Pinheirinho: Suplicy relata avanço de investigações sobre abuso da PM-SP

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) – Sr. Presidente, Senador Waldemir Moka, Srs. Senadores, agradeço ao meu líder, Senador Walter Pinheiro, pela possibilidade de agora falar.

Saiu hoje um artigo do Desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo e professor de Direito Civil de 1973, José Osório de Azevedo Júnior, de 78 anos, que, do alto de sua experiência, conhecimento jurídico – e eu o conheço desde a minha adolescência, fui sempre um admirador de seu trabalho, sempre muito sério, e o conheço, inclusive, porque foi advogado de meu pai, Paulo Cochrane Suplicy, em inúmeras situações –, no artigo Ainda o Pinheirinho, coloca reflexões muito bem postas. E eu gostaria de lê-las aqui.

Diz José Osório de Azevedo Júnior:

“Decisão judicial não se discute, cumpre-se? Apenas em casos corriqueiros, mas não quando pessoas indefesas são atingidas; o direito não é monolítico

Os fatos são conhecidos: uma decisão judicial de reintegração de posse sobre uma favela. A ocupação começou em 2004, por pessoas

A ocupação começou em 2004, por pessoas necessitadas de moradia.

Segundo a Folha, a proprietária obteve reintegração liminar em 2004. Durante um imbróglio processual, os ocupantes permaneceram. Em 2011, uma nova decisão ordena a reintegração. Foi essa ordem que o Poder Executivo cumpriu no dia 22 de janeiro, com aparato policial, caminhões e máquinas pesadas inclusive tratores para realizar a demolição daquela que era praticamente uma pequena cidade.

A ordem era, porém, inexequível, pois, em sete anos, a situação concreta do imóvel e sua qualificação jurídica mudaram radicalmente.

O que era um imóvel rurai se tornou um bairro urbano. Foi estabelecida uma favela com vida estável, no seu desconforto, Dir-se-á que a execução da medida mostra que a ordem era exequível. Na verdade, não houve mortes porque ali estava uma população pacífica, pobre e indefesa.

Ninguém duvida da exequibilidade física da ordem judicial, pois todos sabem que soldados e tratores têm força física suficiente para “limpar” qualquer terreno.

O grande e imperdoável erro do Judiciário e do Executivo foi prestigiar um direito menor do que aqueles que foram atropelados no cumprimento da ordem.

Os direitos dos credores da massa falida proprietária são meros direitos patrimoniais. Eles têm fundamento em uma íei também menor, uma lei ordinária, cuja aplicação não pode contrariar preceitos expressos na Constituição.

O principal deles está inscrito logo no art. 1°, III, que indica a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República. Esse valor permeia toda a ordem jurídica e obriga a todos os cidadãos, inclusive os chefes de Poderes.

As imagens mostram a agressão violenta à dignidade daquelas pessoas. Outro princípio constitucional foi afrontado: o da função social da propriedade. É verdade que a Constituição garante o direito de propriedade. Mas toda vez que o faz, estabelece a restrição: a propriedade deve cumprir sua função social.

Reitero, a propriedade deve cumprir a sua função social.

Pois bem, a área ociosa ficou ociosa por quatorze anos, sem cumprir função social alguma. O princípio constitucional da função social da propriedade também obriga não só os particulares, mas também todos os poderes e os seus dirigentes. O próprio Tribunal de Justiça de São Paulo já consagrou esse princípio inúmeras vezes, inclusive em casos semelhantes, em uma tentativa de recuperação de posse de uma favela. O tribunal considerou que a retomada física do imóvel favelado é inviável, pois implica uma operação cirúrgica, sem anestesia, incompatível com a natureza da ordem jurídica, que é inseparável da ordem social. Por isso, impediu a retomada. O proprietário não teve êxito no Superior Tribunal de Justiça, conforme registra Recurso Especial nº75.659/SP, São Paulo.

Tudo isso é dito, porque o cidadão comum e o estudante de Direito precisam saber que o Direito brasileiro não é monolítico. Não é só isso que esse lamentável episódio mostrou. Julgamento e execução foram contrários ao rumo da legislação dos julgados e da ciência do Direito.

Será verdade que uma decisão tem que ser cumprida sempre? Só é verdade para os casos corriqueiros, não para os casos gravíssimos que vão atingir diretamente muitas pessoas indefesas.

Estranha-se que o Governador tenha usado o conhecido chavão segundo o qual decisão judicial não se discute, cumpre-se. Mesmo em casos menos graves, os chefes de Executivo estão habituados a descumprir decisões judiciais. Nas questões dos precatórios, por exemplo, são milhares de decisões judiciais definitivas não cumpridas”.

Gostaria, aqui, Senadora Ana Amélia, Senador Anibal Diniz, de expressar um sentimento diante de algumas críticas que alguns fizeram em decorrência de eu, aqui, ter feito um pronunciamento, sexta-feira última, em que revelei que tive a oportunidade de testemunhar pessoalmente ao ouvir o depoimento de pessoas que foram abusivamente tratadas por policiais militares, alguns membros da Polícia Militar. Eu, de maneira alguma, quis, aqui, ofender a corporação da Polícia Militar do Estado de São Paulo ou do Brasil,

Uma vez que tenho o maior respeito por todos os policiais militares, junto aos quais sempre interagi com todo o respeito, dignidade e diálogo, em toda e qualquer situação, por aonde tenho andado na minha cidade de São Paulo ou qualquer outra.

