(Foto: Alessandro Dantas)Cyntia Campos/ PT no Senado
Está mais que provado: o governo não economiza esforços para impedir o debate sobre a chamada “PEC da Maldade”. Tramitando no Senado como PEC 55/2016, a proposta — que pretende amarrar os investimentos públicos por 20 anos — foi o único ponto de pauta na reunião extraordinária da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) desta terça-feira (1), encerrada a toque de caixa, em uma “tratorada” da base governista, que tentava impedir a aprovação de um requerimento de audiência pública para aprofundar a discussão do projeto.
“O governo não quer discutir a PEC da Maldade porque, se discutir, vai perder”, explica a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). Os números dão razão à petista: uma consulta pública que está sendo realizada no portal do Senado na internet já contabiliza uma surra da opinião pública na proposta do governo Temer: 274.928 cidadãos já se manifestaram contrários à PEC 55, que conta com o apoio de 16,7 mil votantes.
Nada justifica o arrocho
“O governo não consegue justificar essa proposta. Não consegue explicar porque quer cortar despesas que beneficiam os brasileiros que mais precisam, em vez de cobrar impostos dos mais ricos”. Gleisi lembra que muito mais correto do que estrangular os investimentos em saúde e educação ao longo de duas décadas seria buscar recursos na criação do imposto sobre grandes fortunas e na volta da cobrança de tributos sobre os lucros e dividendos distribuídos aos donos das empresas.
“Por que o debate fiscal só trata de gastos? Por que não se discute a arrecadação, a participação dos setores mais ricos no financiamento do Estado?”, questionou a senadora.
Tratorada e anomalia
A reunião da CCJ desta terça-feira foi convocada extraordinariamente para que o relator da PEC da Maldade, Eunício de Oliveira (PMDB-CE), fizesse a leitura de seu parecer sobre a matéria. Um acordo firmado entre a base do governo e a oposição previa, ainda, que haveria um pedido de vista coletiva do texto — o que adiava a votação para a próxima sessão do colegiado — e a aprovação do requerimento assinado por Lindbergh Farias (PT-RJ) e por Aloysio Nunes (PSDB-SP) convocando uma audiência para aprofundar o debate sobre a PEC antes da deliberação.
Na última hora, os governistas resolveram desonrar o acordo e o presidente da CCJ, José Maranhão (PMDB-PB), encerrou a sessão sem votar o requerimento e cassando a palavra dos senadores de oposição, que propunham já dar início à discussão do relatório de Eunício de Oliveira. Somente com muitos protestos dos senadores Lindbergh Farias, Gleisi Hoffmann, Fátima Bezerra (PT-RN) e Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) é que os termos do acordo acabaram respeitados.
Gleisi Hoffmann já havia destacado a situação anômala construída pela maioria governista na CCJ para a apresentação do relatório da PEC 55 —seguramente, “a mudança mais importante que estamos fazendo na Constituição desde que ela foi aprovada, em 1988”. O parecer de Eunício foi apresentado em uma reunião extraordinária e, por isso, não foi transmitido pela TV Senado, impedindo que a população pudesse tomar conhecimento do texto. “O governo está fazendo de tudo para impedir a discussão da PEC 55”, protestou a senadora.
O descumprimento do acordo e a leitura “escondida” do relatório são só dois exemplos desse “tudo” denunciado por Gleisi. Na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), presidida pela senadora, das três audiências públicas realizadas para discutir a PEC da Morte apenas uma contou com representantes do governo. Uma dessas reuniões, realizada na terça-feira passada (25 de outubro), sofreu uma tentativa de empastelamento movida pelo governista Ataídes Oliveira (PSDB-TO).
O tucano queria impedir a realização da sessão, convocada para discutir medidas que podem tornar o sistema tributário brasileiro mais progressivo — ou seja, mais justo. O tema é mais do que oportuno, especialmente quando o governo quer cortar investimentos em áreas sociais que já se provaram essenciais para reduzir a desigualdade e melhorar a vida da maioria dos brasileiros. Se estão faltando recursos, por que não buscar uma tributação mais justa — que cobre do “andar de cima sua devida contribuição ao financiamento do Estado, garantindo um aumento de receita que pode pagar pelas políticas que atendam as necessidades básicas da maioria?”
Pois para Ataídes de Oliveira, esse debate não poderia se realizar, já que a audiência foi convocada para analisar possibilidades de melhoria do sistema tributário e não deveria tratar do outro lado do desafio fiscal, que são os gastos—onde a PEC 55 pretende aplicar sua cruel tesourada.
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