Os líderes partidários, em reunião com a presidência do Senado realizada na tarde desta quarta-feira (11), definiram a data de 26 de setembro para retomar a discussão da reforma do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) que tem por objetivo acabar com a guerra fiscal existente hoje entre os estados. “O importante é que o tema voltou para a pauta”, disse o senador petista Walter Pinheiro (PT-BA) que, junto com o senador Delcídio do Amaral (PT-MS), articulam uma solução para evitar um caos tributário no País. O presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), senador Lindbergh Farias (PT-RJ), também informou hoje que uma nova rodada de conversas acontecerá com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, para mostrar o interesse do Senado em levar adiante a reforma do ICMS que faz parte do pacote de medidas para o novo pacto federativo brasileiro.
Lindbergh, por exemplo, lembra que a CAE deu um passo importante para a reforma do ICMS quando aprovou o Projeto de Resolução do Senado (PRS nº 1/2013 estabelecendo que as alíquotas nas operações interestaduais seriam reduzidas gradualmente de 12% para 4%, no período entre 2014 e 2021. Já nas operações realizadas nas regiões Sul e Sudeste, com a mercadoria destinada às regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, a atual alíquota de 7% cairia para 4% no período entre
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Lindbergh observa que, pelo menos esse projeto de resolução está pronto para ir ao plenário e entrar em vigor, já que cabe ao Senado tratar de matérias relacionadas ao ICMS. Mas durante a tramitação que começou em 4 de fevereiro deste ano e votada na CAE dia 8 de maio, havia uma pré-condição para essa resolução ser votada, ou seja, seu texto deveria fazer uma menção ao apoio financeiro da União para compensar eventuais perdas de arrecadação e, ao mesmo tempo, dispor sobre a criação de um fundo de desenvolvimento regional suficiente para acabar com a guerra fiscal entre os estados.
Essa chamada guerra fiscal consiste em um estado conceder a uma empresa a isenção do pagamento do ICMS para a instalação de uma unidade produtiva na sua região. Acontece, porém, que o procedimento para essa concessão depende da aprovação unânime dos integrantes do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), um órgão integrante da estrutura do Ministério da Fazenda. Nesse conselho todos os secretários estaduais de Fazenda devem aprovar de forma unânime a proposta de convênio feita por um estado a uma empresa. Se apenas um representante se opor, o incentivo não deve prosperar.
No entanto, essa guerra ganhou contornos quase insustentáveis nos últimos anos, porque mesmo o Confaz não aprovando um convênio, um estado decidia isoladamente oferecer benefícios fiscais a empresas com base no ICMS como forma de atrair investimentos produtivos. O estado que se sentiu prejudicado por outro, por exemplo, recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF), invocando a Lei Complementar nº 24/1975 que determina o princípio da unanimidade no âmbito de votações do Confaz. Há quase dois anos o Supremo considerou inconstitucionais todos os convênios firmados isoladamente pelos estados.
Em alguns deles, como São Paulo, também começaram a fazer o que se chama no mundo tributário de “glosa” dos créditos que deveriam ser remetidos ao estado que fez um convênio sem a unanimidade do Confaz. Uma grande montadora de veículos que recebeu os incentivos agora considerados ilegais já está provisionando em seu balanço contábil eventual perda que poderá superar R$ 1 bilhão, caso o Supremo publique uma súmula vinculante que é uma espécie de norma para ser seguida automaticamente em relação a esses convênios. Na prática, milhares de empresas estariam obrigadas a recolher os impostos do ICMS que foram concedidos sem a unanimidade do Confaz. “Essa situação é preocupante. Temos que resolver já antes que apareça um cadáver, porque podemos ter um caos”, alerta Delcídio do Amaral.
O Senador tem mantido diversas |
O PRS nº 1/2013 também definiu em seu artigo 3º que para convalidar, ou seja, tornar válidos esses convênios passados, o quórum exigido seria de três quintos, como forma de resolver essa questão e evitar os efeitos de uma súmula vinculante. Em meados de junho, os secretários de Fazenda, reunidos no Confaz, decidiram aprovar essa convalidação, como forma de demonstrar ao Senado e ao governo a disposição de pôr fim a inúmeras disputas judiciais em curso entre os estados, onde um cobra o imposto que deveria ser recolhido ao outro.