No entanto, quando ouvi duas moças, Senadora Ana Amélia, uma de 26 anos e outra de 20 anos, relatarem o que se passou entre 11h da noite do dia 22, dia da reintegração de posse, até as 4h da manhã, ali no bairro Campo dos Alemães, que fica contíguo ao do Pinheirinho, onde as ações da PM naquela operação abrangeram não só o Pinheirinho, mas as áreas contíguas, até porque a população, retirada do Pinheirinho foi exatamente aos bairros contíguos, dentre os quais e principalmente ao Campo dos Alemães, onde estava situado o abrigo maior, então, foi ali que se sucedeu esse episódio. Felizmente, por minha solicitação, ao Governo Geraldo Alckmin, ao Ministro da justiça e à Ministra dos Direitos Humanos, passou a ser observada; inclusive por minha solicitação pessoal ao Comandante da Polícia Militar, Álvaro Camilo, que atendeu às minhas observações.

Na semana passada, eu acompanhei o depoimento dessas moças, junto ao Promotor de Justiça, da Vara da Infância e da Adolescência. Na segunda–feira acompanhei o Promotor de Justiça da área civil e o delegado da 3ª DP, de São José dos Campos, na própria residência onde tinham se passado os fatos, acompanhados pelos peritos da Polícia Civil, inclusive do diretor da Perícia Criminalística, que ali colheram todas as provas e testemunhos. Felizmente, ontem, o capitão corregedor da Polícia Militar levou as duas moças, depois de visitá-las na sua residência, para a Corregedoria Militar de São Paulo. Desde meados da tarde de ontem até 4h15 da manhã, tomou depoimento detalhado de uma das moças. Hoje à tarde está colhendo das outras. Quero aqui agradecer as

Então, quero aqui até agradecer a providência que solicitei do Comandante Álvaro Camilo para que a apuração fosse realizada de maneira a mais transparente e rigorosa possível. Inclusive, agradeço terem permitido que o Deputado Estadual Marco Aurélio e o Vereador Tonhão Dutra, ambos do PT, acompanhassem na tarde, noite e madrugada, o depoimento dessas duas moças e que ainda haverá continuidade com respeito ao menor e três maiores que foram detidos e que também prestarão seu depoimento.

Senadora Ana Amélia, com muita honra, concedo o aparte.

A Sra. Ana Amélia (Bloco/PP – RS) – Senador Suplicy, faço esse aparte a V. Exª a respeito desse rumoroso caso da reintegração de posse nessa área chamada Pinheirinho. Tenho dificuldade porque não acompanhei, não estava presente; então, é muito mais difícil para quem está de fora fazer um julgamento. Então, baseio sempre nas informações que transmitidas pelos veículos de comunicação ou pelas pessoas que fazem parte desse conflito que teve repercussão inclusive internacional. Mas eu queria, como jornalista que fui até 2010, prestar uma homenagem à direção da EBC – Empresa Brasileira de Comunicação –, uma empresa oficial, órgão de governo na área de comunicação que faz uma nota oficial, reconhecendo um erro na informação de que houve morte nessa desocupação. Então, como jornalista, como cidadã e Senadora que ouviu a informação primeira, dando conta de que houve mortes nessa desocupação e hoje a empresa reconhece o erro na divulgação por ter confiado em fontes não fidedignas. Esse é um ato da maior responsabilidade com a boa comunicação. Então, faço esse aparte a V. Exª para cumprimentar a Empresa Brasileira de Comunicação por esse gesto que é um gesto de grandeza e de responsabilidade com a informação e, sobretudo, com a verdade. Obrigada, Senador Suplicy.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP) – Quero também cumprimentar pela atitude a Empresa Brasileira de Comunicação, que tem sido uma daquelas que mais passo a passo está procurando acompanhar todos os eventos. Ainda há pouco, à repórter Marilu Cabañas, da EBC, dei uma entrevista de rádio falando dos episódios que aqui registrei.

Quero concluir, Sr. Presidente. Dia 23, próximo, de fevereiro, na Comissão de Direitos Humanos do Senado, todas as partes envolvidas do governo municipal, a começar do Prefeito Eduardo Cury, o Secretário de Habitação de Justiça do Governo de Estado de São Paulo; foram convidados a Secretária Nacional de Habitação, Inês Magalhães, os juízes Márcia Loureiro, Ivan Sartori, Presidente do Tribunal de Justiça, o próprio juiz que acompanhou ali, Rodrigo Capez, e os representantes dos moradores do Pinheirinho, todos estarão convidados para aqui trazer o seu testemunho, mas sobretudo é importante que possam os três níveis de governo agora se darem as mãos e colaborarem para solucionar o mais rapidamente o problema social principal de moradia e das oportunidade de educação e saúde para aquela população e outras. E também para aprendermos muito com este episódio para que…

(Interrupção do som.)

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP) – … as arbitrariedades cometidas não se repitam em qualquer (fora do microfone) outro Estado ou Município brasileiros.

Muito obrigado, Senador Presidente Moka.

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