Nem todas as manifestações publicadas pela grande imprensa deixaram-se levar pelo turbilhão de versões e desmentidos acerca da história mal contada pela revista Veja sobre o encontro entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro do Supremo, Gilmar Mendes. Um dos textos mais ajustados à realidade vem assinado na Folha de S. Paulo de hoje pelo colunista político Janio de Freitas. Em “Além das versões”, ele lança luzes sobre o episódio com ponderações e novas interrogações que esperam por resposta para que o caso seja elucidado.
“Por que só passado um mês Gilmar Mendes quis dar à “Veja” sua versão do que Lula lhe teria dito?
“Será sempre por mera preferência pessoal, ainda que de fundo político, a escolha que se faça entre as versões conflitantes de Gilmar Mendes e de Nelson Jobim para a conversa de Lula com o ministro do Supremo Tribunal Federal, que o acusa de tentar pressioná-lo para não apoiar o julgamento do mensalão antes das eleições. O que Jobim, única testemunha do encontro, nega.
“Versão contra versão, de duas pessoas com o mesmo grau de confiabilidade. Mas o impasse não evita uma outra questão importante em vários sentidos.
O encontro, no escritório de Nelson Jobim, foi em 26 de abril. Por que só passado um mês Gilmar Mendes quis dar à “Veja” sua versão do que Lula lhe teria dito?
A hipótese plausível é a de lançar a granada o mais próximo possível das eleições, mas não tanto que tornasse óbvia a intenção.
“Pode haver outras hipóteses, não formuláveis, porém, porque só poderiam decorrer de motivos (ainda) misteriosos.
Também não há hipótese plausível para o encontro com Gilmar Mendes, pedido por Lula a Nelson Jobim, senão o de obter a simpatia do ministro do STF para o julgamento mais tarde, contra as fortes pressões para apressá-lo.
Neste caso, a ideia do encontro seria uma falha desastrosa da sensibilidade de Lula.
“Vêm lá da relação com Collor e seu governo, até como seu defensor na sessão do Senado para o impeachment, as evidências do convívio áspero de Gilmar Mendes com a existência do PT. E, na origem dessa posição ou por extensão dela, com Lula.
Foram inúmeras as manifestações de Gilmar Mendes hostis ao governo Lula. Por mais de uma vez, chegou a dizer, no seu estilo exaltado, que vivíamos então em “um Estado policial”.
Se não no trato jurídico, nas atitudes pessoais Gilmar Mendes deu todas as indicações de que seria a última pessoa a quem Lula poderia levar uma proposta de índole política. E de conveniência sua e do PT nas eleições. Em São Paulo, sobretudo.
“Lula foi movido por propósitos políticos, portanto, na versão divulgada por seu interlocutor. E Gilmar Mendes, que propósitos o moveram, se não foram políticos, para lançar sua granada 30 dias depois de a ter recebido, segundo sua versão? E quando o assunto da antecipação do julgamento já estava bastante esvaziado.
Tanto por Lula não haver procurado outros ministros do STF, como alguns disseram, quanto pelo avanço, dentro e fora do Supremo, da disposição de apressar a entrada do mensalão na pauta do tribunal.
Na versão de Gilmar Mendes, Lula teria “insinuado” uma espécie de troca: o apoio ao julgamento pós-eleições e, da sua parte, a proteção na CPI do Cachoeira contra o assunto de uma estada do ministro do Supremo com Demóstenes Torres na Alemanha.
“Aí já seria outro capítulo.
“Para a CPI declarada sujeita a manipulação, para Lula pela imoralidade da troca proposta, e para Gilmar Mendes posto sob suspeições. Tudo, porém, se perde no impasse da versões conflitantes e inconfirmáveis, ambas.”
Fonte – Folha de S. Paulo – 29/05/2012
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/45650-alem-das-versoes.shtml