Parlamentares da Bancada do PT e do PSOL na Câmara dos Deputados protocolaram, nesta terça-feira (26), representação na Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez. O titular da pasta da Educação enviou e-mail ontem (25) para escolas privadas e públicas de todo o País, no qual determina que seja lida às crianças uma carta dele com o slogan da campanha eleitoral de Jair Bolsonaro em 2018: “Brasil acima de tudo. Deus acima de todos”.
Na representação – também assinada pelo líder do PT, Paulo Pimenta (RS) -, as Bancadas do PT e do PSOL consideram a posição do ministro um “ato ilegal e lesivo à moralidade pública e, em tese, tipificador de improbidade administrativa e crime de responsabilidade”.
Na peça entregue à PGR, os parlamentares lembram que o MEC, por meio do ministro, pede que as crianças sejam perfiladas para cantar o hino nacional e que o momento seja gravado pelos professores em vídeo e enviado para o governo. A prática confirma ato “ilegal, abusivo e imoral, consistente na irregular utilização de recursos públicos para o envio, a todas as escolas públicas e particulares do País, de e-mail, com uso de slogan da campanha eleitoral do Presidente da República”.
O deputado Waldenor Pereira (PT-BA) participou da atividade na PGR e lamenta que o País tenha sido foi abatido por uma onda reacionária e conservadora que repercute fortemente nas ações do governo. “Chegamos ao ponto de um ministro da Educação cometer crime de responsabilidade, decidir ou recomendar às escolas do Brasil, aos sistemas de ensino de uma forma geral a obrigatoriedade de fazer propaganda eleitoral do governo do presidente Bolsonaro”, criticou o parlamentar baiano. Segundo o deputado, haverá reação forte a cada ação do “governo fascista e conservador, que busca imprimir ao País medidas extremamente reacionárias, que naturalmente repercutirão na formação dos nossos jovens através do ensino educacional”.
Conforme o deputado Pedro Uczai (PT-SC), “é crime de responsabilidade, é desrespeito ao princípio da impessoalidade, que qualquer gestor público desse País deve ter, trazer discursos de campanha eleitoral para construir uma única ideologia, um único pensamento na escola. A nossa resposta será de indignação, de ‘basta!’ a esse ministro. Fora, ministro da Educação!”.
Hino nacional
Por sua vez, a deputada Margarida Salomão (PT-MG) destaca que o problema não é o hino nacional que, aliás, é mote de uma lei já sancionada pelo presidente Lula, e que já determina que o hino seja cantado nas escolas públicas e nas escolas privadas. “É um símbolo da Pátria, portanto todos estão de acordo com isso”, observa.
“O que me espanta é que o ministro da Educação, com tantos problemas que ele tem, na educação fundamental, escolas sem recursos, escolas com prédios deteriorados, professores sem salário, ou com salário abaixo de sua dignidade, venha nos atormentar com um ato como esse. Nesse sentido ele é completamente equivocado, e a sua ação não só deve ser repudiada, mas condenada! E é por isso que nós estamos aqui, representando contra ele, na Procuradoria-Geral da República”, explica Margarida Salomão, que já foi reitora da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG).
A Professora Rosa Neide (PT-MT) argumenta que não somos contra cantar o hino nacional, contra os símbolos do País, “somos contra a invasão da autonomia da escola, é isso que nos traz aqui na PGR para que possa chamar o ministro e mostrar para ele qual é o papel do ministro e qual é o papel das nossas escolas”, frisa.
“Propaganda de tipo nazista”
Segundo a deputada Maria do Rosário (PT-RS), a ação autoritária do ministro da Educação é típica de improbidade administrativa, pois fere a impessoalidade da função pública. Mas a deputada diz que é mais do que isso. “É uma propaganda de tipo nazista, em que crianças e jovens seriam obrigados a repetir as palavras de campanha, o chamamento eleitoral e de campanha de Jair Bolsonaro, um chamamento que tem se transformado todos os dias em um chamamento de desrespeito ao próximo, à desumanidade, ao desrespeito aos povos indígenas e aos negros e negras, ao avanço da discriminação contra as pessoas LGBT, contra as mulheres, e ao ataque aos professores”, exemplifica a deputada.
De acordo com a parlamentar, o governo fala em “escola sem partido”, mas o governo quer fazer a “escola do partido único, altamente ideologizada. Só que os professores e professoras estão resistindo. “E nós somos a resistência junto com cada educador e educadora que sabe que educação é uma expressão que só existe com liberdade. Viva Paulo Freire! E abaixo o autoritarismo de Jair Bolsonaro e deste ministro que não tem competência para exercer a função que exerce pelo Brasil”, finaliza.
Os parlamentares solicitam que a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, acate a representação e envie ao Supremo Tribunal Federal (STF), para que o governo seja responsabilizado e punido pelos seus atos.
A representação também é assinada pelas deputadas Erika Kokay (PT-DF); Margarida Salomão; Professora Rosa Neide; Maria do Rosário, e pelos deputados Pedro Uczai; Waldenor Pereira; Ivan Valente (PSOL-SP); Fernanda Melchiona (PSOL-RS); Marcelo Freixo (PSOL-RJ); Áurea Carolina (PSOL-MG);
Conteúdo da carta do ministro
“Prezados Diretores, pedimos que, no primeiro dia da volta às aulas, seja lida a carta que segue em anexo nesta mensagem, de autoria do Ministro da Educação, Professor Ricardo Vélez Rodríguez, para professores, alunos e demais funcionários da escola, com todos perfilados diante da bandeira do Brasil (se houver) e que seja executado o hino nacional”, diz o texto assinado pelo ministro, que é colombiano naturalizado brasileiro.
A carta foi enviada para escolas públicas e particulares do País. “Isso é ilegal, o MEC não tem competência para pedir nada disso às escolas”, diz o diretor da Associação Brasileira de Escolas Particulares (Abepar), Arthur Fonseca Filho, segundo informou a Agência Estado.
Diretores de escolas ficaram chocados com o conteúdo da carta, principalmente porque pede para que as crianças sejam filmadas. Muitos chegaram a pensar que se tratava de fake news ou vírus em enviado por email.
“Solicita-se, por último, que um representante da escola filme (pode ser com celular) trechos curtos da leitura da carta e da execução do hino nacional. E que, em seguida, envie o arquivo de vídeo (em tamanho menor do que 25 MB) com os dados da escola”, diz o corpo do email. Fonseca Filho disse ainda que as escolas não têm autorização para enviar imagens de seus alunos para o governo.