O Governo Federal, por sua vez, nesse período, também demonstrou aos estados sua disposição de mudar o indexador das dívidas renegociadas com base na Lei 9.496 de 1997. Dessa data até hoje, as dívidas são corrigidas pelo Índice de Preço ao Consumidor – Disponibilidade Interna (IGP-DI). Dependendo do contrato, além desse indexador, estados e municípios que aderiram pagam uma correção anual que varia de 6% a 9%, como é o caso da prefeitura de São Paulo. Em alguns estados, a dívida renegociada era de R$ 2 bilhões. Foram pagos R$ 5 bilhões e, por conta da disparidade do IGP-DI e da correção, a dívida hoje chega a R$ 10 bilhões.
Para mudar esse cenário que prejudica as contas estaduais e municipais, comprimindo o espaço fiscal destinado a investimentos, o governo encaminhou o Projeto de Lei Complementar (PLP nº 238/2013) que está tramitando na Câmara dos Deputados. O artigo 4º desse projeto prevê que os juros serão calculados e debitados mensalmente à taxa mínima de 4% ao ano. A atualização monetária terá por base a variação do Índice de Preços ao Consumidor Ampliado (IPCA) e os encargos serão calculados, se excederem os juros e a atualização monetária, tendo por base o juro da Taxa Selic. Essa sistemática tem por objetivo garantir previsibilidade nos encargos que serão pagos por estados e municípios.
Todos os senadores, governadores e prefeitos concordam que essa sinalização é fundamental para aliviar os caixas dos estados e dos municípios, já que essa dívida é cobrada até o percentual de 12% da receita corrente líquida dos estados. Só que em alguns momentos, quando a inflação ficou pressionada, a variação do IGP-DI e a correção de 6% a 9% ao ano fizeram o comprometimento da receita corrente líquida superar 15%.
Senador Pinheiro cobrou na presidência da |
A ideia colocada nesse debate é gerar mais caixa para investimento aos estados e municípíos, “porque todos estão literalmente sufocados”, disse o senador Walter Pinheiro. E nesse conjunto de ações da reforma do ICMS, com a redução das alíquotas e a mudança no indexador das dívidas estaduais e municipais, é uma pré-condição que o governo edite nova Medida Provisória ou Lei Complementar criando dois fundos: um para compensar perdas com a redução das alíquotas do ICMS e, outro, destinado ao desenvolvimento regional. “Fui relator da MP 599 que criava esses dois instrumentos, fundamentais para dar segurança aos estados e municípios”, afirmou Pinheiro. Mas como a reforma do ICMS atrasou e não teve acordo, a MP perdeu sua validade.
Nesse pacote que tem por objetivo acabar com a guerra fiscal e garantir maior espaço fiscal para os estados investirem os recursos de suas receitas correntes em projetos de infraestrutura e mobilidade urbana, por exemplo, os parlamentares defendem a aprovação da PEC 197/2012, já aprovada no Senado e que está na Câmara, estabelecendo a cobrança do ICMS nas operações entre os estados por meio do comércio eletrônico. A PEC, de autoria do senador Delcídio do Amaral, prevê que os estados que recebem a mercadoria comprada pelo comércio eletrônico tenham direito a um percentual do ICMS, já que hoje o recolhimento fica exclusivamente nos estados onde estão localizados os centros de distribuição, em geral
Para os senadores Lindbergh Farias, Walter Pinheiro e Delcídio do Amaral, o Senado, que já conseguiu enfrentar a polêmica decisão de unificar as alíquotas do ICMS nas operações com mercadorias importadas, que estavam prejudicando a indústria nacional na chamada guerra dos portos, não pode perder a chance de ainda neste semestre aprovar esses projetos que fazem parte do novo pacto federativo. E a sinalização é que chegou a hora de enfrentar, com negociação, quem tem posicionamento contrário. O estado de São Paulo, por exemplo, concorda com a redução das alíquotas, mas bateu de frente com o estado de Amazonas que quer continuar tendo uma alíquota de 12% quando remete mercadorias para as regiões Sul e Sudeste.
No Confaz, Amazonas chegou a sinalizar a disposição de reduzir essa alíquota para 10%, quando no Senado a proposta era de uma alíquota de 9%. Só que, considerando a possibilidade de enfraquecer ou perder empresas de seu pólo de informática no interior de São Paulo para a Zona Franca de Manaus, esse estado começou, então, a reivindicar uma alíquota de 7% para seus produtos. Com essas diferenças expostas a cada dia, a reforma do ICMS empacou. A retomada da discussão ocorre justamente num momento em que os estados e municípios, com o pires nas mãos, percebem que o pior para suas contas é manter a situação como está, de um estado brigando com o outro, onde no final todos acabam perdendo.
Marcello Antunes
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