresas, além de manipular julgamentos dentro do Carf, negociava a inclusão de incentivos fiscais em medidas provisórias para favorecer empresas do setor automobilístico. Ou seja, diferente de verificar os desvios da decisão de um colegiado com caráter administrativo, com beneficamente direto a empresas que buscam rever suas dívidas fiscais, objeto central da devassa em curso, cuja objetividade é evidente, os órgãos do sistema de justiça resolveram desviar o foco da investigação para verificar o lobby de empresas na edição de medidas provisórias.

Medidas provisórias, interessante explicar, são normas editadas pelo presidente da República em caso de relevância e urgência, com força de lei, sendo, obrigatoriamente, aprovadas nas duas Casas do Congresso Nacional.  Lobby, segundo os estudiosos da ciência política,  é o nome que se dá à atividade de pressão de grupos organizados com o objetivo de interferir diretamente nas decisões do poder público, em especial do poder legislativo, em favor de causas ou objetivos defendidos pelos grupos. Apesar de frequentemente ser vinculado a uma conotação negativa, o lobby, por definição, não está relacionado ao uso de meios ilícitos para o exercício de influência sobre um ator político. A propósito, existem no Congresso Nacional cerca dez propostas para regulamentação do lobby, de que é melhor exemplo o (PLS 203/89), do senador Marco Maciel (DEM-PE), já aprovado pelo Senado e enviado à Câmara dos Deputados.

O “estranhamento” com relação à nova fase da Operação Zelotes desfez-se no mesmo dia, quando ficou evidente que havia uma intenção claramente política nos procedimentos adotados. A juíza substituta da 10ª Vara Célia Regina Orly Bernardes determinou prisões de lobistas e a busca na empresa do filho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, além de sua intimação para depor.

São de diversas ordens os questionamentos que podem ser feitos. Nenhum deles no sentido de que alguém não pode ser investigado. Todos podem, havendo elementos ou indícios de envolvimento em ilícitos. Nada obstante, a empresa de Luís Cláudio Lula da Silva, além de muito pequena, não possui e nunca possuiu processos no Carf.  Aliás, as empresas envolvidas com os processos do Carf são grandes conglomerados como RBS (maior afiliada da Rede Globo), Gerdau, Votorantim, Ford, Mitsubishi, BRF (antiga Brasil Foods), Camargo Corrêa, e os bancos Santander, Bradesco, Safra, BankBoston, Pactual, Brascan e Opportunity.  A “acusação” ao filho de Lula é de que sua empresa tenha feito lobby para a aprovação de uma medida provisória, no Congresso, que autorizou a concessão de incentivos fiscais para a instalação de empresas do setor automotivo no Nordeste e Centro-Oeste do país. A Medida Provisória em questão recebeu o número 471 e foi editada no ano de 2009. A empresa foi constituída no ano de 2011, quando a Presidente da República já era Dilma Rousseff.

Na decisão sobre as prisões e buscas a juíza fundamentou:

“Está-se diante de indícios veementes de compra de legislação, especificamente de prática criminosa que levou os envolvidos a obterem ‘êxito na edição de mais uma medida provisória ‘sob encomenda’, mas dessa vez não para obter algum tipo de incentivo benefício direto do governo, mas com o sórdido objetivo específico de criar um fato novo que viria a fulminar de uma vez por todas as discussões dentro do Carf acerca de créditos tributários constituídos em razão de cumulação de incentivos fiscais envolvendo empresas do setor automobilístico, a saber a MMC e a Ford, exonerando créditos tributários que somados chegariam ao montante maior que R$ 2 bilhões de reais”,

 

O problema é que chamar de “compra de legislação” uma norma que passou pela aprovação das duas casas legislativas parece um caminho investigativo que não prima pela seriedade, ou que parte de pressupostos que não estão esclarecidos, como por exemplo: qual o papel dos deputados federais e senadores nesse suposto “esquema de compra de MPs”? Ou será que a magistrada desconhece que medidas provisórias podem ser – como já o foram em várias ocasiões- rejeitadas?

A decisão determina, ainda, a revista corporal em pessoas que estejam no local, bem como que os familiares do alvo da operação não tivessem acesso à acusação visando preservar o “sigilo das investigações”.  De fato, os familiares tiveram acesso pela mídia minutos após seu despacho.

 

O que os fatos e circunstâncias mostram como bastante provável é que a guinada na operação com o afastamento de seu objeto primeiro condutor da investigação tem foco certo: atingir o ex-presidente da República, por meio de pessoas de seu governo ou de sua família. E nesse diapasão não é pouco saber que a juíza que determinou busca e apreensão na empresa de Lulinha e o intimou para depor é irmã do prefeito de Blumenal (SC) do PSDB. Mesmo tendo conhecimento que a postura que ela sempre assumira juridicamente em questões sociais não coincidem com o que prega o PSDB, a ação na Zelotes não guarda qualquer cuidado ou justificativa fora da política. Para coincidência estão faltando argumentos.

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