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Preço do gás de cozinha aumenta mais do que a inflação

Dolarização do produto praticada pela Petrobras atinge principalmente as famílias de mais baixa renda. Jean Paul Prates questiona a política de preços da empresa
Preço do gás de cozinha aumenta mais do que a inflação

Foto: Agência PT

Uma das tantas promessas não cumpridas de Jair Bolsonaro, o botijão de gás de cozinha “pela metade do preço” está a cada dia mais distante dos brasileiros. Entre julho de 2020 e julho de 2021, o Gás Liquefeito de Petróleo (GLP) subiu 29,44%, ou quase três vezes mais que os 9,85% do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que mede a inflação para as famílias com renda mensal entre um e cinco salários mínimos.

A Petrobras já reajustou o gás seis vezes este ano, com alta acumulada de 37,8%. A Agência Nacional do Petróleo (ANP) calcula que o preço médio do botijão de 13 quilos no país subiu de R$ 69,98 em agosto de 2020 para R$ 93,32 em agosto de 2021. Na Região Norte, superou a casa dos R$ 100 em julho e chegou a R$ 102,74 em agosto.

A aceleração do preço fez o peso do produto no cálculo da inflação passar de 1,56% em agosto de 2020 para 1,79% em julho de 2021. Em quatro das dez regiões metropolitanas pesquisadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), já ultrapassa os 2%. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que chegue a 2,7% nas famílias com renda muito baixa (renda domiciliar menor que R$ 1.650,50 por mês).

“O gás de botijão é um item importante no orçamento das famílias, especialmente naquelas com renda de até cinco salários mínimos, e tem 14 altas seguidas, desde junho de 2020. A alta ajudou a puxar a inflação no período”, explicou ao Valor Econômico o analista do IBGE André Filipe Guedes Almeida.

“Estamos falando de uma alta de 30% em 12 meses, então acaba sendo pesado para o orçamento das famílias de baixa renda. E isso vem junto com altas fortes em energia elétrica e alimentos, que respondem por parcela importante dos gastos”, complementou Maria Andreia Parente Lameiras, economista do Ipea.

“A inflação é ruim para todos, ricos ou pobres. Mas pesa mais para as famílias de mais baixa renda, que são as com grau de instrução mais baixo e também as que mais sofreram na pandemia, perdendo emprego e agora com mais dificuldade de inserção no mercado”, prosseguiu Lameiras.

O Indicador de Inflação por Faixa de Renda do Ipea mostrou aumento para todas as faixas de renda de junho para julho, mas ele foi maior para as famílias de renda muito baixa – 1,12%, contra 0,88% das famílias de renda alta.

“Você tem aí alimentos, energia elétrica e gás de cozinha. Isso tudo pressiona mais a inflação dos mais pobres, porque o percentual da renda gasto com esses itens é maior do que para os mais ricos”, concluiu a pesquisadora do Ipea.

No acumulado do ano até julho, a inflação para o grupo de renda muito baixa, que recebe até R$ 1.650,50, foi de 4,8%. Nos últimos doze meses, chegou a 10,1%, a maior desde 2016 (10,6%. Em 12 meses, a alta inflacionária para as famílias de renda muito baixa reflete as variações de 29,3% do gás de botijão, de 20,1% da energia elétrica e de 16% dos alimentos no domicílio, sinaliza a pesquisa do Ipea.

País é autossuficiente, mas ainda importa GLP
“POR QUE O PREÇO DO GÁS DE COZINHA FOI DE R$ 45 PARA + DE R$ 100? Pq Bolsonaro dolarizou os preços para agradar acionistas privados da Petrobras. E pq ele está destruindo a maior empresa brasileira. Mas, cínico, ele discursa acusando governadores, o frete (?) e as revendedoras”, acusou o líder da bancada petista na Câmara dos Deputados, Bohn Gass (RS) em postagem no Twitter na última sexta-feira (13).

No mesmo dia, o senador Jean Paul Prates (PT-RN) criticou a desinformação nas reportagens sobre o aumento dos combustíveis. Ele afirmou que as mídias não explicam por que os valores são atrelados ao dólar, se o Brasil é autossuficiente em petróleo.

