Presidente do BC sinaliza que juro vai continuar salgado para o trabalhador

Presidente do BC sinaliza que juro vai continuar salgado para o trabalhador

Senadores da oposição mostram que justificativa do BC para o juro cair conta com a escandalosa retirada dos direitos sociaisCom uma linguagem bastante empolada, o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, disse nesta terça-feira (4) que a queda do juro dependerá de três pontos: comportamento da inflação, do câmbio e das reformas que o governo golpista pretende aprovar para retirar direitos dos trabalhadores e obter um pseudo ajuste fiscal. Para festejo dos rentistas e dos banqueiros, o discurso do presidente do BC, na audiência pública realizada pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, soou como música. Primeiro, porque a inflação está elevada e, segundo, porque as tais reformas, entre elas a que congela os gastos públicos por 20 anos em áreas como Saúde e Educação e a reforma da Previdência não serão aprovadas num passe de mágica como tentam vender os políticos que apoiam o governo golpista. Logo, os juros vão continuar elevados. 

Resumo da ópera: quem perde são os trabalhadores e famílias endividadas. Não há nenhum sinal dado pelo Banco Central para fazer com que os juros do cheque especial caiam para uma taxa suportável. Os juros estão entre 300% e 400% ao ano, como mostrou a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB). 

E se não há no horizonte um sinal de que os juros vão cair, o modelo de política monetária adotado pelo Banco Central corresponde ao favorecimento dos banqueiros e dos rentistas, em detrimento das camadas que ascenderam de classe nos últimos anos e movimentam a economia. Para o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), a estratégia escolhida pela direção do BC é “escandalosa”. Isto, porque decidiu-se por juros elevados para combater a inflação quando essa tática gera mais recessão econômica, levando as pessoas a consumirem menos. 

“Fizeram um pacto com o sistema financeiro e com as maiores empresas que vivem dos juros altos, os rentistas, que o discurso é falar de ajuste fiscal. Isso é um escândalo. Juro elevado só aprofunda a recessão e é o caminho para a economia ficar patinando. A gestão econômica brasileira tem sido motivo de piada porque se pretende combater a inflação aumentando o juro real, onde o juro real só aumenta”, afirmou Lindbergh. 

O senador aliado de primeira hora do governo golpista, José Anibal (PSDB-SP), ficou incomodado, irritado, quando Lindbergh cobrou de Ilan Goldfajn uma postura firme para reduzir os juros imediatamente. 

Já o senador Armando Monteiro (PTB-PE), mostrou que, apesar da recuperação da indústria, nota-se no setor de transformação (veículos) que esse ímpeto de retomada do crescimento caiu, segundo ele, por causa de outro fator preponderante na conjuntura econômica: a taxa de câmbio. Ainda na gestão da presidenta legítima Dilma Rousseff, quando Monteiro ocupava a pasta do Comércio Exterior, o governo fez uma significativa recomposição da taxa de câmbio, que elevou o dólar em relação ao real, para tornar os produtos brasileiros mais competitivos no exterior. Deu certo: com a nova taxa de câmbio, o País se tornou mais competitivo e exportou mais, carreando mais recursos para nossa economia. 

Acontece que a orientação do governo golpista tem o caminho inverso: levar o dólar à depreciação em relação ao real para garantir aos endinheirados suas compras no exterior. Armando Monteiro mostrou que o spread bancário (que é a diferença do juro recebido por quem faz uma aplicação daquele juro cobrado pelo banco quando empresta), está só aumentando e isso é comprometedor para os empresários, de todos os portes. 

Um exemplo dessa diferença ocorre, inclusive, no juro cobrado do crédito consignado – o que a prestação é descontada em folha. Essa linha de crédito é mais do que segura, não oferece risco aos bancos, mas os juros estão acima de 30% ao ano, enquanto a taxa Selic está em 14,5% ao ano e a inflação em 8%. Com essas taxas, os lucros dos bancos voltaram a ser imorais. 

A senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), ex-ministra da Agricultura e defensora incondicional da ex-presidenta Dilma Rousseff, criticou duramente o presidente do Banco Central por ter orientado o governo de Temer a editar medida provisória (MP) que poderá dizimar a Casa da Moeda do Brasil. Se o Congresso aprovar essa MP, estará aberta a possibilidade de o Brasil importar cédulas do real de outros países. “Falta honestidade em dizer qual é a real intenção de tirar da Casa da Moeda do Brasil a responsabilidade de fabricar o dinheiro que circula no País. É muito estranho nomear um político para a Casa da Moeda”, disse ela. 

O presidente do BC titubeou, dizendo que a Casa da Moeda tinha problemas nas máquinas que fazem dinheiro. Mas note que a colocação de Kátia Abreu, sobre a indicação política de Temer para a Casa da Moeda, chama atenção porque a medida provisória permite que a importação de dinheiro (cédulas) de outro país seja feita “sem licitação”. Outro escândalo à vista no curtíssimo prazo. 

Ameaça ao Parlamento 

Presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), considerou que o governo de Temer praticamente faz uma ameaça ao Parlamento quando o presidente do BC diz que para o juro cair é necessário que se faça as reformas para melhorar o aspecto fiscal das contas públicas. 

“O que levou a um descontrole fiscal recente não foi o aumento de gastos, portanto, a forma de recuperar a sustentabilidade fiscal não pode passar por uma racionalização de gastos. O aumento recente da inflação brasileira, como em diversos outros momentos, não tem a ver com a política fiscal nem mesmo com a demanda das famílias. Portanto, o aumento de juros não leva a um controle inflacionário. Na realidade, tal medida, a de manter juros altos, além de agravar o cenário fiscal, combina uma estratégia de concentração de renda”, afirmou Gleisi. 

A senadora disse que numa análise dos dados nota-se que houve uma brutal queda da arrecadação de impostos em relação ao PIB, fruto da desoneração e do próprio cenário econômico interno e externo de retração da atividade produtiva. Com produção e venda menores, logo a arrecadação de impostos cai. “Todo o efeito sobre os gastos públicos traz uma visão parcial porque é voltada a um desmonte dos mecanismos distributivos de renda. A redução dos gastos sociais não é uma melhor alternativa para melhorar o cenário fiscal”, apontou. 

Segundo Gleisi, em relação ao comportamento da dívida pública líquida e bruta, em relação ao PIB, o governo atual também exagera nos argumentos. Isto, porque a dívida líquida em relação ao PIB era de 60% durante o governo FHC e estava em 34% com Dilma. A dívida bruta, também em relação ao PIB, era de 76% durante o governo FHC e com Dilma estava abaixo de 65%. O aumento da dívida bruta recente está relacionado aos instrumentos de segurança adotados pelo governo no enfrentamento da mais séria crise econômica do mundo. O Brasil deu proteção aos exportadores com um mecanismo chamado swap cambial, de troca de taxas de juros com as de câmbio, e manteve um colchão de liquidez que são as reservas internacionais da ordem de US$ 376 bilhões. Manter esse dinheiro para segurança impactou a dívida bruta em relação ao PIB. 

Com isso, na avaliação de Gleisi, o discurso de que reformas para o ajuste fiscal são necessárias senão os juros não caem vão contra a corrente. A senadora Vanessa Grazziotin, inclusive, lembrou recente relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI) que recomenda aos países reduzir os juros e incentivar o consumo das classes média e baixa. Exatamente o modelo que deu certo e que fez o Brasil ser o último país a entrar na crise global de 2008 e o primeiro a sair, ainda na gestão de Lula. Para o ex-presidente, a economia só sairá da crise quando o pobre tiver dinheiro no bolso para gastar. 

Mas o presidente do BC disse que há outro relatório sobre o Brasil, e a recomendação dos técnicos do FMI é aquela mesma que afundou a Grécia: fazer reformas para tirar direitos dos trabalhadores, congelar o orçamento público tirando dinheiro da Saúde e da Educação; mexer na aposentadoria e cortar dinheiro e número de atendidos pelo programa do Benefício de Prestação Continuada (BPC), aquele dinheiro que corresponde a um quarto do salário mínimo destinado a pessoas com deficiência ou famílias que não tem qualquer tipo de renda. Como se vê, o receituário neoliberal que defendia a privatização, o desmonte do Estado, está de volta. 

Marcello Antunes

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