Nas últimas semanas, de acordo com matérias publicadas pela imprensa, líderes da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) vêm pressionando pela aprovação de projetos do chamado Pacote da Destruição, em análise no Senado. Em razão do momento eleitoral, estão marcados períodos de esforço concentrado na Casa, momento em que haverá votações. A próxima semana de esforço é a última de agosto, a partir do dia 29. E as entidades que lutam por alimentos saudáveis à mesa, saúde para a população e menos veneno no meio ambiente estão alertas. Assim como senadores de oposição, que articulam a resistência a essa pauta no Congresso.
A proposta mais visada pelo grupo é o PL do Veneno, que revoga a atual Lei dos Agrotóxicos para abrir a porteira a produtos proibidos na maioria dos países. Como lembra Karen Friderich, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), 81% dos agrotóxicos permitidos no Brasil já são proibidos em países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Mas o PL do Veneno (PL 1459/2022) promete piorar a situação. Ele transfere para o Ministério da Agricultura (MAPA) o papel de órgãos ligados à Saúde (Anvisa) e ao Meio Ambiente (Ibama), responsáveis pela análise do potencial de risco de novas patentes de agrotóxicos no país. A proposta ainda força a aprovação dessas substâncias antes de estudos conclusivos, ao decretar que, passados 30 dias para análise de pedido para uso em pesquisa ou de dois anos para o caso de aplicação de produtos novos, o agrotóxico ganha registro provisório, mesmo sem a conclusão dos técnicos.
Pressão no Senado
Após pressão da sociedade e senadores de oposição, ficou acertado que haverá novo debate sobre o projeto, desta vez com a presença do relator especial das Nações Unidas, Marcos Orellana. O órgão internacional divulgou pesquisa, dois meses atrás, sobre os riscos do uso dos venenos defendidos pela FPA, e alertou que a adoção de uma lei como essa “marcará um retrocesso monumental para os direitos humanos no país”.
No Senado, há um esforço, encabeçado pela bancada do PT, para que o projeto, que aguarda votação na Comissão de Agricultura (CRA), seja também discutido nas Comissões de Assuntos Sociais (CAS) e de Direitos Humanos (CDH). Outro colegiado, o de Meio Ambiente (CMA), que deveria se manifestar oficialmente sobre a matéria, mas ficou de fora do rol de tramitação por decisão da Presidência da Casa, promoveu audiências públicas nas quais o projeto foi amplamente condenado por especialistas.
O presidente da CMA, senador Jaques Wagner (PT-BA), aproveitou o Dia Internacional de Combate à Poluição, 14 de agosto, para renovar o apelo contra a aprovação indiscriminada de agrotóxicos no Brasil.
“Dados do Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água apontam a presença de 27 agrotóxicos na água para consumo humano em mais de 2 mil cidades do Brasil. Deste total, 16 substâncias são altamente tóxicas e 11 estão associadas ao desenvolvimento de doenças crônicas”, lembrou o senador, que também pediu mais investimentos em ciência no país.
“Seu Voto Sem Veneno”
Já a Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, que reúne dezenas de entidades, lançou no dia 11 de agosto um manifesto com subsídios para o debate eleitoral. A partir do mote “Seu Voto Sem Veneno”, as organizações buscam o compromisso de candidatos sobre esse tema, além de despertar o debate na sociedade. O documento joga luz em sete pontos: soberania alimentar; mudanças climáticas; água; pulverização aérea; isenção de impostos; proibição de agrotóxicos banidos; e transgênicos. E conclama o Brasil a mudar o rumo.
“Nós, da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, lutamos pela construção de um projeto de país soberano que responda adequadamente aos desafios sociais deste momento histórico. Queremos virar a mesa dos rumos tóxicos que tomam nosso país e eleger representantes que lutem conosco pela diversidade da vida”, pregam as entidades no manifesto.
Modelo em xeque
Na contramão, a bancada ruralista tem pressa em votar esse e outros projetos que compõem o Pacote da Destruição. São os casos dos PLs da Grilagem (PLs 2633/2020 e 510/2021), que legalizam o roubo de terras públicas, estimulam desmatamento, novas invasões de grileiros e conflitos no campo, e a Lei Geral do Licenciamento Ambiental (PL 2.159/2021), que na prática retira do Estado o poder de analisar a viabilidade de empreendimentos em áreas ambientais sensíveis. O Pacote da Destruição se completa com outros dois projetos em análise na Câmara, que tentam retirar direitos indígenas e permitir mineração em seus territórios.
Aprovar em definitivo no Congresso esse conjunto de projetos é a grande meta ruralista neste segundo semestre, propagandeia a página eletrônica da FPA. Em nome do planeta, que precisa de mais produção agrícola, alegam seus editores. O material não aponta como motivação de tanta pressa o avanço do processo eleitoral que pode significar a derrota de um projeto que combina o desmonte do Estado com políticas de destruição do meio ambiente e das garantias sociais.