Já não bastam o gás, a gasolina e a carne bovina terem virado artigos de luxo no governo Bolsonaro. Depois de confinar o consumo popular de proteína animal ao pé de frango — preparado no fogareiro de carvão —, a dupla Bolsonaro/Guedes está convidando o povo brasileiro para um jantar à luz de velas.
A insensata, antinacional e inoportuna privatização da Eletrobras, aprovada na madrugada da última quinta-feira (19) na Câmara dos Deputados, não pode ser confirmada pelo Senado, sob pena do inevitável aumento dos preços da energia para o consumidor.
Porque é isso que acontece quando se entrega um serviço essencial à lógica privada, que visa o lucro e não o atendimento de uma necessidade básica de todos.
Como senador da República, vou trabalhar sem descanso para derrubar esse ataque à nossa soberania, quando a MP da privatização da Eletrobras for apreciada no Senado.
Não é possível transformar energia em luxo.
Isso, quando houver energia. Ou alguém já esqueceu da população inteira do Amapá — 750 mil brasileiros e brasileiras condenados a enfrentar 22 dias de um apagão fornecido pela empresa privatizada de energia do estado?
Faz tempo que venho alertando para o desarranjo que este governo está armando no setor elétrico, insistindo em aprovar por medida provisória um roteiro para a privatização da Eletrobras. E em plena pandemia, destaque-se.
Mas o governo Bolsonaro, quando não está atirando as pessoas à contaminação pelo coronavírus, só pensa em torrar patrimônio público a preços vis.
Basta conferir o balanço da Eletrobras relativo a 2020, que registra um lucro líquido de R$ 6,4 bilhões — com crise, com pandemia, com tudo.
Qual é o sentido de botar à venda, numa conjuntura tão desfavorável, uma empresa estratégica e lucrativa, que registra nível de endividamento mínimo e resultados operacionais de excelência?
Qual o sentido de entregar a capacidade do Estado de fazer a energia chegar onde é necessária — e não apenas onde a operação dá lucro — numa hora dessas?
O discurso é sempre o mesmo: “Ah, a empresa precisa de investimentos, quem comprar os pedaços vai injetar recursos”.
Será? Porque a Eletrobras vem cumprindo seu papel. Um exemplo de resultado operacional da Eletrobras é justamente o socorro à empresa privada que promoveu o apagão do Amapá — e é sempre bom lembrar que aquela patuscada energética foi obra de uma empresa privada, mas custou R$ 80 milhões aos cofres públicos, repassados pela Conta de Desenvolvimento Energético para bancar a isenção de tarifas aos consumidores lesados pela interrupção do fornecimento de energia.
Um caso exemplar de como uma privatização mal feita acaba sendo paga mais de uma vez pelo povo: dá prejuízo quando se vende um ativo estratégico e lucrativo a preço de banana e outro prejuízo quando o dinheiro público tem que socorrer a empresa privatizada que esconjura o Estado quando está lucrando, mas corre para pedir socorro a esse mesmo Estado quando enfrenta uma crise.
A Eletrobras é um portento e custou muito dinheiro do povo brasileiro para ser construída.
A empresa controla o fluxo de água de todas as grandes bacias hidrográficas brasileiras (Paraná, São Francisco, Xingu, Amazonas, Paraíba do Sul, por exemplo), por meio de suas represas hidrelétricas já totalmente pagas pelo Estado brasileiro.
O sistema Eletrobras responde por 35% da geração de energia elétrica do país. E é graças a ele que um trabalhador pode contar com o serviço, ainda que more em uma localidade remota e não lucrativa para um fornecedor privado.
Energia elétrica a preços decentes não é luxo. É com ela que iluminamos nossas casas, fazemos funcionar os aparelhos que nos asseguram níveis básicos de conforto e nosso lazer. É também insumo essencial ao comércio e à indústria — que empregam pessoas e produzem os bens que vamos comprar mais caros ou mais baratos, a depender também do valor da conta da energia.
Estou confiante que o Senado vai derrubar mais essa barbaridade urdida por Bolsonaro/Guedes.
Artigo originalmente publicado no site Congresso em Foco