O IBGE divulgou nesta manhã o resultado das contas nacionais para o ano de 2017 . O maior destaque dado pela imprensa foi o fato do PIB ter crescido 1%, após queda superior a 7% no acumulado de 2015 e 2016. A alta já era esperada, dado o crescimento dos dois primeiros trimestres, decorrente da safra agrícola e da liberação das contas inativas do FGTS. Apesar disso, o crescimento acumulado no ano frustrou parte dos analistas, que esperavam ver um último trimestre mais pujante, o que levaria a taxa de crescimento para próximo de 1,2%. Na realidade, o que se viu foi um quarto trimestre de virtual estagnação da economia brasileira, com um pífio crescimento de 0,1%.
Os resultados não são de causar entusiasmo em nenhum analista minimamente isento: o crescimento de 1% em 2017 dependeu quase que exclusivamente da agricultura (+13%, fundada em grande parte no aumento da safra de milho e soja) e de um pequeno crescimento no consumo das famílias (+1%). O problema é que esses dois fatores estão relacionados a fenômenos que não necessariamente se repetirão em 2018: a agricultura foi beneficada pelas boas condições climáticas verificadas e o consumo das famílias pela liberação do FGTS no primeiro semestre. Ambos são fatos isolados e que dependem pouco da ação estatal, já que o governo não controla o clima e os fundos do FGTS disponíveis para saque já se esgotaram, restando poucas opções para usar esse tipo de recurso parafiscal no futuro.
Sob a ótica da oferta, o único crescimento relevante foi da agricultura, uma vez que a indústria andou de lado (crescimento nulo, com especial destaque para a queda de 5% no setor de construção, um dos principais empregadores do país) e os serviços apresentaram expansão de apenas 0,3%, mesmo após seguidas quedas nos anos anteriores. No caso dos serviços, o pequeno crescimento foi puxado pelo aumento da atividade no comércio (+1,8%), influenciado pelo aumento do consumo das famílias decorrente da liberação do FGTS.
Já sob a ótica da demanda, chama atenção a nova queda nos investimentos, que recuaram 1,8% no ano, fazendo com que a taxa de investimento caísse para 15,6% do PIB, contra 16,1% em 2016.
O discurso do governo de que o aumento da confiança empresarial faria com que os investimentos voltassem se mostrou totalmente falso.
Parte dessa queda pode ser explicada pela retração dos gastos do governo, fortemente concentrados no corte de investimento públicos, que apresentaram variação negativa de 0,6%. O aumento do consumo das famílias compensou essas quedas por ter um peso grande no PIB, mas apesar de ter crescido 1% no ano, teve um desempenho fraco no último trimestre na comparação com o trimestre anterior, basicamente apresentando estabilidade (+0,1%). No front externo, as exportações cresceram 5,2%, muito influenciadas pela exportação da supersafra agrícola e pela melhoria em alguns preços, enquanto as importações tiveram aumento de 5%.
Outro dado importante que não traz qualquer alento é a virtual estabilidade do PIB per capta, que cresceu apenas 0,2% após quedas significativas em 2015 e 2016. Isso somado as várias evidências de que a concentração de renda aumentou no período indica que mesmo esse pequeno crescimento da renda per capta foi quase que totalmente apropriado pelos mais ricos.
A desaceleração das taxas de crescimento do PIB trimestral ao longo do ano aponta para um arrefecimento no nível de atividade que pode se prolongar por 2018. Tendo iniciado o ano com forte crescimento no primeiro trimestre (+1,3%) devido a supersafra agrícola, o ano de 2017 se encerra com um nível de atividade rodando próximo de zero, sem nenhuma indicação clara de quais serão as fontes do crescimento no ano de 2018. Os poucos elementos que ajudaram o PIB a sair do campo negativo em 2017 talvez não se repitam em 2018, fazendo com que o crescimento econômico brasileiro fique nas mãos de São Pedro ou de um ânimo renovado do consumidor, que se vê defrontado com taxas elevadas de desemprego, crédito escasso e caro, além de renda virtualmente estagnada.
A comemoração quase unanime na imprensa nacional de que o Brasil teria deixado para trás o período recessivo, mesmo que tecnicamente correta, esconde uma realidade pouco animadora para o país e seus cidadãos. Após dois anos de profunda recessão, é mais que natural que um país apresente taxas de crescimento positivas, até pelo patamar baixo que se encontra o PIB. No entanto, a análise fria dos dados divulgados nesta manhã nos apresenta uma realidade bastante preocupante, com um crescimento débil, fundado em fatores voláteis e de difícil repetição, queda pronunciada nos investimentos, além de indústria e renda per capta ainda estagnadas. Somando-se a isso o quadro desolador de desemprego (que atinge 12,7 milhões de brasileiros), a crise social e a degradação dos serviços públicos, fica evidente que comemorar o PIBinho de 2017 como evidência de uma suposta recuperação da economia brasileira é um erro grosseiro na leitura dos dados, decorrente em grande medida de uma torcida ideológica pela retomada de um crescimento sustentado que, para a tristeza de todos nós, não veio e dificilmente virá em 2018, caso o governo siga o rumo que vem apontando.
Guilherme Melo é economista, professor do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (Cecon-Unicamp). Faz parte do coletivo de economistas do Instituto Lula