“As reportagens seguem sempre o mesmo script: anunciam o aumento, botam um consumidor sofrendo, um consultor dizendo que foi por causa da alta do petróleo (no mercado internacional) e finalizam sem explicar por que o Brasil autossuficiente pratica preços em dólar”, reagiu Jean.

Segundo ele, o consumidor brasileiro está pagando o preço de Rotterdam (Holanda) ou do Texas (Estados Unidos), acrescidos do frete e das despesas para colocar o produto à venda no mercado interno, “sendo que a vasta maioria do nosso consumo é abastecido por refinarias e campos nacionais”.

Enquanto importadores avançam cada vez mais sobre o mercado brasileiro, “o governo Bolsonaro ordena a Petrobras a deixar refinarias a ‘meia-bomba’, e as coloca à venda na xêpa da ressaca da pandemia, a preços subestimados, para aumentar a competição e reduzir os preços”, finalizou o senador.

Durante a campanha eleitoral de 2018, Bolsonaro considerou um absurdo o preço do gás – na época em torno de R$ 70 – e prometeu reduzir o valor. A promessa foi reforçada em abril de 2019 pelo ministro-banqueiro da Economia, Paulo Guedes, que prometeu “quebrar” o monopólio da Petrobras sobre o refino do petróleo e a distribuição. “Daqui a dois anos, o botijão vai chegar pela metade do preço na casa do brasileiro. Vamos quebrar os monopólios e baixar o preço do gás e do petróleo”, garantiu o ilusionista.

A Liquigás foi vendida para um consórcio formado pela Copagaz, Itaúsa e Nacional Gás por R$ 4 bilhões, em dezembro do ano passado, como parte do processo de desmantelamento do Sistema Petrobras. E os consumidores ainda esperam o botijão “pela metade do preço”.

Povo paga a conta da dolarização, que enriquece acionistas
“A venda de ativos no Brasil e o foco na geração de lucro para acionistas está ampliando a dependência da Petrobras do mercado internacional. O resultado disso é a aceleração dos reajustes de preços dos combustíveis no país, afetando diretamente as classes mais baixas, pelo efeito cascata gerado sobre a inflação de alimentos e outros gêneros de primeira necessidade”, alertou o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Cloviomar Cararine.

Estudo do Dieese revela que entre julho de 2017 e janeiro de 2021, o preço do barril do petróleo acumulou reajustes de 15,40%, mas a direção da Petrobras aumentou em 59,67% o preço da gasolina e em 42,64% o do diesel nas refinarias. Já o GLP subiu 130,79%, oito vezes mais que a inflação medida pelo INPC no mesmo período de 15,02%.

Segundo a Petrobras, o Brasil importa uma média de 25% a 30% do GLP consumidor no país. Por isso, se reduzir o preço abaixo das cotações internacionais, ficaria diante de duas opções: deixar o mercado desabastecido ou importar o produto para vender a preço mais alto. Desde o golpe de 2016, a empresa pratica a segunda opção, às custas dos consumidores. Mas há quem ganhe com isso.

No último dia 4, a Petrobras (conhecida no mercado de capitais como PETR3 ou PETR4+0,89%) anunciou o pagamento de R$ 31,6 bilhões em proventos, divididos entre dividendos e juros sobre o capital próprio (JCP) aos acionistas este ano. É o maior montante de dividendos já pago pela empresa. As privatizações e o aumento abusivo dos preços dos combustíveis estão na raiz dessa exorbitância.

O pagamento será realizado em duas parcelas e é referente a uma antecipação da remuneração aos acionistas da companhia relativas a 2021, consideradas as perspectivas de resultado e geração de caixa para o ano. “Sendo compatível com a sustentabilidade financeira da companhia, sem comprometer a trajetória de redução de seu endividamento e sua liquidez, em linha com os princípios da política de remuneração aos acionistas”, afirmou a Petrobras em nota.

“A decisão do Conselho de Administração da Petrobrás de antecipar a remuneração dos acionistas relativa ao exercício de 2021, no valor de R$ 31,6 bilhões é mais um golpe do governo Bolsonaro contra a estatal”, pois, do total, a União receberá R$ 11,6 bilhões, menos da metade. “O restante será distribuído entre os acionistas, majoritariamente estrangeiros”, respondeu em nota a Associação de Engenheiros da Petrobras (Aepet).

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