Processo de impeachment é aventura sem sustentação, alerta Gleisi

Processo de impeachment é aventura sem sustentação, alerta Gleisi

Gleis: Nem relator está convencido da validade constitucional do parecerCheio de vícios, sem base constitucional e sem contar sequer com o convencimento do relator, o processo de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff, em curso na Câmara dos Deputados, é uma aberração que não ameaça apenas um mandato legítimo, conquistado com 54 milhões de votos, mas a normalidade democrática e a ordem constitucional. O alerta é da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), que em pronunciamento ao plenário nesta segunda-feira (11) apontou os perigos que podem ser desencadeados por essa aventura.

“Os questionamentos vão continuar e a instabilidade política vai continuar, porque esse processo não tem base, o relatório do deputado Jovair Arantes (PTB-GO) não tem sustentação”. Gleisi destacou que a violação do Estado de Direito contida na eventual aprovação desse impeachment jamais fará surgir um governo com legitimidade. “A história não perdoa violência à democracia”, alertou a senadora, lembrando as palavras do ministro da Advocacia-Geral da União, José Eduardo Cardozo.

Ninguém põe em dúvida que o instrumento do impeachment esteja previsto na Constituição, lembrou Gleisi. Mas essa mesma Constituição descreve muito claramente as condições para o afastamento de um governante eleito—e nenhuma dessas condições está presente no caso atual. “É por isso que este processo de impeachment deve ser chamado de golpe. O golpe de abril de 2016. É assim que vai ser conhecido na nossa história esse processo e é assim que vão ser conhecidos como golpistas todos aqueles que votarem com ele”, afirmou a senadora.

É essa a razão para que cada vez mais setores e cidadãos—muitos deles descontentes com o governo Dilma — venham se mobilizando para deter o golpe. “As manifestações contra o golpe são atos da sociedade, legítimos, não são organizados pelo PT. São atos de artistas, de intelectuais, de professores. São atos de pessoas que viveram a ditadura militar, que viveram o que significou a restrição de liberdade e hoje lutam com todas as suas forças para que não repitamos esse golpe”.

Sem argumentos

Para a senadora, a simples análise técnica e jurídica põe por terra o pedido de impeachment e do relatório de Jovair Arantes  “É uma pena que, na comissão [do impeachment], as pessoas não ouçam. Elas já estão pré-definidas no seu julgamento, a maioria sem argumentação técnica ou jurídico-constitucional. Limitam-se aos argumentos políticos — inclusive os de baixa qualidade, sem sustentação”.

Na análise do impeachment, os deputados só poderiam considerar o trecho da denúncia acolhido pelo presidente da Câmara — Cunha não acolheu alegações referentes a 2014, pois o período faz parte do primeiro mandato da presidenta Dilma, já encerrado. Mesmo assim, contrariando a lei, o relatório do deputado Jovair Arantes acolhe reclamações referentes a 2104. “Por isso nós dizemos que esse relatório está baseado em equívocos conceituais e desejos políticos”.

De todo o alvoroço em torno das ditas “pedaladas fiscais” — o primeiro argumento dos golpistas para tentar depor a presidenta —, restou apenas uma situação, referente ao Banco do Brasil. O restante do pedido de impeachment se escora na edição de decretos de abertura de créditos suplementares, que supostamente teriam ferido a Lei de Responsabilidade Fiscal porque aumentariam o déficit orçamentário.

Mas o pior é a revelação feita pelo relator Jovair Arantes: ele confessa que não encontrou provas de crime de responsabilidade e que, “na dúvida”, resolveu dar parecer favorável ao impeachment. “Isso atenta contra todos os princípios do nosso direito. Na dúvida, a decisão tem sempre que ser em benefício de quem está sendo acusado. Na dúvida, pró-réu”.

Gleisi citou o ministro da Advocacia Geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo, criticando a estapafúrdia interpretação dada por Jovair à legislação do País: “”Na dúvida, muda-se a jurisprudência do Brasil”.

O que se se convencionou chamar de “pedaladas fiscais” é, na verdade, o adiantamento, por parte de bancos públicos, de valores para pagar despesas da União. Algo como o governo recorrer a um “cheque especial”, quitando esse adiantamento em seguida. Para aceitar a denúncia contra Dilma, Cunha se ateve a uma situação que envolve o Banco do Brasil e o Plano Safra, um financiamento criado 1992 para apoiar a agricultura. Os empréstimos são feitos a juros menores que os do mercado. Posteriormente, o governo faz a equalização desses juros, uma espécie de compensação aos bancos pela cobrança de juros mais baixos.

Quem regulamenta e gere o Plano Safra sequer é a presidenta, mas o Conselho Monetário Nacional, o Ministério da Fazenda e os dois ministérios setoriais. “Portanto, não há nenhum ato da presidenta que esteja interferindo nessa situação do Plano Safra, porque são esses órgãos que regulamentam e que fazem a gestão e a execução, de uma lei de 1992”.

Na equalização de juros, o Governo Federal paga uma parte dos juros para que os produtores rurais possam contratar os empréstimos com taxas mais baratas e possam ter melhores condições de plantar, colher e vender sua produção. “Por isso que a gente tem a agricultura brasileira com a força que tem e tem garantia de preço mínimo pago aos produtores”, lembrou a senadora.

“Como é impossível o Banco do Brasil dizer corretamente para o Governo Federal o quanto ele vai gastar em determinado período, ele faz uma contabilidade diferente, que é uma contabilidade semestral, e lança semestralmente o que ele pagou e o que ele tem a receber. E, neste semestre, é que se verificou que o banco desembolsou a mais e a União teria que pagá-lo a mais. Exatamente como está regulamentado desde 1992”. Pois agora essa situação é usada como pretexto, pois os valores a pagar feririam a meta fiscal.

Cyntia Campos

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