O projeto do Marco Temporal, que ameaça o futuro dos povos indígenas, voltou a caminhar no Congresso nesta quarta-feira (16/8). A Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) do Senado marcou a votação para a próxima quarta (23/8), acendendo um alerta nas comunidades indígenas.
A intenção da bancada ruralista é manter o texto aprovado pela Câmara em 30 de maio sem qualquer alteração, para acelerar o processo. Da CRA, a matéria (PL 2.903/2023) segue à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e, depois, ao Plenário.
Simultaneamente, o assunto está em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF), que julga um processo que trata do Marco Temporal com “repercussão geral”, ou seja, a decisão servirá de parâmetro para todos os processos em instâncias inferiores da Justiça. Dependendo do resultado, pode derrubar a legitimidade das mais de 700 demarcações de terras indígenas no país, beneficiando gigantes do agronegócio e ameaçando ainda mais o meio ambiente.
Por iniciativa do senador Beto Faro (PT-PA), a CRA vai realizar audiência pública na próxima terça (22/8) com representantes do Ministério da Justiça, da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) e da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil). Na reunião desta quarta, foi lido o parecer da relatora Soraya Thronicke (União-MS) – favorável ao projeto – e concedido pedido de vários senadores para que tenham uma semana a mais para analisar o texto.
“É um tema extremamente polêmico e sobre o qual nós precisamos achar, na minha avaliação, um meio-termo”, sugeriu Beto Faro. “Nem tudo o que está estabelecido na questão do Marco Temporal, mas também não pode ficar sem estabelecer uma regra para isso”, ponderou.
Além disso, o senador argumenta que a matéria acaba de chegar para análise dos senadores, que devem ouvir todos os interessados. “A matéria está vindo agora ao Senado, embora seja de conhecimento de todos, mas é uma matéria que estava na Câmara. É o primeiro debate oficial que a gente faz sobre esse tema aqui”, afirmou.
O que está em jogo
A tese do Marco Temporal estabelece que os indígenas somente teriam direito às terras que estavam em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou que estavam em disputa judicial na época.
O caso em debate no STF é um recurso da Funai contra decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que deu razão ao estado de Santa Catarina na disputa com o povo Xokleng pela posse da Terra Indígena Ibirama.
Até o momento, 2 ministros votaram contra a tese (Edson Fachin, relator, e Alexandre de Moraes) e 1 a favor (Nunes Marques). O julgamento poderá ser retomado a partir de 5 de setembro, quando vence o prazo do pedido de vista concedido ao ministro André Mendonça.
Se aprovada, a tese do Marco Temporal vai beneficiar gigantes do agronegócio e ameaçar ainda mais o meio ambiente, como é o caso de outra disputa na mesma região catarinense, onde a empresa Modo Battistella Reflorestamento (Mobasa) seria diretamente beneficiada.
Pertencente ao conglomerado da família Battistella, a empresa extratora de madeira pede que a Justiça anule a demarcação da Terra Indígena Ibirama La-klaño. A família também fabrica madeira serrada de pinheiro (pinus), é dona do Porto de Itapoá (SC), o terceiro maior do país em movimentação de contêineres, e dona da Cotrasa, uma das maiores revendedoras de caminhões Scania do país.